O São João é um Santo e umas festas que rapidamente identificamos com a cidade do Porto. Ou Braga. Mas há mais. Em especial um. E diz quem experimenta, melhor. Com outra envolvência, no meio do oceano Atlântico, com outra moldura humana e um espírito único que faz voltar quem o vive pela primeira vez.

O São João de Angra do Heroísmo, na ilha Terceira, Açores, dura dois dias. Ou antes, duas noites. Começou ontem, prossegue hoje. E está integrado nas Festas Sanjoaninas, que começaram no passado dia 22 e terminam a 2 de julho.

Como festa profana que se preze com alusão a um Santo Popular, há marchas. Um cortejo que mete fado, Carnaval e folclore. Mistura religiosidade, a paixão pelos touros, a gastronomia e o espírito de comunhão com o próximo. E não falta muita música e dança, comida e bebida noite fora.

As ruas são engalanadas com os tradicionais efeitos luminosos. Um interminável tapete vermelho guia os dançarinos num percurso que se inicia no Alto das Covas, desce pela Rua de Sé, uma extensa rua inclinada cujos passeios são ocupados por cadeiras atadas umas às outras, colocadas muitas horas antes dos desfiles para as senhores e senhores que querem estar na primeira fila dos acontecimentos, vira à direita para a Rua de São João, que durante duas noites tem direito a ser chamada a rua mais movimentada de toda a ilha e arredores, segue pela Rua Direita e termina na Praça Velha, em pleno Paços do Concelho onde está a Câmara Municipal.

Milhares de pessoas nas ruas acotovelam-se para não perder pitada dos acontecimentos. Outros, mais afortunados, sobem ao primeiro balcão e acenam a quem passa das varandas decoradas com as tradicionais colchas.

Paulo Rascão | MadreMedia

Tetra Campeão na Noite de São João com a águia Vitória como Madrinha

Ao todo, as duas noites de São João juntam 36 Marchas de adultos, no qual participam dois mil dançarinos e cinco Marchas de crianças, que reúnem 500 miúdos todos abonecados, acompanhados por centenas de músicos das Filarmónicas da Terceira, Pico e outra vinda dos Estados Unidos da América.

Com diversos apetrechos, coreografias e rimas, cada uma delas está em representação de algo. Seja instituição cultural, associação desportiva, escolas, homenageando pessoas ou os 75 anos da SATA, companhia aérea dos Açores, defendendo as tradições tauromáquicas da Ilha ou celebrando conquistas de campeonatos de futebol, no caso, a Marcha da Casa do Benfica da Terceira – o Tetra Campeão na Noite de São João – com a águia Vitória como Madrinha.

Como curiosidade, a Marcha de quem veste de vermelho passa sem grandes perturbações pela sede do Sport Clube Lusitânia, delegação nº14 do Sporting Clube de Portugal, histórico clube local que embora vista as mesmas cores verde e branca tem como símbolo um Açor (águia) em vez de um leão. A ausente "troca de mimos" pode explicar-se pelo fato do vice-presidente com o pelouro do Futebol, Ruben Silva, assumir a preferência pelo clube das águias, numa direção que é eclética clubísticamente falando. Descansem os leões que, apesar destas confusões de simbologia, os locais dizem que na Terceira mora um fervoroso bastião sportinguista.

Voltando ao São João, depois dos desfiles há que alimentar algo mais que a vista. Tudo porque a noite é longa e não dá tréguas. A ilha, essa, parece inclinar, tamanha é a imensidão de visitantes que aterra em Angra nesta altura.

Saltar à fogueira, um martelinho numa mão, uma sardinha na outra.

Paulo Rascão | MadreMedia

Com as ruas limpas de bailarinos entram em cena os salteadores das fogueiras colocadas na rua que dá nome à festa. E o espaço onde antes as marchas desfilaram é ocupado como uma massa humana que se movimenta de martelinho na mão a bater na cabeça do vizinho. Rua acima, rua abaixo.

Entram em cena outras músicas, a que não falta o “cheira bem, cheira a Lisboa”, ecoada de umas colunas colocadas numa varanda e que pode lançar alguma confusão geográfica escutar-se tal prosa em pleno oceano Atlântico celebrando uma festa popular a que muitos associam somente à cidade Invicta ou dos Arcebispos. Pode parecer estranho, mas segue-se outra bem conhecida com alusão ao início e fim de “Santo António, São Pedro e São João” que nos coloca na rota das festas populares.

Paulo Rascão | MadreMedia

Há muitos “comes e bebes”. Muitos mesmo. Dizem os locais que durante o São João batem um recorde nacional de maior consumo per capita de cerveja. Os restaurantes nas ruas onde tudo se passa estão abertos a noite toda. E há barraquinhas para todos os gostos. E claro, para além das Francesinhas anunciadas, são distribuídas gratuitamente sardinhas embrulhadas em “folha de pão”.

A animação dura horas e horas. Com concertos e DJ’s. Começa com o pôr-do-sol e só termina quando este nasce. Aí os milhares de adeptos desta festa deitam-se à hora em que por norma se levantam no dia-a-dia.

Uma cidade onze dias em festa

“Muito Nobre, Leal e Sempre Constante Cidade de Angra do Heroísmo” é o tema da edição de 2017 das sanjoaninas, invocando a gratidão de D. Maria II (filha de D. Pedro IV de Portugal) perante os extraordinários serviços e sacrifícios realizados pelos leais habitantes da Terceira.

Ao longo de 11 dias misturam concertos, exposições, gastronomia, corrida de carros, regatas, com destaque para a Angra Bay Cup - XXII 8 aos Ilhéus, organizado pelo Angra Iate Clube, touradas, concursos de ganadarias e a Tradicional Espera de Gado, esta última no âmbito dos festejos de São João, e muito, muito mais.

E para além da tradição, a cultura, a gastronomia, as sanjoaninas juntam mais do que tudo, “a união, o convívio, o extravasar de um povo que trabalha para viver e não vive para trabalhar”, frase que pertence a Francisco Maduro-Dias, poeta, pintor, escultor, desenhador, professor, cenógrafo, natural de Angra do Heroísmo e que resume as festividades que ali decorrem. Até dia 2 de junho.

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