Há 25 anos, a “Please Don’t Go” dos KWS liderava o topo das tabelas britânicas. Não se pode garantir que não tenha sido ao som dessa música que um conjunto de empreiteiros fazia uma série de renovações num palacete em Aigburth, perto de Liverpool, mas há plausibilidade na hipótese. A empresa era a Portus & Rhodes Ltd. e Arthur Rigby, James Coufopoulos e Eddie Lions eram três dos trabalhadores.

O telefone toca. Doreen Montgomery, agente literário, recebe uma chamada na manhã de 9 de maio de 1992.  Do outro lado, uma voz colorida dispara palavras imortais: “Tenho comigo do diário de Jack o Estripador. Está interessado em vê-lo?”.

Era Barrett, Mike Barrett, um sucateiro de Liverpool. Garantia ter recebido de um amigo de família, Tony Devereux, um diário com nove mil palavras onde o autor dos crimes de Londres se confessava. Teria sido, então, um comerciante de algodão, James Maybrick, a matar as cinco prostitutas londrinas.

O diário foi editado e publicado. A autenticidade do livro, porém, foi posta em causa. A morte de Devereux, pouco tempo depois, não ajudou a esclarecer os contornos em que a confissão foi achada.

Duas imperiais, um diário e “On a ragga tip” no rádio

Depois dos KWS, o top elege SL2. “On a Ragga Tip”, cuja letra não impressiona por quaisquer dotes estilísticos de literatura, podia estar a tocar no Saddle Inn, um pub em Anfield, Liverpool. Barret era uma personagem conhecida neste bar e estava sempre a dizer que era escritor. Todavia, a maior conquista literária que conseguiu foi escrever charadas para um semanário infantil.

Eddie Lions, um dos trabalhadores do palacete onde se presume que tenham estado a tocar todas estas músicas, era também cliente do Saddle Inn. Conversa puxa conversa, Barrett acaba ao telefone com um editor e um diário acaba a ser publicado.

A história só agora foi revelada, num novo livro, e vem dar força à teoria de que Jack é James Maybrick, o dono do palacete onde Lions trabalhava na manhã em que Barret telefonou a Montgomery, o agente. O diário foi publicado por Robert Smith, que explica agora como chegou à conclusão de que a proveniência do livro não é Tony Devereux, mas sim a casa de Maybrick.

“O Barrett tinha uma personalidade impetuosa. Bastava-lhe ver ou ouvir falar da assinatura no final do diário para pegar no telefone”, diz Smith ao Telegraph. “Não era muito letrado e a ideia que que pudesse ter sido capaz de produzir uma falsificação tão sofisticada e credível não é remotamente plausível”.

Dúvidas

Quando o diário foi publicado, surgiu desconfiança. Alguns diziam que o documento continha pormenores que só o assassino podia saber, outros sugeriram que era simplesmente uma colagem intrincada que inteligentemente pegava nas notícias dos jornais da época.

Esta última teoria ganhou força quando, em 1995, assinou um documento a dizer que tinha forjado toda a história (mais tarde revogaria a decisão). E até os trabalhadores — Rigby, Coufopoulos e Lions — negaram o envolvimento na descoberta do diário.

Smith, porém, continua irredutível na sua crença. “Nunca tive quaisquer dúvidas de que o diário é um documento genuíno, escrito entre 1888 e 1889”, disse ao jornal britânico. “As novas e irrefutáveis provas - que no dia 9 de maio de 1992 o diário foi retirado de debaixo do soalho do quarto que fora de James Maybrick em 1889 e que foi posteriormente oferecido a um agente literário londrino, derruba quaisquer outras considerações acerca da sua autenticidade”, acredita Smith.

James Maybrick é Jack, o estripador? “É o autor mais provável”, diz Smith. “Agora é o principal suspeito, mas as disputas acerca da identidade de Jack, o Estripador, podem muito bem prolongar-se por mais um século”.

Alice no país dos suspeitos

Há dois anos, o jornal britânico Telegraph compilava uma lista com os principais suspeitos pela série de homicídios que aterrorizou a capital do Reino Unido no final dos anos 1880. Do pai de Winston Churchill, Lord Randolph Churchill, ao autor de Alice no País das Maravilhas, Lewis Carroll, a lista de 15 nomes adensa a confusão.

Jack, o Estripador, ou Jack the Ripper, como é conhecido em inglês, foi um assassino em série que matou brutalmente cinco mulheres na East End londrina, em 1888. Ao longo de 12 semanas, entre o final de agosto e a segunda semana de novembro, Jack terá morto pelo menos cinco prostitutas, cortando-lhes a garganta com uma faca, retirando-lhes, depois, os órgãos internos - estripando-as - e mutilando os corpos.

Do autor nada se sabe, à exceção de uns parcos relatos de alegadas testemunhas. Um homem “de aspeto estrangeiro”. Especula-se que tivesse formação médica ou como talhante para ter levado a cabo aqueles crimes.

Sabemos-lhe o nome, porém, porque ele mesmo, ao que parece, enviou uma carta para uma agência de notícias britânica, a 30 de setembro de 1888 - a chamada carta “Querido Chefe” (Dear Boss) -, que alguns peritos no assunto pensam ter sido escrita pelo próprio assassino.

Nesta carta, Jack apresenta-se com o nome por que todos o conhecem - Jack the Ripper - e descreve o gozo que tem no facto de o as autoridades não o conseguirem apanhar. E não conseguiram mesmo. Numa altura em que a ciência não podia sequer distinguir o sangue humano do sangue animal, as provas forenses não existem para indicar o caminho.