O júri do prémio elogiou o romance pelo seu “poderoso universo ficcional que combina de forma brilhante várias tradições literárias, como a tragédia grega, o realismo mágico e o ‘western’ americano”, bem como pelo seu “olhar cheio de humanidade sobre as tragédias da migração”.

“É um livro no qual convivem toda a fealdade e toda a beleza do mundo”, acrescentou Andrea Marcolongo, um dos elementos do júri, composto ainda pelos escritores Gonçalo M. Tavares, Jonathan Coe, Kapka Kassabova, Valérie Mréjen e Vera Michalski.

O prémio, no valor de 50.000 francos suíços, foi entregue hoje em Montricher, onde se situa a sede suíça da Fundação Jan Michalski, que tem como objetivo consagrar na cena internacional um autor que considera de grande importância.

A Fundação recorda que a obra de Karina Sainz Borgo, recentemente galardoada com o Prémio Gistau, encontra-se traduzida em mais de vinte países.

Para a escritora e jornalista venezuelana radicada em Madrid, colunista do ABC, a literatura e a vida confundem-se e entrelaçam-se através de uma teia de emoções e tragédias.

“O terceiro país" passa-se num território imaginário, Mezquite, inspirado na Comala de Juan Rulfo, "um lugar cujos ventos fortes deixam exposta a Antígona de Sófocles, essa mulher que viola a lei e desafia o poder para enterrar os mortos. A tragédia, mais uma vez, como uma máscara que temos de usar para dar sentido ao que vivemos”, descreve a autora.

“O meu mundo literário, aquele que criei para fazer face àquele que deixei para trás, está cheio de sulcos, de pele ferida, de sangue seco, de ruínas. Deixei o meu país há quase vinte anos. Regresso a ele nos meus romances ou nos meus pesadelos. Enterro uma e outra vez o lugar onde nasci, despeço-me dele para criar uma nova terra”, acrescenta.

Em “O terceiro país”, Angustias Romero e o marido fogem da peste, a caminho das montanhas e da ansiada segurança no país vizinho, levando, atados às costas, os dois filhos ainda bebés.

À sua volta existe apenas miséria, calor e poeira. Os gémeos não sobrevivem à viagem, e Angustias é abandonada pelo marido.

Prosseguindo a viagem sozinha com os cadáveres dos filhos, Angustias chega finalmente ao chamado Terceiro País, localizado na fronteira, um cemitério ilegal vigiado pela mítica coveira Visitación Salazar, que, contra a oposição dos barões da droga e da violência, garante aos sem-terra um último local de descanso.

É aqui que a mulher encontra finalmente lugar para sepultar os filhos. Determinada a ficar sempre perto deles, junta-se a Visitación na sua luta, num lugar onde a lei é ditada por quem empunha as armas, e o tempo é marcado pelas festas e os misteriosos brinquedos que alguém deixa na campa das duas crianças.

Ao longo da narrativa, o perigo e a violência ameaçam implodir a qualquer momento, esbatendo os limites entre a vida e a morte.

“O terceiro país” é o segundo romance da escritora venezuelana editado em Portugal, depois de ter publicado em 2019 “Cai a noite em Caracas”, romance que venceu o Grand Prix de l’Héroïne Madame Fígaro, o International Literary Prize e tem os direitos vendidos para adaptação cinematográfica.

Karina Sainz Borgo nasceu em Caracas, na Venezuela, em 1982.

Além de escritora, é jornalista especializada na área da Cultura e, em 2019, foi considerada pela revista Forbes uma das 100 pessoas mais criativas do ano.