É uma peça, é uma experiência e é um exercício de enorme exigência para um ator só - neste caso, uma atriz que assume toda a despesa de um monólogo nunca igual, uma vez que o texto vai sendo adaptado à interação com o público que assiste à peça “Alice no País dos Bordéis”. Em conversa com o SAPO24, a Sofia de Portugal, que partilha com Francisco Beatriz o protagonismo de uma peça feita para uma só voz, confessa o quão estafante tem sido esta tarefa, definindo-a, todavia, como “uma experiência extremamente enriquecedora”.
O que mais te “assustou” quando soubeste que ias ser a “Alice”?
Quando me apercebi que teria de fazer sete sessões seguidas por dia – por alguma razão não existem monólogos de três horas e meia – e que iria ter o público comigo no mesmo espaço – senti, mesmo, que este poderia ser um dos maiores desafios da minha carreira. Sendo a experiência interativa, o público vai para onde quiser e muita coisa pode acontecer: tens gente a beber, tens gente que põe a mão, que “solta a franga” e, apesar de ser uma experiência incrível, tenho de estar preparada para tudo. Emocionalmente é, também, um grande desafio.
Estar “preparada para tudo” significa que por vezes as pessoas ultrapassam os limites?
Não, de todo. O que eu penso é que nós, os portugueses [a peça tem também uma versão em inglês] somos muito contidos. Muito pudicos ou falsos pudicos. E acho que existem também poucos lugares nos quais podemos entrar nos nossos “alçapões secretos” e levar a vida com mais ligeireza. E penso que é saudável falar de sexo com menos pudor e maior facilidade.
Que tipo de público tem vindo assistir à Alice no Pais dos Bordeis?
Toda a espécie. Gente muito velha – de quem não estava de todo à espera -, que fica derretida, fascinada e gente muito novinha, que cora [risos]. Todo o género de público mesmo: pessoas desbragadas, pessoas tímidas, os que ficam quietos e a pensar “ah, por favor, não te metas comigo”, outros que ficam deslumbrados, pessoas que querem mexer em tudo, pessoas que não querem mexer em nada.
E em relação à linguagem explícita do texto?
No início, há quem fique chocado, mas o choque também passa rapidamente. Principalmente os que já estiveram ou estão a beber, por vezes, querem dizer tudo o que lhes vai na cabeça. E sendo a peça interativa, temos de integrar os que falam na peça, o que exige também um grande poder de adaptação da nossa parte. Em particular, os que seguem para o jantar de degustação soltam-se ainda mais. No fundo, é uma experiência de libertação.
Esta é também uma estreia para ti, enquanto atriz…
É, seguramente, a coisa mais diferente que fiz, sim. Sempre representei textos mais clássicos, portanto não há como enquadrá-la, não tenho nada “da família” deste tipo de espetáculo. E foi também uma estreia para mim no sentido em que aprendo todos os dias. O interessante é que não fazíamos a mínima ideia do que podia acontecer quando começámos o espetáculo. Foi quase como se o tivéssemos começado a construir a partir do momento em que tivemos público.
Que expectativa tinhas em relação à “Alice” do início face à que és agora?
Quem viu a Alice no início e a torna a ver agora, afirma que temos [eu e o Francisco] crescido imenso. Mas as minhas expectativas vão em outro sentido. Considero verdadeiramente que seria muito bom fazer mais espetáculos desta natureza, apostar em espaços de convívio que misturem a arte, a degustação, a interatividade… Diria que tudo isto é muito libertador para as pessoas. Ou, mais ainda, que as predispõe para uma maior felicidade.
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