
Inaugurado em 1997, o Centro de Recuperação de Animais Silvestres da capital portuguesa está sediado em pleno Parque Florestal de Monsanto e foi construído para acolher no máximo 300 animais por ano.
No entanto, a médica veterinária e coordenadora do LxCRAS, Manuela Leite Mira, sublinhou à agência Lusa que o centro recebe “praticamente 2.000 animais por ano” e, em 22 anos, recebeu 20 mil animais.
“Este ano já ultrapassámos os mil [animais]”, referiu.
Dentro da clínica, Manuela Leite Mira e a veterinária Inês Caetano colocaram uma cria de peneireiro vulgar em cima da marquesa para fazerem um ‘check-up’ ao animal, que deu entrada com uma lesão ao nível da articulação.
As causas de entrada de animais selvagens no LxCRAS são várias: quedas de ninhos, atropelamentos, colisões, traumas, armadilhas, doenças e até eletrocussões.
De acordo com o relatório anual de 2018 desta instituição, a maior parte dos animais deu entrada devido a queda de ninho (37,1%) e trauma desconhecido (18%).
No caso do peneireiro vulgar, a reabilitação poderá não ser total e as veterinárias vão tentar endireitar a pata esquerda o suficiente para que esta ave se possa alimentar autonomamente.
“Os animais que são aqui entregues têm um único objetivo: serem reabilitados e devolvidos à natureza”, vincou a responsável, acrescentando, contudo, que, “quando são irrecuperáveis”, os animais costumam ser enviados para parques biológicos, para que “tenham algum fundamento, algum objetivo”, que costuma ser a “educação ambiental”.
Enquanto Manuela Leite Mira e Inês Caetano verificam a asa esquerda de um bufo-real, uma outra veterinária alimenta um andorinhão com a ajuda de uma pinça, massajando a goela da ave para ajudar a engolir.
O LxCRAS está integrado na Rede Nacional de Centros de Recuperação para a Fauna – que é coordenada pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) – e, por isso, recebe animais de todas as partes do país.
Segundo Manuela Leite Mira, o “número de animais tem aumentado” e costumam “ser entregues no centro ou pelo Serviço de Proteção da Natureza e do Ambiente (SEPNA) da GNR, pela Brigada de Proteção Ambiental (BriPA) da PSP”, pelo ICNF ou por particulares.
No entanto, nem todos os animais podem ser acolhidos pelo LxCRAS: “Só recebemos animais da fauna autóctone portuguesa. Os exóticos não têm aqui cabimento”.
A veterinária também exemplificou que, se o centro receber “animais marinhos com determinadas características”, costuma enviá-los para o Centro de Reabilitação de Animais Marinhos – localizado na Gafanha da Nazaré, em Ílhavo, no distrito de Aveiro.
“Um lince não recebemos aqui, porque só um centro é que trata de linces”, esclareceu, completando que, “se algum lince for capturado por algum motivo, tem de ir para Silves, para o Centro Nacional de Reprodução do Lince Ibérico”.
Depois de os animais serem tratados, os profissionais deste centro têm de verificar se estão aptos para voltar à natureza porque ali o “tratamento não é só da parte médica”, mas também da “parte comportamental”.
Pouco antes de sair para libertar alguns animais, a bióloga Verónica Bugalho contou à Lusa que, depois de tratados, os ‘pacientes’ são colocados em “parques de reabilitação”.
Dentro de uma destas estruturas – designada por “túnel de voo” – estão quatro cegonhas, umas das quais ainda demonstra dificuldades a andar, e dois bufos-reais.
“São parques exteriores, de maiores dimensões, com um ambiente mais naturalizado”, elucidou a bióloga, explicando que permitem que os animais “possam voltar a exercitar os músculos, a demonstrar o comportamento e a desenvolver a capacidade de voo e também, em muitos casos frequentes nas aves de rapina, treinar e demonstrar a capacidade de caça”.
Nesta fase, o “acompanhamento é regular, mas não tão apertado como o que é feito na clínica”, fazendo também parte deste processo “o isolamento das pessoas e de outros animais”, porque “os centros de recuperação de animais selvagens não são propriamente” como um hospital.
“Quando vamos a um hospital, somos tratados e depois vamos para casa com algumas recomendações de repouso e medicação, até estarmos a 100%. Neste caso, os animais quando saem do centro têm de estar já a 100%”, esclareceu Verónica Bugalho, completando que os tratamentos não têm um tempo definido, já que “cada caso é um caso”.
Segundo a bióloga, uma ave pode estar em “excelente condição física”, mas se “não tiver a plumagem em boas condições”, a recuperação pode demorar “até um ano”.
Apesar de o LxCRAS estar integrado na rede de centros do ICNF, está sediado “num espaço municipal” e é “totalmente suportado pela Câmara Municipal de Lisboa”.
Para o futuro, a responsável pela coordenação do Centro de Recuperação de Animais Silvestres de Lisboa deseja expandir as instalações: “Achamos sempre que as instalações devem ser melhoradas, que o número de funcionários deve ser ampliado, achamos sempre que poderemos ter muito melhores condições de trabalho.”
Manuela Leite Mira afirmou, contudo, que a autarquia nunca negou qualquer apoio ao centro.
“Temos uma diversidade muito grande de animais e, portanto, temos uma diversidade muito grande de alimento. Alimentos que são caros. É a Câmara [de Lisboa] que suporta [esses custos] e é dada uma resposta muito rápida a esses pedidos”, concluiu.
*André Campos Ferrão (texto) e Miguel A. Lopes (fotos), da agência Lusa
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