CAPÍTULO 1

PORQUE DEVO PREOCUPAR-ME COM A MINHA MEMÓRIA?

QUÃO FREQUENTES SÃO AS PREOCUPAÇÕES COM A MEMÓRIA?

Há um sem-número de razões para cuidar da sua memória. Consideremos as seguintes: o desenvolvimento de uma memória robusta estimula a atenção, a concentração, a abstração, a capacidade de nomear, a visualização espacial, a fluência verbal, a linguagem e a aquisição lexical. Em suma, a memória é a chave para o desenvolvimento das capacidades cerebrais.

Nos Estados Unidos dos nossos dias, qualquer pessoa com mais de 50 anos vive com medo do «Grande A» — a doença de Alzheimer. Meros encontros sociais (jantares, festas, etc.) assumem a atmosfera de um segmento do programa semanal da [estação de rádio norte-americana] NPR: Wait Wait... Don’t Tell Me («Espera, Espera… Não me Digas», em português). Trata-se de um concurso em que os convidados competem intensamente para serem os primeiros a identificar nomes, como o do ator que desempenha determinado papel na mais recente minissérie que todos acompanham. É quase inevitável que alguém venha a pegar no telemóvel para confirmar a exatidão do palpite do primeiro a responder. Rápido, mais rápido, rapidíssimo, para que ninguém suspeite de que possa estar a manifestar os primeiros sintomas do «Grande A».

Embora a doença de Alzheimer não seja tão comum como muitos temem, é cada vez mais frequente que as pessoas partilhem as suas inquietações relativas a lapsos de memória com os amigos. É também a queixa mais comum apresentada por pessoas com mais de 55 anos junto dos seus médicos. Estas inquietações com a memória são, por norma, injustificadas e provocam uma ansiedade desnecessária. Esta ansiedade generalizada contribuiu para criar uma preocupação nacional com a memória e com os indícios de falhas de memória. Uma das justificações para este pânico é a confusão instalada na mente de muitas pessoas em relação à forma como as nossas memórias se formam.

Tente lembrar-se de algo que lhe tenha acontecido durante o dia de hoje. Não tem de ser um acontecimento especial — qualquer evento banal serve para o efeito. Agora reflita sobre a forma como essa memória surgiu.

A meu pedido, recuperou a memória de algo em que talvez não tivesse pensado se eu não lhe tivesse sugerido que recordasse e se não se tivesse esforçado por recuperá-la.

João Pedro Vala junta-se ao É Desta Que Leio Isto no próximo encontro, marcado para dia 21 de março, uma quinta-feira, pelas 21h00. Consigo traz "Campo Pequeno", o seu último livro, editado pela Quetzal.

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Em essência, por memória entende-se a reconstituição de uma experiência passada sob a forma de uma recordação. Do ponto de vista operacional, as memórias são o produto final dos esforços que empreendemos no presente para recuperar a informação que se encontra armazenada no nosso cérebro.

As memórias — tal como os sonhos e os atos imaginativos — divergem de pessoa para pessoa. As minhas memórias são muito diferentes das suas, em função das nossas experiências de vida pessoais.

A memória também diverge de fotografias ou vídeos de acontecimentos passados. Embora estas versões tecnológicas do passado possam servir para estimular a memória, não são, em si mesmas, memórias.

A MINHA MEMÓRIA ESTÁ A FUNCIONAR NORMALMENTE?

Para responder a esta pergunta, comecemos por abordar a ideia de uma função de memória normal. Encontrará abaixo várias questões, que deverá assinalar como constituindo (a) um exemplo de uma memória perfeitamente aceitável ou (b) talvez o início de um problema de memória potencialmente sério.

Questão A. «Após examinar os jornais e selecionar de entre várias promoções, conduzi até ao centro comercial, estacionei e entrei na loja que oferecia essas promoções. Quando saí, não me lembrava de onde tinha estacionado e tive dificuldade em encontrar o meu carro. Demorei vários minutos até localizá-lo no estacionamento lotado.» a ou b?

Questão B. «Depois de sair de uma loja onde fui comprar vários artigos em promoção, não me lembrava se tinha conduzido até ao centro comercial ou se alguém me tinha deixado lá.» a ou b?

Questão C. «Não consigo lembrar-me dos nomes dos meus netos.» a ou b?

Questão D. «Quando estou com a minha irmã, temos memórias muito diferentes de eventos em que ambas participámos quando éramos crianças.» a ou b?

Questão E. «Costumava ter muito jeito para jogar bridge, mas agora ando a falhar. Não me lembro de que cartas já foram jogadas. Agora ninguém quer fazer par comigo.» a ou b?

Questão F. «Quando regressava a casa depois do trabalho, fui pela saída errada na autoestrada. Nunca tal me tinha acontecido.» a ou b?

Questão G. «Tenho cada vez mais dificuldade em lembrar-me de nomes.» a ou b?

Questão H. «Tenho de apontar tudo antes de ir à mercearia, caso contrário esqueço-me de comprar uma ou duas coisas. No entanto, no meu trabalho como ator profissional, mesmo estando já na casa dos 80, não tenho qualquer problema em estudar um argumento durante um fim de semana e, na segunda-feira, ensaiar sem ter de o consultar. Como pode ser?» a ou b?

Questão I. «Preparei o meu carro para uma viagem, mas quando me sentei ao volante não fazia ideia de onde planeava ir.» a ou b?

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Resposta A. A resposta certa é a (a): um esquecimento perfeitamente normal. Na altura em que se dirigiu ao centro comercial, é provável que tivesse a mente focada nas pechinchas que pretendia adquirir. A sua concentração estava longe das preocupações quotidianas, como o estacionamento. Limitou-se a parar no primeiro lugar disponível que encontrou mais próximo da entrada da loja e foi às compras. Como não estava a prestar atenção ao local em que estacionou, não conseguia lembrar-se da sua localização quando saiu da loja. Samuel Johnson afirmou, há mais de duzentos anos, que «a arte da memória é a arte da atenção». A atenção a que Johnson se referia é uma atenção interna: concentrar todas as suas capacidades mentais num único objeto externo. Sem prestar atenção ao local onde estacionou, limitou-se a formar uma memória imperfeita, ou, neste caso específico, memória nenhuma. Teremos muito a dizer sobre atenção mais adiante.

Resposta B. Aqui, a resposta correta é a (b): talvez uma deterioração precoce e séria do funcionamento normal da memória. Neste exemplo, em vez de ter tido dificuldade em lembrar-se de uma coisa entre muitas (o local onde estacionou), perdeu a capacidade de se lembrar sequer de como tinha chegado ao centro comercial, bem como de todas as interações que decerto teriam ocorrido ao longo do caminho, caso tivesse sido transportado de automóvel (falar com o motorista, ouvir rádio, etc.) ou tivesse optado pelos transportes públicos (escolher um lugar para se sentar, olhar pela janela, etc.).

Resposta C. (a) Recordar os nomes dos netos tem relação direta com o interesse que se tem pelos mesmos, ou por crianças em geral. O interesse é o sustentáculo da atenção a que Samuel Johnson se referia. É raro prestarmos atenção a coisas que não nos interessam. Embora o desinteresse pelos netos, aliado à incapacidade de recordar os seus nomes, possa acarretar potenciais atritos no seio da família, não sugere necessariamente uma memória degradada.

Resposta D. Os irmãos, incluindo os gémeos idênticos, não partilham exatamente as mesmas experiências. Diferenças etárias, de género, de interação com adultos, sobretudo familiares — todos estes fatores podem levar a experiências diferentes e, portanto, a memórias dissemelhantes. A resposta é a (a).

Resposta E. (b) A incapacidade de executar uma tarefa devido ao esquecimento de procedimentos mecanizados pode ser preocupante. Quanto mais tempo passamos a desempenhar determinada atividade, menos provável será que a esqueçamos. Nesse caso, quão significativa é esta transformação? Se no seu auge era um jogador mediano, a sua atual quebra de rendimento não deverá ser sinal de um problema grave de memória. Não terá simplesmente perdido o interesse pelo jogo ou pelos jogadores? A questão crucial é: quão significativa é esta transformação? Se era um jogador muito competente e agora ninguém quer jogar consigo, a sua memória merece uma análise mais aprofundada.

Resposta F. (a) A condução pressupõe aquilo que os neurocientistas denominam de memória processual. Depois de repetida a mesma tarefa vezes suficientes, torna-se desnecessário dedicar atenção consciente à sua execução. Ao conduzir de casa para o trabalho e vice-versa, o condutor estabeleceu, ao longo do tempo, uma memória processual que inclui o momento em que é suposto sair da autoestrada. Este processo é automatizado no cérebro através de uma rede específica. Esta memória processual pode ser obstruída por divagações, falta de concentração ou atenção diminuída. Este facto explica igualmente os efeitos da prática excessiva. Os atletas aprendem através da experiência que «dar o máximo» pode, com efeito, afetar o seu desempenho. Neste caso, a memória processual aprendida, que tinha sido estabelecida com base em centenas, ou mesmo milhares, de horas de prática, é substituída por um programa motor consciente automatizado de antemão. Esta é também a causa do choking 1no desporto, isto é, bloquear em momentos de grande pressão: quando um atleta subjuga o seu programa de memória processual à ansiedade que sente em relação ao seu próprio desempenho. Como se pode constatar no exemplo do erro na saída da autoestrada, é possível que diversos aspetos da memória entrem em conflito entre si.

Resposta G. (a) Talvez seja a queixa mais habitualmente manifestada por pessoas de todas as idades no que respeita à sua própria memória. Embora receiem a possibilidade de poderem estar a desenvolver demência, trata-se, na verdade, de um fenómeno bastante comum, que se enquadra bem na categoria do funcionamento normal. Se pararmos para pensar um momento, um nome pode ser substituído por outro com muita facilidade. Chamo-me Richard Restak, mas podia muito bem chamar-me David Restak ou Justin Restak, ou mesmo algo mais sofisticado, como Sebastian Restak. A questão é que não existe necessariamente uma ligação entre um nome e um rosto, daí que os nomes sejam tão difíceis de memorizar. Como veremos mais adiante, existem métodos que permitem a associação entre rostos e nomes. Com alguma prática, é possível aprender a recordar os nomes de dezenas de pessoas e ter menos «momentos de terceira idade»: ser vítima de um lapso de memória e não conseguir lembrar-se do nome de uma pessoa que pretende apresentar a outra.

O segundo princípio operacional da memória, depois da atenção, é o da criação de significado. Um nome é desprovido de significado até que seja estabelecida uma ligação entre esse nome e uma imagem vívida ou uma associação auditiva. Trata-se da ciência da mnemónica: o recurso a um padrão de números, letras, imagens ou associações para auxiliar na memorização de algo. O conceito de mnemónica remonta à Idade Média, e mesmo a épocas anteriores. Abordaremos alguns destes antecedentes históricos no Capítulo 2.

Resposta H. As questões colocadas por este ator prenunciam muitos dos temas que aqui abordaremos: concentração, motivação, deliberação, imagens vívidas e muito mais. A resposta à primeira parte da pergunta, referente à falta de memória em relação aos produtos da lista de compras é (a): corresponde ao desempenho expectável da memória de uma pessoa de 80 anos. À medida que envelhecemos, torna-se cada vez mais difícil conceber listas de compras e depois lembrarmo-nos delas sem que tenhamos chegado a escrevê-las. Como discutiremos em capítulos posteriores, existem métodos para combater esta contrariedade.

A segunda questão colocada pelo ator é intrigante. Ler um novo argumento e memorizar o seu conteúdo tornou-se uma segunda natureza para o ator envelhecido. É agora um processo autónomo. Assim, quando se senta a estudar um argumento, é uma parte diferente do seu cérebro que está envolvida na memorização do diálogo da personagem, por oposição ao funcionamento do cérebro quando está a conceber uma lista de compras. Neste último caso, fica à mercê de todas as vicissitudes da memória próprias de um homem de 80 anos. Esta dicotomia entre a sua experiência teatral e a sua vida quotidiana não surgiu de forma consciente, tendo resultado do estudo de sucessivos argumentos ao longo de muitos anos no teatro. De resto, não se trata de uma situação assim tão habitual entre atores mais velhos. Com o avançar da idade, muitos abandonam o teatro em detrimento do cinema, uma vez que o grau de exigência em relação à memória é menor. Porém, o abandono dos palcos não é inevitável. Uma estrela de cinema de renome mundial, que está na casa dos 80 anos, usa um auricular através do qual lhe são transmitidas instruções quando atua em palco. É provável que isto seja necessário por já não poder depender de uma memória outrora vigorosa que lhe possibilitava aprender um argumento com grande rapidez — um processo conhecido no mundo da representação como «estudo rápido».

Quando interroguei uma atriz profissional na casa dos 40 anos a respeito do dilema do indivíduo de 80 que conseguia lembrar-se dos argumentos teatrais, mas não das listas de compras, esta respondeu-me: «A melhor explicação que me ocorre é que, quando está decorar as suas falas, ele não está apenas a memorizar palavras. Enquanto estuda o argumento da personagem que vai interpretar, antecipa determinadas ações e identifica a motivação da personagem que profere determinadas palavras. Porém, o ator mais velho encarna não apenas palavras, mas também pensamentos, de modo que as palavras do argumento são processadas como expressões da personalidade da personagem. Há também um elemento de «memória muscular» envolvido na assimilação de um argumento. É muito diferente de memorizar uma lista de compras. Quando proferimos palavras em palco, usamos o nosso corpo e a nossa mente por inteiro para nos ligarmos à motivação e à intenção da personagem que representamos. O processo de memorização de um guião é propositadamente intenso, muito concentrado e consciente. A cadência e o ritmo das palavras ligam-se a áreas do cérebro muito além de onde se situa a linguagem.»

Resposta I. Por mais inacreditável que pareça a situação, neste caso específico, a resposta correta é a (a). Esta situação, digna do próprio Clark Griswold 2 , foi-me descrita por um paciente sobrecarregado de trabalho e stressado que, ainda que relutante, havia concordado em usar parte dos dias de férias por gozar que há muito vinha acumulando. 

Embora tenha sido ele a fazer a maioria dos preparativos para as férias (Ellen encarregou-se do resto), a sua contribuição ocorreu durante episódios de ansiedade e pânico ligeiro. Uma avaliação médica completa, incluindo um exame integral à memória, revelou funcionamento normal. Deste modo, podemos incluir este exemplo verídico, mas algo bizarro, na lista daquilo que é considerado funcionamento normal, mas somente como uma ilustração de que qualquer queixa relacionada com a memória deve ser contextualizada considerando o indivíduo que a manifesta.

POSSO CONFIAR NA MINHA MEMÓRIA?

A confiança que pode ter na sua memória depende, em grande parte, da qualidade do treino que lhe dá.

Existem formas ligeiras de amnésia (esquecimento) que fazem parte da vida normal da vasta maioria das pessoas. Sempre que tenta sem sucesso recordar algo que já soube, experiencia uma forma leve de amnésia. Logo, a amnésia não é uma doença rara da memória. Considera-se uma exceção? Ponhamos essa hipótese à prova.

O que almoçou hoje? Não é difícil lembrar-se disso, certo? E o que comeu ao almoço há um mês? Se conseguir recordar-se disso, suspeito de que tenha acontecido algo de excecional nesse dia. Recuemos ainda mais um mês: lembra-se do almoço de há dois meses? (Alguns mnemonistas 3 são capazes disso.) Mais uma vez, a menos que o almoço de há dois meses corresponda a algum evento ou acontecimento especial, é bastante improvável que se recorde dele.

A pequena experiência em que acabou de participar põe em evidência um aspeto crucial.

Quando postos à prova, a maioria de nós recordará muito menos coisas do que acredita ser capaz. Contudo, a nossa memória melhora bastante se aquilo de que tentamos lembrar-nos estiver associado a algo marcante ou emocionalmente estimulante. A memória está intimamente vinculada à relevância emocional.

A formação de uma memória assenta em três processos: codificação, armazenamento e recuperação. Vejamos um exemplo de um erro de codificação: suponha que estava com a mente ocupada ou em plena divagação quando lhe apresentei uma pessoa nova. Por conseguinte, é pouco provável que se lembre do nome dessa pessoa. Devido à sua falta de atenção, a memória não foi estabelecida ou codificada e, como tal, não conseguiu evocá-la mais tarde. Isto é, não havia literalmente qualquer memória.

A ocorrência de um erro de recuperação implica codificar com sucesso uma informação, armazená-la, mas depois ser incapaz de a recuperar. Neste caso, a informação foi, de facto, codificada; contudo, aceder-lhe revela-se impossível.

Uma diferença entre um erro de codificação e um erro de recuperação prende-se com a capacidade de evocar a informação em diferentes contextos. Uma vez que os erros de recuperação são bastante comuns, a maioria dos testes é concebida no formato de escolha múltipla. O teste é mais fácil de administrar e de avaliar, e terá um melhor desempenho em escolha múltipla, pois ser-lhe-á possível identificar uma resposta correta que talvez não conseguisse formular em reação a uma pergunta direta.

A primeira das três fases da memória — a codificação — é a mais determinante. Muitas das sugestões aqui oferecidas relacionam-se com modos de aperfeiçoar a codificação da memória. Fazemo-lo através da transformação de palavras em imagens, algo que nos é mais instintivo. Assumindo que tudo se desenvolve sem contratempos, não precisamos de aprender a ver; é-nos inato. Todavia, temos de aprender — por vezes com considerável esforço — a ler e a escrever. É a clareza e a qualidade das imagens formadas que ressaltam numa memória superpotente. Mais detalhes sobre este tema serão abordados no Capítulo 3.

Como já aqui foi mencionado, a emoção é provavelmente o principal impulso para a criação de imagens vívidas e para a formação de memória. Imagine que ganhou aos seus amigos no jogo de golfe semanal e mal podia esperar para espalhar a sua façanha aos sete ventos. Mas, ao regressar do buraco 18, a sua filha de dez anos correu ao seu encontro para lhe dar os parabéns, foi picada por uma abelha e foi necessário reanimá-la para que, felizmente, recuperasse por completo da anafilaxia. Qual destas memórias lhe parece mais provável que permaneça consigo?

A passagem do tempo atua no sentido de desfazer até a memória mais nítida. Existem, no entanto, compensações, como descreve um dos meus escritores de eleição, George Orwell.

Livro: "Como funciona a nossa memória"

Autor: Richard Restak

Editora: Presença

Data de Lançamento: 6 de março de 2024

Preço: € 16,90

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«Em geral, as nossas memórias de qualquer período tendem a esmorecer à medida que dele nos afastamos. Estamos constantemente a apreender novos factos, e os antigos têm de desaparecer para lhes dar lugar. […] Mas também pode acontecer que as memórias se tornem mais vívidas após um período alargado, pois revisitamos o passado com um olhar renovado e temos a capacidade de isolar e, por assim dizer, discernir factos que antes se misturavam entre uma massa indistinta de outros factos.»

Por fim, deve cuidar da sua memória, porque, em última análise, se aprimorar e preservar as suas capacidades, poderá proteger-se, tanto quanto possível, da devastação trazida pela doença de Alzheimer e outras demências. Os conceitos-chave para consegui-lo são: desenvolver e manter. Este livro proporcionar-lhe-á os meios necessários para desenvolver a sua memória. A parte do processo que visa a manutenção da memória dependerá da implementação diária das minhas sugestões. A implementação tem de ser não só eficaz, mas também agradável e estimulante. O meu objetivo principal é o de contribuir para o desenvolvimento de um leque de habilidades de memória que desperte o seu interesse e o seu entusiasmo.

Uma última observação. Atualmente, não existe forma de garantir a alguém que não virá a desenvolver doença de Alzheimer. Contudo, no decurso dos meus muitos anos de prática clínica em neurologia, não tive um único paciente que possuísse habilidades de memória muito apuradas e que tenha sido vítima de doença de Alzheimer ou de qualquer outra doença neurológica degenerativa. Por outras palavras, uma memória frágil não implica necessariamente a ocorrência de demência, mas uma memória em bom funcionamento elimina virtualmente um diagnóstico concomitante de demência. Quer isto dizer que tem tudo a ganhar e nada a perder com o fortalecimento das capacidades da sua memória.

Como primeiro passo para o desenvolvimento de uma memória de nível superior, exploremos a evolução do pensamento sobre a memória ao longo dos séculos. Quando começou a memória a ser objeto de estudo? Que métodos foram utilizados para a melhorar? Quais eram as teorias subjacentes à importância da memória? E qual é a relevância dada a essas teorias na atualidade?

Para responder a estas questões, façamos um breve levantamento das propostas apresentadas em relação à memória por aqueles que sobre ela se debruçaram ao longo dos últimos dois mil anos.

1 No contexto desportivo, choking (literalmente, «asfixia» ou «engasgamento») refere-se à incapacidade de um atleta ou equipa atuar ou comportar-se de acordo com as expectativas, sobretudo em momentos decisivos ou quando é antecipada uma boa prestação. Em português, este conceito é frequentemente comunicado através de expressões como «ceder à pressão» ou «vacilar» em momentos cruciais. (NT)

2 Clark Griswold, personagem interpretada por Chevy Chase na série de filmes Que Paródia de Férias, é célebre pelos seus planos de férias entusiásticos que invariavelmente acabam em desastres cómicos. (NT)

3 «Mnemonistas» são indivíduos com uma capacidade de memorização extraordinária, por exemplo, para listas de nomes, datas históricas, citações, etc. Embora muitas vezes se lhes atribua a chamada «memória eidética», isto é, a habilidade de visualizar um objeto por alguns minutos após a sua remoção do campo de visão, debate-se se tal capacidade é inata ou adquirida. Vários têm sido os mnemonistas que se tornaram figuras de grande relevo na cultura global, como Nikola Tesla ou C.S. Lewis. (NT)