“Como o tribunal Judicial do Distrito de Nhlamankulu ordenou a repetição dos atos eleitorais (…), procedimento a ser executado pela Comissão Distrital de Eleições, não pode fazer carreira que seja este órgão a recorrer”, refere-se no acórdão do CC a que a Lusa teve acesso.

Em causa está a decisão tomada pelo Tribunal Distrital de Nhlamankulu de anular todos atos eleitorais em 64 assembleias de voto, onde foi constatado que editais que serviram para o apuramento intermédio deste distrito são diferentes dos editais recebidos pelos delegados de candidatura no momento do apuramento parcial nas mesas de votação, “um vício que afetou a liberdade e transparência” do processo, segundo o tribunal.

O CC esclarece que o acórdão sobre a legalidade da decisão do tribunal de anular os atos eleitorais nas assembleias de voto será alvo de análise em processo próprio, mas não dá provimento ao recurso submetido pelo presidente da Comissão Distrital de Eleições do Distrito Nhlamakulu.

“Só têm legitimidade de recorrer do acórdão judicial os que sofreram prejuízos da procedência ou execução do acórdão, prejuízo que a comissão distrital não é capaz de demonstrar em sua esfera jurídica, como defensor do interesse público de justiça, transparência, imparcialidade e legalidade eleitoral”, refere-se no documento do CC.

O ofício que contestou a votação em Nhlamankulu foi submetido pela Resistência Nacional Moçambicana (Renamo) em 15 de outubro, no qual se denunciou a alegada fraude com recurso a cópias de editais falsificados para o apuramento intermédio da Comissão Distrital de Eleições (CDE) no escrutínio de 11 de outubro, onde a Frente de Libertação de Moçambique (Frelimo) foi anunciada como vencedora.

Segundo o acórdão do tribunal distrital, testemunhas foram unânimes ao afirmar que a deliberação n.º3/ CDE/2023 foi fruto das cópias de editais e atas que o Secretariado Técnico de Administração Eleitoral no distrito, através do seu presidente, trouxe para realização do apuramento intermédio.

“O tribunal entende que os órgãos que se encontravam na CDE ignoraram os factos mesmo sabendo que atropelavam e feriam a lei”, pode ler-se no documento daquele órgão de justiça, que avança ainda que a deliberação que deu vitória à Frelimo, partido no poder em Moçambique, foi redigida na ausência dos vogais da Renamo.

De acordo com o edital de apuramento intermédio apresentado pelos órgãos eleitorais, na capital moçambicana, a lista da Frelimo na cidade de Maputo, liderada por Razaque Manhique, recolheu 235.406 votos (58,78%), a da Renamo, liderada por Venâncio Mondlane, 134.511 votos (33,59%) e a do Movimento Democrático de Moçambique (MDM), liderada por Augusto Mbazo, 24.365 votos (6,8%).

As sextas eleições autárquicas em Moçambique decorreram em 65 municípios do país no dia 11 de outubro, incluindo 12 novas autarquias, que pela primeira vez foram a votos.

Segundo resultados distritais e provinciais intermédios divulgados pelos órgãos eleitorais nos últimos dias sobre 50 autarquias, a Frelimo venceu em 49 e o MDM na Beira.

Pelo menos cinco tribunais distritais já reconheceram irregularidades nas eleições e ordenaram a repetição de vários atos eleitorais, em alguns casos com os órgãos eleitorais e o partido no poder a submeterem recursos juntos do Conselho Constitucional (CC) em contestação às sentenças, acórdãos e despachos dos tribunais distritais.

O CC, a quem cabe exclusivamente a validação de eleições em Moçambique, começou hoje a decidir sobre o processo, tendo já anulado a decisão de invalidar o escrutínio em Chokwé, que tinha sido tomada por um tribunal distrital.

O consórcio Mais Integridade, coligação de organizações não-governamentais moçambicanas que observaram o processo, acusou a Frelimo, partido no poder, de ter manipulado os resultados das eleições autárquicas, protagonizando “um nível elevado de fraude”.