O antigo diretor do FBI, James Comey, afirmou, perante o Comité dos Serviços de Inteligência do Senado, que estranhou as razões pelas quais foi demitido do cargo por Donald Trump.

Segundo Comey, o presidente norte-americano, antes e depois de assumir a presidência, disse-se feliz com o trabalho desempenhado pelo antigo diretor do FBI. "Ele disse-me repetidamente que estava a fazer um ótimo trabalho e que esperava que eu ficasse", revelou o antigo diretor do FBI.

Um dia, conta, estava a entrar no helicóptero, quando recebi uma chamada de Trump só para lhe dizer que estava a fazer um bom trabalho.

Por essas palavras, que mais tarde se juntaram ao facto de Trump ter dito na televisão que tinha demitido Comey devido à investigação sobre a alegada influência da Rússia nas eleições presidenciais de 2016, o antigo diretor da polícia federal norte-americana disse-se surpreendido. "As explicações divergentes confundiram-me e preocupavam-me cada vez mais", disse Comey, explicando que por isso "as razões para a minha demissão não fizeram qualquer sentido".

"A [Casa Branca] difamou-me a mim e, mais importante, difamou o FBI", disse James Comey.

O que disseram no governo "foram mentiras, puras e simples", declarou Comey diante da Comissão de Inteligência do Senado americano.

Em resposta, o ex-diretor da polícia federal norte-america disse que "o FBI é honesto, o FBI é forte e o FBI é e sempre será independente".

"Sei que fui despedido por causa da maneira como estava a conduzir a investigação acera das ligações com a Rússia, e digo-o com base no que ele [Donald Trump] disse. Porque estava, de alguma maneira, a colocar alguma pressão nele.E a irritá-lo", disse Comey que sublinhou que foi despedido para que a  "investigação fosse conduzida de outra maneira".

Mais tarde, o senador democrata Joe Manchin, de West Virginia, perguntou se James Comey achava que teria sido despedido caso Hillary Clinton fosse presidente.

"Isso é uma excelente pergunta", disse Comey. "Eu não sei", respondeu.

Trump não pediu que Comey interrompesse a investigação

Questionado sobre a intervenção direta de Donald Trump na investigação acerca da intervenção da Rússia nas eleições presidenciais de 2016, em que o republicano acabou por derrotar Hillary Clinton, Comey disse que nunca lhe foi pedido que interrompesse a investigação.

No entanto, o antigo diretor do FBI "não tem dúvidas" de que o governo russo esteve por trás de várias interferências de tentativas de manipulação da  eleição norte-americana. Apesar disso Comey disse-se "confiante" de que nenhum voto foi alterado em novembro do ano transato.

Comey acrescentou ainda que não é o seu papel afirmar se Trump incorreu num crime de obstrução à Justiça ao sugerir maneiras de realizar a investigação sobre a suposta ingerência russa.

"Não acho que deva dizer se as conversas que tive com o presidente podem ser consideradas obstrução à Justiça. Foi uma coisa muito perturbadora, desconcertante", disse o antigo diretor do FBI.

Você acredita que Donald Trump conspirou com a Rússia?, perguntou o senador Tom Cotton, do Arkansas.

"Essa é uma pergunta que eu acho que não deveria responder numa audiência aberta", respondeu Comey

"Estava honestamente preocupado" que Trump "pudesse mentir sobre" a reunião

Esta quarta-feira foram divulgadas pelos media norte-americanos as notas pessoais de James Comey sobre os seus encontros privados com Donald Trump. Nessas mesmas notas é relatado um encontro em que o presidente terá pressionado Comey a 'largar' a investigação sobre Michael Flynn e a Rússia, assim como um jantar entre os dois em que Trump lhe pediu lealdade.

Esta quinta-feira, no Senado, o antigo diretor do FBI foi questionado sobre as razões porque tomou nota daqueles encontros. Foi "uma combinação de coisas. As circunstâncias, o assunto e a pessoa que estava perante mim", disse Comey.

"Eu estava honestamente preocupado que ele [Donald Trump] pudesse mentir sobre a natureza da nossa reunião, então pensei que seria importante documentá-la", confessou.

"Eu sabia que poderia chegar o dia em que eu precisaria de um registo do que aconteceu, não apenas para me defender, mas para defender o FBI", disse Comey ao mesmo tempo que revelava que se tinha reunido duas vezes em três anos com Barak Obama e que não tinha sentido qualquer necessidade de documentar essas mesmas reuniões. O mesmo terá acontecido com o George W. Bush, revelou Comey.

Investigação sobre Michael Flynn: "Não houve ordem explícita, mas "interpretei-o como uma instrução"

Questionado sobre o pedido de Donald Trump para que o FBI deixasse de investigar Michael Flynn, Comey disse que a palavra utilizada não foi um pedido expresso, uma vez que ele utilizou a palavra "hope" (esperar) e não outra expressão que implicasse uma ordem.

No entanto, o antigo diretor da polícia federal norte-americana disse que, por estar perante o presidente do Estados Unidos, que interpretou tais palavras como "uma instrução".

A preocupação no FBI era de não deixar "contaminar a equipa de investigação. Não queríamos que os agentes soubessem o que o presidente havia pedido", disse o ex-diretor.

Em resposta, o senador republicano Marco Rubio questionou Comey se, ao interpretar daquela forma o pedido de Trump, não lhe disse que aquele era um pedido inapropriado, ao que o antigo diretor do do FBI respondeu "não, nem sei porquê". "Fiquei petrificado. A única coisa que veio à minha cabeça foi: tem cuidado com o que dizes", sublinhou.

Por que razão devemos acreditar em você, questionou o senador Heinrich.

"Eu acho que as testemunhas devem ouvir todo o meu testemunho ... um facto realmente importante para mim é a razão pela qual ele expulsou toda agente da Sala Oval? ... Para mim como um investigador é um facto muito significativo ".

Para além do caso que envolve o ex-conselheiro de segurança nacional Michael Flynn, Marco Rubio pediu que Comey confirmasse se os três alegados pedidos de Trump ao antigo diretor do FBI eram todos verdade, sendo eles: "Lealdade. Encerrar a investigação a Michael Flynn. Dizer publicamente que ele não estava sob investigação".

A resposta de Comey foi afirmativa: "Essas foram as coisas que ele me pediu, sim senhor".

Comey divulgou 'notas' das reuniões com Trump propositadamente

James Comey disse que após ter sido despedido e ao ter lido um post na rede social Twitter de Donald Trump em que o presidente norte-americano diz "o melhor é que Comey deseje que não haja gravações", o antigo diretor do FBI afirmou que a partir desse momento que os seus registos das suas reuniões com Trump deveriam ser divulgados para a praça pública, nomeadamente a conversa acerca de Michael Flynn.

Comey conta que partilhou os registos das conversas com um "grande amigo que é professor na Universidade de Direito de Columbia" para que este os fizesse chegar aos media americanos.

Depois acrescentou: "Eu espero que haja gravações".

James Comey foi demitido de forma repentina, a 9 de maio, numa altura em que estava a supervisionar uma investigação sobre os alegados contactos mantidos entre a campanha de Trump e a Rússia durante a corrida às presidenciais nos Estados Unidos.

Vários ‘media’ norte-americanos revelaram que o Presidente teria pedido a Comey para terminar as investigações relacionadas com o seu ex-conselheiro de segurança nacional Michael Flynn, acusado de mentir sobre contactos com responsáveis russos e uma das figuras centrais do dossiê russo.

Segundo notas pessoais escritas pelo ex-diretor do FBI, e divulgadas ontem, o pedido teria sido feito durante uma reunião na Casa Branca, em fevereiro.

Trump nega qualquer interferência, bem como rejeita a ideia de um conluio com Moscovo.

Foi nomeado, entretanto, o ex-diretor do FBI Robert Mueller como procurador especial para supervisionar a investigação sobre a alegada interferência russa.

Questionado sobre a audição de James Comey, Trump respondeu: “Desejo-lhe boa sorte”.

Na véspera da audição de Comey, Trump anunciou que pretende nomear Christopher Wray, um advogado de 50 anos, para a direção do FBI.

Na terça-feira, e também no âmbito do dossiê russo, o comité ouviu responsáveis dos serviços de informação norte-americanos.

Tanto Mike Rogers, diretor da Agência de Segurança Nacional (NSA), como Dan Coats, coordenador das várias agências de informações norte-americanas, afirmaram que nunca sofreram pressão política desde que assumiram funções.

[Notícia atualizada às 17h50]