"Reiterei ao primeiro-ministro que o meu lugar está naturalmente à sua disposição desde o dia em que iniciei funções. Este sempre foi o meu entendimento desde o início das minhas funções governativas e continuará a sê-lo", disse esta segunda-feira o ministro das Finanças Mário Centeno.

Sobre a troca de correspondência com António Domingues, que envolveria um compromisso para dispensar os ex-gestores de entregarem a declaração ao Tribunal Constitucional, Centeno disse que "a verdade é que nunca neguei que houvesse acordo, só que ele não envolvia a obrigação do dever de entrega das mencionadas declarações, matéria prevista noutro diploma não revogado ou alterado".

"Acordo do Governo para alterar o estatuto de gestor público, claro que houve. Acordo do Governo para eliminar aquele dever não houve. Ao analisar todo este longuíssimo e complexo processo admito que possa não ter afastado do entendimento do Dr. António Domingues, por eventual erro de preceção mútuo, a ideia de que o acordo poderia eliminar de alguma forma a entrega da declaração de dever ao tribunal Constitucional", acrescentou o ministro.

Já no período de perguntas e respostas, Mário Centeno sublinhou que ao longo de todo este processo sempre pugnou pela "seriedade", entendo que esse é o seu dever como governante. "Sempre falei verdade, incluindo perante os órgãos de soberania. Estive sempre de boa-fé", disse.

Acrescentou ainda que a acusação de prestação de falsas declarações foi feita "com base em informação parcial, e não corresponde de todo à verdade".

Novamente questionado sobre o estatuto de gestor público, o ministro das Finanças afirmou que "a ideia de retirar o estatuto de gestor público ao conselho de administração da Caixa sempre foi o de que a Caixa passasse a ser tratada como qualquer outro banco nessa dimensão", sublinhando que as medidas do Governo acerca do banco público tiveram sempre como objetivo colocar a Caixa Geral de Depósitos "num nível de concorrência com as outras instituições bancárias".

Toda esta legislação, assim como a procura de uma solução de capitalização sem ajudas de estado, foram os únicos temas de correspondência trocados entre António Domingues e o ministério das Finanças, reiterou Centeno.

O ministro das Finanças diz ainda que a polémica em relação ao estatuto de gestor público terá-lhe chegado às mãos no dia 15 de novembro, através de uma carta, na qual António Domingues expressava ao governante que "alguns membros do Conselho de Administração da Caixa Geral de Depósitos teriam problemas em se conformar" com esse mesmo estatuto. No entanto, o " dr. António Domingues não se incluía nesses alguns membros do Conselho", disse.

Sobre as declarações do antigo líder social democrata, Luís Marques Mendes, que acusou o Governo de ter manipulado a data de publicação do decreto-lei de exceção para os administradores da Caixa Geral de Depósitos, Centeno apelou à compreensão dos demais, dizendo que o decreto foi atrasado pela complexidade das negociações, que decorreram por várias cidades europeias, em reformular todo o conselho de administração de um banco.

Questionado sobre uma eventual troca de sms com Domingues, o ministro das Finanças foi peremptório: "Todas as comunicações privadas que eu tenho com o Dr. António Domingues, são privadas. Aquilo que eu posso garantir foi que o estatuto de gestor público iria ser alterado, a Caixa iria ficar isenta de implementação do estatuto, sem nenhuma restrição adicional".

Sobre se esta situação o deixa fragilizado, Centeno lembrou um caso semelhante que tinha acontecido naquele mesmo salão há um ano, na altura sobre o processo orçamental de 2016. "Não me cabe a mim avaliar as questões que me podem ou não fragilizar. Aquilo que posso garantir é que o processo orçamental de 2016 foi o processo de maior sucesso da história recente portuguesa", disse relembrando os números hoje divulgados por Bruxelas que confirmam uma descida do défice para 2,3% e uma perspetiva de crescimento económico de 1,3%, ligeiramente acima dos 1,2% avançados pelo Governo.

"A fragilização do ministro das Finanças faz-se com os resultados que o país obtém e que são auditados por todos", concluiu.

As declarações surgem um dia depois do comentador e ex-líder do PSD Marques Mendes ter acusado o Governo, no seu espaço comentário semanal de domingo no jornal da noite da SIC, de ter manipulado a publicação do decreto-lei que criou exceções para os gestores da Caixa Geral de Depósitos. Marques Mendes disse que o Governo atrasou a publicação para evitar alterações no Parlamento.

“O Presidente da República promulgou no dia 21 de junho, mas só foi publicado no dia 28 do mês seguinte, ou seja, o Governo congelou este decreto-lei, manipulou a data de publicação porque 28 de julho é o início das férias da Assembleia da República. Ou seja, queriam diminuir o risco dos deputados se aperceberem”, acrescentou Marques Mendes.

Na República Cento Africana, onde o primeiro-ministro visita as tropas portuguesas, António Costa classificou tais comentários de "ficção policial", completamente dissociada da realidade política.

No entanto, as polémicas ligadas ao banco público vêm de trás. Na semana passada um artigo do jornal online “ECO” revelou uma carta de António Domingues ao ministro Mário Centeno, de novembro, segundo a qual haveria um compromisso dispensar os ex-gestores de entregarem a declaração ao Tribunal Constitucional. O assunto foi levado na quarta-feira, dia 8 de fevereiro, ao Parlamento pelo PSD e pelo CDS-PP, que confrontaram o primeiro-ministro.

O porta-voz dos democratas-cristãos, João Almeida, lembrou um pedido efetuado em novembro para aceder a correspondência e comunicação trocada entre António Domingues e a tutela, à qual o Ministério das Finanças respondeu, em janeiro, que "inexistem trocas de comunicações com as características descritas".

Em conferência de imprensa, no Parlamento, o deputado centrista admitiu perguntar ao ministro das Finanças "se quer voltar atrás na resposta que deu" e prometeu não deixar de "voltar a chamar António Domingues para dizer se existem ou não as informações que até ao momento o Ministério e o Governo têm dito que não existem".

João Almeida lembrou a possibilidade de Centeno "cair na moldura penal de perjúrio", uma vez que os inquéritos parlamentares têm "poderes idênticos aos dos processos judiciais". "Relativamente à quebra de verdade pelo ministro das Finanças, essa é inequívoca. Poderá estender-se ainda mais com a análise de documentos que, por enquanto, estão sob reserva, mas é evidente já que o ministro das Finanças disse à comissão de inquérito que inexistia aquilo que existe", disse o parlamentar democrata-cristão.

O ministro das Finanças, Mário Centeno, repudiou as acusações do CDS-PP relativas à omissão de informações sobre a CGD e acusou o partido de truncar factos para produzir uma “vil tentativa de assassinato” do seu caráter.

Numa declaração escrita, o gabinete de Mário Centeno afirma ter enviado informação ao presidente da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) à Caixa Geral de Depósitos (CGD), que “o CDS-PP escolheu omitir na conferência de imprensa que deu hoje sobre esta matéria, truncando, pois, os factos para produzir uma vil tentativa de assassinato do caráter do ministro das Finanças".

Questionado sobre o caso, durante uma visita a Vila Real na semana passada, António Costa garantiu que Centeno tem "toda a sua confiança" e acrescentou que este é "admirado" pelo país pelo trabalho que tem vindo a desenvolver. O Primeiro-ministro acusou ainda a oposição de se dedicar a "tricas" políticas enquanto o Governo está focado em gerir o país.

Marcelo também já se pronunciou sobre este caso, dizendo que, até prova em contrário, confia no ministro das Finanças e na posição do Governo. “Ou há um documento escrito pelo senhor ministro das Finanças em que ele defende uma posição diferente da posição do primeiro-ministro ou não há. Se não há é porque ele tinha a mesma posição do primeiro-ministro. Para mim, é evidente”, afirmou Marcelo Rebelo de Sousa.

O Presidente sublinhou que o primeiro-ministro, António Costa, disse-lhe sempre que a posição do Governo nessa matéria era a de que os gestores teriam que entregar as declarações de rendimentos conforme prevê a lei, de 1983. “Foi sempre evidente para mim, para o primeiro-ministro, para o Tribunal Constitucional. Até encontrar alguma coisa assinada pelo ministro das Finanças que diga uma coisa diferente, para mim o ministro das Finanças tinha a mesma opinião do primeiro-ministro”, disse Marcelo Rebelo de Sousa.

[Notícia atualizada às 19:24]