Numa declaração de cerca de quatro minutos, lida na Sala das Bicas do Palácio de Belém, Marcelo Rebelo de Sousa afirmou que "Mário Soares nasceu e formou-se para ser um lutador e para ter uma causa para a sua luta: a liberdade", e considerou que esse foi "o penúltimo combate" que travou.

"Resta a Mário Soares, como inspirador, travar o derradeiro combate, aquele em que estamos e estaremos todos com ele: o combate pela duradoura liberdade com justiça na nossa pátria comum, que o mesmo é dizer, o combate da imortalidade do seu legado, um combate que iremos vencer, porque dele nunca desistiremos, tal como Mário Soares nunca desistiu de um Portugal livre, de uma Europa livre, de um mundo livre. E, no que era decisivo, ele foi sempre vencedor", acrescentou.

Mário Soares morreu hoje, aos 92 anos, no Hospital da Cruz Vermelha, em Lisboa, onde se encontrava internado desde o dia 13 de dezembro.

"Travado o seu penúltimo combate, partiu do nosso convívio de todos os dias o Presidente Mário Soares", declarou Marcelo Rebelo de Sousa, no início da sua intervenção.

De gravata preta, o Presidente da República relembrou momentos marcantes da vida política de Mário Soares, dizendo que, "como toda a personalidade de eleição, conheceu a glória e o revés, os amores e os desamores de cada instante", e lembrando também que teve ao seu lado "Maria de Jesus Barroso, sua mulher e sua companheira de luta", que morreu em 2015.

"Há imagens únicas que ninguém esquecerá: a presença corajosa ao lado de Humberto Delgado, a resistência a partir do exílio, a chegada a Santa Apolónia, o discurso na Fonte Luminosa, o debate com Álvaro Cunhal, a disponibilidade para servir como primeiro-ministro em duas crises financeiras graves, a tenacidade no termo da primeira volta das presidenciais de 86, o calor irrepetível no encontro com os portugueses nas presidências abertas, a alegria no diálogo com as gentes da cultura, o sonho de um Timor-Leste independente, a presença na manifestação contra intervenção no Iraque", referiu.

Marcelo Rebelo de Sousa recordou, acima de tudo, o antigo chefe de Estado, como um lutador pela liberdade, em Portugal, na Europa e no mundo: "Foi em homenagem à liberdade que se viu perseguido, preso e deportado, e viveu no exílio até 1974. Que por ela se bateu durante os conturbados anos da revolução. Que liderou um partido, fez ouvir a sua voz nos parlamentos, português e europeu, chefiou vários governos, presidiu aos destinos da pátria".

"Mas foi sobretudo como lutador da liberdade que se revelou determinante a criar a nossa democracia, a votar a nossa Constituição, a ver a lusofonia como comunidade de Estados soberanos e irmãos, a pedir a adesão às Comunidades Europeias e a subscrevê-las, sonhando com uma Europa das pessoas e da solidariedade. A abrir a nossa diplomacia ao mundo, a condenar as violações dos direitos humanos e as intolerâncias internacionais. A defender a igualdade que permitisse a verdadeira liberdade, num quadro de um socialismo democrático", completou.

Nascido em 07 de dezembro de 1924, em Lisboa, Mário Alberto Nobre Lopes Soares desempenhou os mais altos cargos no país e a sua vida confunde-se com a própria história da democracia portuguesa.

Combateu a ditadura, foi fundador e primeiro líder do PS, ministro dos Negócios Estrangeiros após a revolução do 25 de Abril de 1974, e primeiro-ministro entre 1976 e 1978 e entre 1983 e 1985.

Foi Soares a pedir a adesão à então Comunidade Económica Europeia (CEE), em 1977, e a assinar o respetivo tratado, em 1985. Em 1986, ganhou as eleições presidenciais e foi Presidente da República durante dois mandatos, até 1996.