"Esta mecha de cabelo permaneceu em segredo por muito tempo. Encontrámo-la há três anos nos Estados Unidos e vai permitir-nos fazer análises de ADN", explicou à agência noticiosa France-Presse o historiador de arte Alessandro Vezzosi.

"Após 40 anos de estudos sobre a genealogia de Da Vinci, em 2016 apresentámos 35 descendentes indiretos vivos do mestre. Pouco tempo depois fui contactado por um colecionador que revelou possuir a mecha de cabelo e que concordou em mostrá-la", acrescentou.

Nascido em 1452 de um relacionamento ilegítimo entre um rico notável e uma camponesa adolescente, Leonardo foi criado pelo seu avô paterno e pelo seu tio. A teoria oficial sustenta que ele não teve filhos mas teve "uma dúzia" de meio-irmãos.

Alessandro Vezzosi escolheu simbolicamente o 500.º aniversário da morte do mestre italiano para apresentar na biblioteca leonardiana da pequena cidade de Vinci, na Toscana, o que ele chama de "relíquia".

Trata-se de algumas dezenas de fios de cabelo claros, entre o branco e o louro, afixados num quadro com a inscrição em francês "Os Cabelos de Leonardo Da Vinci" e um anel de bronze que os documentos históricos descrevem como aquele que o artista usava.

"Não podemos afirmar com 100% de certeza que se trata dos seus cabelos, mas dizemos que é possível, com base nas pesquisas genealógicas, comparar o ADN deste material genético com o dos seus descendentes vivos, encontrados na Toscana, e em diversas sepulturas em França e em Espanha", explicou Alessandro Vezzosi.

Segundo o especialista da época Renascentista, a mecha de cabelo e o anel apresentados pertenceram ao escritor francês Arsène Houssaye (1814-1896), inspetor geral dos museus da província, que foi encarregado em 1863 de realizar escavações no túmulo de Leonardo, no castelo de Amboise, no Vale do Loire (centro de França).

A autenticidade da mecha suscita dúvidas a Eike Schmidt, diretor da Galerie des Offices, famoso museu florentino onde estão expostas várias obras de Leonardo Da Vinci.

"Nenhum especialista acredita. Além disso, é extremamente improvável que esta mecha de Leonardo possa estar numa coleção americana", declarou à imprensa.

"A tradição de colecionar mechas de personagens famosos data do século XIX" e não da Renascença, apontou.

As escavações de Arsène Houssaye revelaram um esqueleto com a mão direita colocada atrás da cabeça, fragmentos de túmulo com as menções -EO -AR-DUS -VINC- ("EO" atribuído a Leonardo e "VINC" a Vinci) e medalhas francesas e italianas do início do reinado de Francisco I. Também foram encontrados alguns restos de barba e cabelos brancos.

Falecido a 2 de maio de 1519, aos 67 anos, Da Vinci passou os últimos três anos da sua vida em França, onde o rei Francisco I o convidou para exercer os seus muitos talentos nas artes e nas ciências.

Da Vinci foi enterrado na igreja Saint-Florentin, no castelo, mas o edifício foi destruído em 1807 e os seus supostos ossos encontrados por Arsène Houssaye estão desde 1874 na capela de Saint-Hubert, em Amboise.

O paradeiro da mecha e do anel foi descoberto no século XX nos Estados Unidos, adquiridos por um colecionador e depois por um segundo. Este último, que deseja permanecer anónimo, entrou em contacto com Vezzosi.

No entanto, os investigadores não pretendem "perturbar o descanso do genial inventor para realizar análises de ADN", um ato "que poderia ser percebido como uma profanação", explica Vezzosi.

"Com os descendentes vivos e as sepulturas de descendentes, podemos fazer comparações sem tocar no túmulo, que é um lugar a ser respeitado pelo seu significado histórico e simbólico", diz o historiador, que deve revelar as conclusões da sua investigação nos próximos meses.

*Por Franck Iovene / AFP