Depois de vários dias de intensa polémica em torno do papel e da capacidade da ministra da Administração Interna, em gerir a situação decorrente dos incêndios que este verão assolaram o país, Constança Urbano de Sousa apresentou hoje a demissão do seu lugar no Governo e o primeiro-ministro, António Costa, aceitou. A notícia é avançada pela agência Lusa.

"A ministra da Administração Interna apresentou-me formalmente a demissão em termos que não posso recusar", diz o primeiro-ministro na nota enviada às redações.

No comunicado, António Costa agradece publicamente "a dedicação e empenho com que [a ministra] serviu o País no desempenho das suas funções".

Segundo carta enviada pela ministra a António Costa, e que está a ser veiculada esta manhã, Constança Urbano de Sousa pediu a sua demissão, uma primeira vez, logo a seguir aos incêndios de Pedrógão Grande, tendo se mantido em funções a pedido do primeiro-ministro que lhe terá dito que não se podia ir "pelo caminho mais fácil". A ministra voltou a pedir a demissão este fim de semana na sequência dos incêndios que de novo assolaram o país e, três dias depois e na manhã seguinte ao discurso mais duro de Marcelo Rebelo de Sousa desde que é Presidente da República, António Costa aceitou.

Na carta de demissão enviada ao primeiro-ministro, a ministra escreve: "Logo a seguir à tragédia de Pedrógão pedi, insistentemente, que me libertasse das minhas funções e dei-lhe tempo para encontrar quem me substituísse, razão pela qual não pedi, formal e publicamente, a minha demissão", escreve a Constança Urbano de Sousa.
A ministra diz que o fez "por uma questão de lealdade" e que o primeiro-ministro, na altura, lhe pediu para se manter em funções.

"Desde junho de 2017, aceitei manter-me em funções apenas com o propósito de servir o País e o Governo, a que tive a honra de pertencer", lê-se na carta a que a SIC Notícias teve acesso. "Durante a tragédia deste fim de semana, voltei a solicitar que, logo após o seu período crítico, aceitasse a minha cessação de funções, pois apesar de esta tragédia ser fruto de múltiplos fatores, considerei que não tinha condições políticas e pessoais para continuar no exercício deste cargo, muito embora contasse com a sua confiança".

"Tendo terminado o período crítico desta tragédia e estando já preparadas as propostas de medidas a discutir no Conselho de Ministros extraordinário de dia 21 de outubro, considero que estão esgotadas todas as condições para me manter em funções, pelo que lhe apresento agora, formalmente, o meu pedido de demissão, que tem de aceitar, até para preservar a minha dignidade pessoal", conclui a ministra na carta enviada a António Costa.

Quatro meses a resistir

Desde a tragédia de Pedrógão Grande, onde morreram pelo menos 64 pessoas, que a demissão da ministra da Administração Interna era pedida por toda a oposição, mas até hoje o primeiro-ministro tinha resistido a afastar Constança Urbano e Sousa, alegando que era tempo de agir e não de pensar em demissões.

A pressão aumentou a partir da semana passada, com a divulgação dos relatórios encomendados aos peritos para apurar o que correu mal em Pedrógão Grande. Estes documentos questionaram as recentes mudanças na Proteção Civil, apontado o dedo à falta de meios e às falhas de comunicação.

Mesmo depois disto, António Costa resistiu. Numa declaração ao país na segunda-feira, o primeiro-ministro pediu consenso político para a aplicação das recomendações da comissão independente aos fogos de junho e prometeu que, no fim dos incêndios, o Governo assumiria totais responsabilidades na reconstrução do território e reparação de danos.

O primeiro-ministro prometeu também abertura à existência de um mecanismo "ágil" para compensar as famílias das vítimas dos incêndios florestais e frisou que o seu executivo assumirá "todas as responsabilidades que tiver de assumir".

Depois de António Costa falar ao país, a líder do CDS-PP anunciou uma moção de censura ao Governo, em resultado dos incêndios e devido à falha em "cumprir a função mais básica do Estado: proteger as pessoas".

Mas foi o discurso ao País do Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa na terça-feira à noite, a partir de Oliveira do Hospital, que aumentou ainda mais a pressão sobre o Governo nesta matéria.

Marcelo afirmou que era preciso "abrir um novo ciclo", na sequência dos incêndios de junho e de domingo passado, e que isso "inevitavelmente obrigará o Governo a ponderar o quê, quem, como e quando melhor serve esse ciclo".

O Presidente da República chegou mesmo a pedir a clarificação do apoio ao Governo no parlamento, avisou que usará todos os seus poderes contra a fragilidade do Estado que considerou existir face aos incêndios que mataram mais de 100 pessoas e defendeu que se justifica um pedido de desculpa.

Ao lado de António Costa desde 2005

Constança Urbano de Sousa, investigadora e professora de Direito da União Europeia e diretora do departamento de direito da Universidade Autónoma de Lisboa, foi escolhida por António Costa para ministra da Administração Interna. Nascida em 1967, em Coimbra, Constança Cunha e Sousa é especialista em segurança e justiça na União Europeia, imigração e direito de asilo.

Licenciou-se em direito na Universidade de Coimbra, tendo concluído o mestrado em direito comunitário na Universidade de Sarreland, na Alemanha. Em 2005 foi chamada por António Costa, então ministro de Estado e da Administração Interna, para o assessorar juridicamente nas questões em que é especialista.

Nas últimas eleições legislativas foi candidata pelo PS no círculo eleitoral do Porto. Ocupava o 15.º lugar da lista e o PS elegeu 14 deputados neste círculo.

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