Pouco depois do anúncio dos resultados provisórios, que atribuem 13,5% das intenções de voto ao AfD, foram organizadas manifestações espontâneas em frente à sede do partido em Colónia, onde se concentraram cerca de 400 pessoas, em Frankfurt, em Munique e em Berlim.

Na capital alemã, um impressionante cordão policial foi montado para conter a manifestação de menos de mil participantes, concentrados em frente ao salão alugado pelo AfD para a sua noite de eleição, situado em pleno centro de Berlim, segundo a agência de notícias francesa AFP.

Proferindo gritos de "toda a Berlim odeia os nazis", ou "os nazis" ou "o racismo não é uma alternativa", os manifestantes, bastante jovens, demonstravam a sua revolta. Várias cidades alemãs foram também cenário de protestos espontâneos anti-AfD.

"Voltam os fantasmas do passado"

A AfD avançou vários pontos no final da campanha, apesar de ter radicalizado o discurso e de ter pedido aos cidadãos que se sintam orgulhosos dos feitos dos soldados alemães durante a Segunda Guerra Mundial. Algo nunca visto num país cuja identidade desde o final da guerra foi construída com base no arrependimento e na rejeição do extremismo.

A comunidade judaica denunciou o programa "infame" do AfD, que quer pôr fim ao arrependimento alemão pelos crimes dos nazis. "Voltam os fantasmas do passado", alertou a revista semanal Der Spiegel. Durante a campanha, o partido chegou a dizer, entre outras coisas, que a Alemanha se tornou "refúgio de criminosos terroristas do mundo inteiro", além de denunciar a "traição" de Merkel por ter aberto as portas em 2015 a centenas de milhares de pessoas que pediram refúgio, na maioria muçulmanos.

Neste contexto, Merkel terá que dialogar com seus aliados bávaros da CSU e com a ala mais conservadora da CDU, que pediu reiteradamente à chanceler que escutasse seus militantes da ala mais radical, que a acusam de ser muito centralizadora. "Descuidámos a nossa ala direita e agora teremos que preencher o vazio com posições mais claras", declarou o chefe da CSU, Horst Seehofer.

O AfD "é competência da união [cristã-democrata] e da família conservadora em geral [...] abre-se um período muito difícil para a chanceler", explicou Lothar Probst, cientista político da Universidade de Bremen.

"Terremoto eleitoral"

A CDU da chanceler Angela Merkel venceu as eleições legislativas de hoje com 33,5% dos votos, seguida dos sociais-democratas do SPD e do partido Alternativa para a Alemanha, de extrema-direita, segundo uma sondagem divulgada pela televisão pública ZDF, após o encerramento das urnas, pelas 18:00 locais (17:00 em Lisboa).

A vitória de Merkel foi, todavia, ofuscada pelo histórico avanço da extrema direita do AfD, que conseguiu cerca de 13% dos votos, segundo as sondagens à boca da urna."Vamos mudar este país [...] Vamos expulsar a senhora Merkel. Vamos recuperar nosso país", afirmou Alexander Gauland, um dos líderes do AfD.

Os dois líderes da AfD, Alexander Gauland e Alice Weidel, abraçam-se no evento de celebração dos resultados eleitorais do partido

Será a primeira vez desde 1945 que um partido revisionista e contrário ao Islão, às elites, ao euro e à imigração entra na câmara dos deputados alemã. O AfD ficou à frente da esquerda radical de Die Linke (9%), dos liberais do FDP (10%) e dos Verdes (9%).Nas regiões da antiga Alemanha de Leste, os nacionalistas da AfD chegaram a impor-se como segunda força, com 22,8% dos votos, atrás da CDU (28,6%).

Angela Merkel e os conservadores viram-se enfraquecidos pelo avanço histórico da extrema direita e pela dificuldade para formar uma aliança de governo. "Terremoto eleitoral", resumiu o jornal Bild na sua página na internet, apontando que, com 32,9% dos votos apurados, a CDU-CSU registou o "seu pior resultado desde 1949" e que os social-democratas do SPD (20,8%) "obtiveram o seu pior resultado de todos os tempos", enquanto que os extremistas de direita do AfD (13%) se impuseram como "terceira força política" do país.

Merkel, no poder há 12 anos e três mandatos, admitiu que esperava um "melhor resultado", e advertiu que a entrada da extrema direita no parlamento impõe um "novo desafio". A chanceler terá que procurar pela quarta vez um ou vários parceiros para formar o seu próximo governo, já que os social-democratas anunciaram que não voltarão a governar com os conservadores. O grande perdedor das eleições foi Martin Schulz, líder do SPD, que lamentou um "dia difícil e amargo para a social-democracia".

Ainda não se sabe como será partilha de entre 600 e 700 lugares no parlamento alemão, devido à complexidade do sistema de votação alemão. Mas uma coisa é certa: a única maioria que Merkel pode esperar passa por uma aliança com os liberais do FDP e com os Verdes. O principal obstáculo desta opção está no facto de ambos os partidos defenderem posições opostas em diversos temas, como a imigração e o diesel.As negociações poderão durar até o final do ano, e Merkel não será nomeada chanceler até que se forme uma nova maioria. Além disso, Merkel descartou qualquer governo que se apoie em maiorias flutuantes.

[com Lusa e AFP]