Economista com perfil austero, o antigo vice-presidente do PSD e secretário-geral do partido sob a liderança de Marcelo Rebelo de Sousa avança aos 60 anos para o seu maior desafio.

A candidatura de Rui Rio à liderança do PSD já esteve pré-anunciada por várias vezes, que não concretizou para não interromper o seu mandato no Porto, bem como à Presidência da República, em 2016, hipótese que acabou por afastar devido ao “quadro parlamentar instável” que resultou das últimas legislativas e a “escassez de condições” que considerava para levar por diante uma reforma do regime.

Desde então, o antigo presidente da Câmara Municipal do Porto multiplicou-se em participações em conferências pelo país e, desde uma entrevista que deu em novembro ao Diário de Notícias, adivinhava-se a candidatura à liderança do partido, que vai ser hoje concretizada às 18:30 em Aveiro.

Nessa altura, dizia que seria candidato se o partido não encontrasse uma alternativa credível ao atual líder, Pedro Passos Coelho, que, na sequência das autárquicas de 1 de outubro, anunciou que não se recandidataria ao cargo.

Nascido no Porto a 06 de agosto de 1957, Rui Rio ganhou notoriedade e visibilidade nacional durante os três mandatos, entre 2001 e 2013, como presidente da autarquia portuense, mas o percurso político do militante do PSD já tinha começado bastante antes, na Juventude Social Democrata.

Foi vice-presidente da Comissão Política Nacional da JSD entre 1982 e 1984 e entre 1996 e 1997 foi secretário-geral do PSD, quando era presidente do partido o atual Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa.

Nesse período, o social-democrata travou algumas guerras internas devido ao processo de refiliação de militantes que levou a cabo, gerando muitos anticorpos no aparelho do partido – chegou a propor colocar um relógio de ponto na sede do partido para controlar as entradas dos funcionários.

Marcelo Rebelo de Sousa foi mantendo Rio no cargo, mas este acabaria por sair pelo seu próprio pé, depois das autárquicas de 1997, em divergência com o presidente do partido, numa relação que não voltou a ser próxima.

O ex-autarca do Porto foi vice-presidente do partido com três líderes: de 2002 a 2005, com Durão Barroso e Pedro Santana Lopes, e mais tarde, entre 2008 e 2010, com Manuela Ferreira Leite.

Estudou no Colégio Alemão e licenciou-se em Economia pela Universidade do Porto – tendo sido eleito pela primeira vez presidente da Associação de Estudantes da faculdade em 1981 –, Rio manteve sempre um percurso profissional como economista, tendo chegado à Assembleia da República em 1991, onde foi deputado durante 10 anos.

Adepto do Boavista e praticante de vários desportos na sua juventude, opôs-se enquanto deputado ao chamado ‘totonegócio’, que previa que parte das receitas do totobola fossem entregues aos clubes de futebol, e foi um rosto quase isolado na sua bancada a favor da interrupção voluntária da gravidez.

Com a chegada – na altura inesperada, já que nas sondagens era dado como derrotado face ao socialista Fernando Gomes – à presidência na Câmara do Porto em 2001, Rio iniciou 12 anos durante os quais foi fortemente criticado pela falta de apoio à Cultura, tendo dossiês como o Mercado do Bolhão, o Túnel de Ceuta, o Bairro do Aleixo e as corridas de carros na Boavista marcado os três mandatos, sempre em coligação com o CDS-PP.

O equilíbrio e rigor das contas da autarquia e a aposta na requalificação dos bairros do Porto foram grandes bandeiras de Rio à frente do segundo município do país.

Ao longo do seu percurso político, foram inúmeros os conflitos e divergências com o ex-presidente da Câmara de Gaia Luís Filipe Menezes, e apesar das pontes que partilham ambos os concelhos foram bem mais as desavenças do que os entendimentos entre os dois sociais-democratas. Aliás, sem apoiar expressamente Rui Moreira, Rio fez questão de dizer que não votaria no PSD nas autárquicas de 2013, quando Menezes se candidatou à sua sucessão no Porto.

Rio manteve também distância do presidente do Futebol Clube do Porto, Pinto da Costa, com o clube a festejar sempre os campeonatos em Gaia e não no Porto, como até aí era habitual.

No seu percurso profissional, Rio começou por trabalhar na indústria têxtil e, na década de 80, iniciou o seu percurso no setor bancário, no Banco Comercial Português. Depois de ter interrompido a atividade política, voltou à banca, assumindo um cargo não executivo no Comité de Investimentos do Millenium BCP e é atualmente consultor da empresa de recursos humanos Boyden.

Casado e com uma filha, Rio sempre teve uma vida pessoal recatada, conhecendo-se a educação rígida que teve e a morte do irmão quando tinha sete anos como marcas da sua infância.

Ao longo da vida foi praticante de diversas modalidades desportivas e inclusivamente foi federado em atletismo, tendo revelado à agência Lusa que admira na história mundial personalidades como Gandhi e Mandela. Agnóstico, tem como ‘hobbies’ as corridas de automóveis, a astronomia e a bateria, instrumento que tocava quando integrou uma banda na sua juventude.

Da boa relação com António Costa aos entendimentos de regime "ao centro"

A defesa de entendimentos de regime “ao centro”, fortes críticas ao sistema político, de justiça e à comunicação social têm marcado as intervenções políticas de Rui Rio, que considera que a regionalização pode dar “um abanão” no país.

Com o atual primeiro-ministro e secretário-geral do PS, António Costa, Rui Rio manteve um bom relacionamento quando ambos eram autarcas – convidavam-se um ao outro para assistir aos festejos de Santo António e de São João, em Lisboa e no Porto, respetivamente – e, numa conferência da TSF há três anos, foram mais longe nas convergências.

Em julho de 2014, Costa – então candidato à liderança do PS - e Rio defenderam ambos a necessidade de um Presidente da República “mais ativo e interventivo” e um entendimento de longo prazo entre os protagonistas políticos.

“A maioria absoluta [como defendeu António Costa] é o mais importante, mas pode não ser o garante fundamental para um acordo de regime ou a 10 anos. O importante é a capacidade dos protagonistas porem o interesse nacional acima de tudo e não o interesse partidário, assim pode-se conseguir um entendimento de regime", afirmou Rui Rio.

Mais recentemente, em fevereiro deste ano, numa conferência sobre “Ética e Política” em Barcelos (Braga), o agora candidato à liderança do PSD defendeu que a melhor solução governativa seria um "entendimento ao centro", em vez de um “entendimento ao extremo”, embora salientando a legitimidade da atual ‘geringonça’ para governar.

Numa conferência em maio de 2016, em Lisboa, o ex-presidente da Câmara do Porto Rui Rio alertou mesmo que, sem um entendimento entre os dois principais partidos para reformar o regime, Portugal caminha para uma ditadura "sem rosto", onde o poder político enfraquecido sucumbe aos interesses de diferentes ‘ditadores’.

No passado, quando eram ambos presidentes de Câmara, Costa e Rio defenderam que as direções dos seus partidos devem trabalhar em conjunto pela revisão da lei eleitoral autárquica - reforçando a capacidade de os presidentes formarem governo e os poderes das assembleias municipais - e uniram-se na transferência de mais competências para as respetivas autarquias.

Nas suas intervenções recentes, Rio tem defendido que a atribuição de mais competências aos municípios só deve fazer-se depois de discutir se o país quer ou não avançar na regionalização. Sobre essa matéria, admite ter evoluído desde o referendo de 1998 no qual votou “não”, e atualmente defende que o país deve fazer “um debate sério”, considerando que uma regionalização “bem feita” pode contribuir para diminuir a despesa pública.

Tribunal Constitucional em Coimbra ou IAPMEI em Leiria ou Braga

O antigo autarca aponta até exemplos práticos, como a transferência do Tribunal Constitucional para Coimbra ou do Instituto de Apoio a Pequenas e Médias Empresas (IAPMEI) para Leiria ou Braga.

Se considera essa uma das reformas centrais a fazer no sistema político, Rio defende ainda alterações na forma de eleição de deputados, de câmaras, dos círculos eleitorais, do regimento da Assembleia da República ou da forma de funcionar das comissões de inquérito parlamentares, considerando que um regime com 40 anos “está esgotado”.

Recentemente, disse ser “por norma” contra a escolha de líderes partidários em primárias (abertas a simpatizantes e não só a militantes), mas admitiu que esta forma de eleição pode ser interessante como "medida extraordinária" de abertura à sociedade.

A justiça é outro dos temas recorrentes das suas intervenções, já tendo dito que o sistema judicial atual está pior do que antes do 25 de Abril na defesa dos direitos dos cidadãos e defendendo uma total separação de poderes para com o poder político e uma maior transparência.

A violação do segredo de justiça pela comunicação social é outra das críticas repetidas de Rui Rio, que já considerou que os media têm “uma quota de responsabilidade enorme” na degradação do regime democrático em Portugal.

Apontando o “brutal endividamento” como um dos principais problemas do país, o antigo autarca chegou a questionar se, sem agravar o peso fiscal sobre os contribuintes, “não seria salutar” a criação de um imposto consignado ao pagamento dos juros da dívida pública, acompanhado de uma redução do IVA, do IRS e do IRC.

O antigo vice-presidente do PSD apontou a banca como o “segundo culpado” da crise económica do país, logo depois do poder político, e criticou o Banco de Portugal, considerando que o regulador “não esteve à altura das circunstâncias”.

Rui Rio manifestou dúvidas, quando foi ouvido no parlamento no âmbito da Comissão da Transparência, sobre a criminalização do enriquecimento ilícito e, em matéria e Segurança Social, lamentou que sucessivos governos tenham dados às pessoas “direitos que não eram sustentáveis”.

Habitualmente mais à frente do que as posições oficiais do partido em matéria de costumes, Rio assinou em fevereiro de 2016 um manifesto pela despenalização e regulamentação da morte assistida. O PSD, sob a liderança de Pedro Passos Coelho, não definiu ainda uma posição sobre o tema, mas estava certa a liberdade de voto dos deputados em futuras iniciativas legislativas que venham a ser votadas no parlamento.