Em Junho de 2008, vinha de algum tempo fora do país e, do aeroporto, fomos jantar a um sítio chamado Galerias de Paris, na rua com o mesmo nome. A baixa, abandonada, voltava à vida pela mão de quem dela gostava, de quem viu nela algo que mais ninguém tinha visto. Eram empresários “da noite”, da restauração ou pessoas que nunca tinham sido “empresárias” e que se juntaram porque queriam fazer algo que gostavam, num sítio diferente.

Imaginar a baixa abandonada, há menos de 10 anos, parece impossível nos dias de hoje. Coisas como o “Se esta rua fosse minha”, um festival de rua, alavancado no Plano B, primeiro não entendido pela Câmara Municipal do Porto — que mais tarde quis fazer parte da festa —, os novos bares, com o Rádio à cabeça, os restaurantes e as lojas vieram antes do boom low cost e do turismo mais massificado.

O que digo é que as ideias têm de ter vontade e de ter alma. Aquilo que produzimos e construímos em anos, e que agora o Mundo vem ver, não foi fruto de geração espontânea, nem se fez em três dias e duas demão de pintura com um nome cool na porta.

E não me venham com a história das tascas velhas e sujas a quem ninguém ia. Os cachorrinhos do Gazela e o Pernil do Guedes ou do Antunes, sempre tiveram freguesia e no Porto come-se bem — sempre se comeu! —, com arroz de feijão, com batatinha ou com o molho à parte.

Somos bons, somos intrinsecamente bons de talento e de coração. Perco-me nos inúmeros startup camps, hubs, labs, coisas de innovation, factory e afins que aqui vejo. Eu que tenho um pé na tecnologia e trabalho com startups, PME's e empresas grandes, fico a pensar se não era melhor fazer as coisas a sério e chamar-lhes nomes depois.

Se para lançar é preciso ter nomes ingleses, e a nossa história também os tem, é só olhar para os neons nos telhados de Gaia. Também é fácil perceber que não era preciso tanto englishtechocoiso: a maior e mais produtiva incubadora nacional chama-se UPTEC e fica no km2 com mais “inteligência do país”, o pólo da Universidade do Porto na Asprela ou como nós diríamos “no S. João!”.

O Porto é uma história longa, uma amizade a sério. Achamos bem que se recuperem casas, achamos bem que haja mais turismo e movida nocturna, e pregarias, hamburguerias, cremarias, eoquetuquerias e tudo, mas fazer só hostels e só restauranterias é parolo. E isso, lamento, mas não somos.

Temos o Douro e o Atlântico, temos o sol no granito, o pôr do sol nas Virtudes ou no Homem do Leme — com um fininho, claro! —, temos o melhor clube do mundo, temos talento, temos graça e temos o que decidirmos inventar. ‘Bambora!

Nuno Vargas é designer, jornalista e uma coisa chamada Digital Strategist. Trabalha com meios novos e antigos, entre os EUA, a Nigéria ou Argentina, apesar de chamar casa ao Porto. Se não estiver num avião podem encontrá-lo a optimizar os dados sobre migrantes da IOM em Genebra, a relançar a operação do TN.com.ar, em Buenos Aires ou no estádio do Dragão. Ah, sim, e também aqui @nunovargas.

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