Esta praça grande de Paris, habituada a acolher manifestações, está a ser palco para uma nova ágora ou assembleia popular permanente, onde todos tomam a palavra e se fazem ouvir ao lado do altar laico da república francesa, a estátua em bronze da Marianne, que mostra um ramo de oliveira na mão direita e que apoia a mão esquerda na carta dos direitos do homem. Naquelas intervenções, eles descarregam as muitas desilusões, fúrias, combates e alguns dos sonhos. São sobretudo jovens mas também alguns não tão jovens. Algumas bandeiras vermelhas desfraldadas confirmam a cor do protesto, que no entanto incomoda quase todos os partidos. Jogam com as palavras gréve (greve, claro) e rêve (sonho) e proclamam, em atmosfera que evoca o Maio de 68, rêve générale (sonho geral) e préavis de rêve (pré-aviso de sonho).

O movimento nasceu no dia 31 de março, com uma manifestação contra leis do trabalho anunciadas pelo debilitado governo socialista de Hollande e Valls. Desde então, discutem tudo todas as noites. Instalaram uma espécie da aldeia dentro da praça, com enfermaria, gabinete de assistência jurídica, cozinha e, atentos aos novos códigos da comunicação, até instalaram a RadioDebout, que transmite tudo online. Denunciam "as violências praticadas pelo Estado": apontam como principal a falta de emprego. Também se levantam contra o neoliberalismo, contra a indignidade para com os refugiados, contra a xenofobia e vários outros males. Objetivo mais proclamado por estes contestatários, em grande parte estudantes universitários e liceais: reinventar o modo de fazer política e desenhar projectos de esperança a partir do espaço público. São uma frente anti-resignação com o sonho ou a ilusão de poder mudar o mundo. Possivelmente, alguns destes noctâmbulos pouco terão de idealistas, mas a maioria move-se pelo sonho.

A sociedade de entretenimento coletivo em que estamos até costuma explorar estes protestos mas, desta vez, no turbilhão das notícias, não lhes está a dar grande atenção. Talvez seja um erro. Estes indignados de Paris refletem o grande mal-estar social num país que vale 20% da economia europeia. Eles representam uma convergência de combates: pelo direito ao trabalho, à educação, à habitação, à saúde, contra a corrupção. Seguem um calendário que inventaram e que prolonga o mês em que tudo começou: estão esta terça-feira no dia 43 de março. Até quando vão continuar levantados todas as noites? Eles são uma vanguarda que pode desaparecer de uma noite para a outra, mas a chama parece longe de se apagar. Têm o mérito de exprimir uma necessidade de mudança.

TAMBÉM A TER EM CONTA

A Áustria começou a levantar um muro preventivo para barrar a entrada de refugiados. Acontece dois dias depois de, uma vez mais, a morte ter cortado o percurso a refugiados: uma mulher e quatro crianças naufragaram quando tentavam atravessar o mar Egeu na esperança de chegar à Grécia. Com a intenção de sacudir a indiferença do mundo para o destino trágico dos que tentam fugir da barbárie, o papa Francisco vai no sábado ao encontro dos refugiados na ilha de Lesbos, na Grécia. Ele já avisou que esta tragédia parece "minar as bases do espírito humanista que a Europa tanto gosta de apregoar". Esta reportagem ajuda-nos a saber algo mais sobre quem são estas pessoas que fogem da guerra.

A grande reportagem literária de Gay Talese está de volta, agora com o Motel do Voyeur. É a história de um homem que comprou um hotel no Colorado e remodelou-o de modo a poder espiar, a partir de um falso tecto, as práticas sexuais dos clientes.

Uma primeira página escolhida hoje no SAPO JORNAIS: esta, com o estado das coisas na política brasileira.

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