"O Festival da Canção mudou antes de o Salvador Sobral chegar. A vitória do Salvador é fruto de uma primeira etapa de um processo de remodelação do Festival da Canção", salienta Nuno Galopim, que considera que esta iniciativa "voltou a aproximar-se de um espaço de atenção dos portugueses que não conhecia há muito tempo”.
“É preciso ter em conta que o Festival da Canção nunca desapareceu e houve profissionais da RTP que todos os anos trabalharam para que ele existisse, assim como houve músicos que todos os anos criaram canções para que a competição nunca desaparecesse”, destaca.
E desta forma, na opinião do consultor, houve uma “reaproximação do universo do Festival ao universo musical do país ao longo do ano”. Algo que aconteceu na edição passada e que este ano prossegue. O objetivo é que a noite da grande final do Festival “seja uma entre as 365 e não um caso aparte”. Que esteja, portanto, “integrada numa narrativa de um ano musical”. A Final é daqueles que “fazem os discos [que ouvimos], os concertos que temos, que tocam nos festivais que vemos e que passam na rádio."
A edição deste ano é então uma "continuação da mesma ideia", explica. "Basicamente, o que fizemos foi replicar o modelo de seleção dos compositores, acrescentando qualquer coisa de novo". A abertura à Sociedade Civil e a possibilidade de o vencedor regressar ou convidar alguém são as duas grandes novidades este ano. Aos 22 selecionados pela estação pública juntam-se assim Peter Serrado e Rita Dias, que responderam a um concurso aberto a submissões, promovido pela Antena 1, e Daniela Onis, selecionada pelo júri do programa “Master Class” da mesma estação de rádio. O cantor que deu voz a "Amar Pelos Dois" teve, igualmente, direito à escolha de um compositor para integrar a lista: Janeiro.
O número de participantes, que aumenta de 16 para 26, é outra das novidades. "É um ano especial. Pela primeira vez Portugal ganha o Festival da Eurovisão, vamos organizar a edição deste ano em Lisboa, e o Festival da Canção assinala um pouco o que é o arranque do ano eurovisivo português com uma celebração alargada da música portuguesa", explica o jornalista.
Mas desengane-se quem resume a iniciativa à escolha da participação portuguesa na Eurovisão. "O Festival da Canção tem como uma das consequências para o vencedor a presença dessa mesma canção no Festival da Eurovisão, mas não se esgota aí. (...) São 26 canções que estão a concurso, as outras 25 não desaparecem", remata Nuno Galopim.
Celebrar a lusofonia mantendo a identidade
Este é também um Festival de vários sotaques, onde a língua portuguesa volta a destacar-se. Apesar de se manter a livre escolha de idioma, uma das novidades do ano anterior, é interessante ver que a esmagadora maioria dos compositores se mantém ligado à língua portuguesa.
Celebrar através do Festival da Canção o universo da lusofonia “foi questão nossa, no ponto de partida da seleção dos compositores”, explica o jornalista. Assim foi aberta “a participação de músicos que têm berços noutros espaços do globo, mas que muitos deles até têm residência e carreira feita entre nós”.
Pela primeira vez na sua história, a RTP disponibilizou um aperitivo daquilo que vamos poder ouvir nas semifinais. Um excerto de 45 segundos das 13 músicas da primeira semifinal foi disponibilizado para escuta nos canais da estação pública. Nuno Galopim já ouviu os 26 temas e sobre eles partilha, com satisfação, que “ninguém seguiu uma receita e todos foram fiéis à sua identidade”. Com isto quer dizer que o que “vamos assistir é à apresentação de 26 canções que são extremamente fiéis às marcas dos seus autores e às características dos seus intérpretes e personalidades dos letristas. Isso é o que é mais interessante num festival que quer celebrar a canção".
Um Festival com orgulho na sua história
José Cid ou Anabela, este ano. Jorge Fernando ou Lena de Água, na edição passada. O Festival revitaliza-se num processo de continuidade e não de rutura. “Estamos a construir novos episódios sobre uma história que só nos deixa muito orgulhosos de existir como existiu até aqui, e quer continuar a existir", diz Nuno Galopim.
O Festival presta ainda, nesta edição, homenagem a três nomes maiores da história da música portuguesa e do próprio concurso: Simone de Oliveira, Carlos Paião e as Doce. Estas homenagens têm palco nas semifinais e na grande final, nos momentos que separam o desfile das canções da votação.
Nas duas semifinais, a organização convidou João Pedro Coimbra e Nuno Figueiredo, que na edição passada estavam como compositores, para que "pegassem no universo musical e nas canções de Carlos Paião, as trabalhassem e escolhessem uma série de vozes para as apresentar. A voz de “Pó de Arroz”, um dos grandes autores da história da música popular portuguesa, teve um papel muito importante na história do Festival da Canção. O músico teve na edição de 1980, um ano antes de "Playback", o seu momento de revelação pública televisiva.
Na grande final, será a vez de Simone de Oliveira, que este ano cumpre 80 "Primaveras". A homenagem à voz de "Desfolhada" está a ser coordenada por Nuno Feist, que também era um dos compositores que concorria na edição de 2017. Já a homenagem às Doce será coordenada por Moullinex e também decorrerá a 4 de março. "As vozes das várias homenagens serão dadas a conhecer bem em cima do acontecimento", conta Nuno Galopim.
E Salvador Sobral, voltará ao Festival para colocar o país a "Amar pelos Dois"? Nuno Galopim deixa no ar um "Quem sabe...".
Semifinais em Lisboa, grande final em Guimarães
Na primeira semifinal, marcada para este domingo à noite pelas 21h00 no estúdio da RTP, competem 13 canções. A segunda semifinal está marcada para 25 de fevereiro, também em Lisboa.
Jorge Gabriel e José Carlos Malato serão a dupla de apresentadores da primeira semifinal; Sónia Araújo e Tânia Ribas de Oliveira da segunda.
De cada semifinal sairão sete finalistas escolhidos por um júri que este ano volta a ser presidido por Júlio Isidro. A acompanhar o apresentador estarão os cantores Ana Bacalhau, Carlão, Luísa Sobral e Sara Tavares, a radialista Ana Markl, o jornalista Mário Lopes e os compositores Tozé Brito e António Avelar Pinho.
Filomena Cautela e Pedro Fernandes serão os responsáveis pela apresentação da grande Final, o espetáculo que reunirá as 14 canções finalistas e que acontece a 4 de março no Multiusos de Guimarães.
A “descentralização” do Festival não é uma novidade. Por outras vezes o palco do concurso deixou a capital: Porto (1983), Funchal (1987), Évora (1989), Santa Maria da Feira (2001), por exemplo. Esta opção "tem a ver com uma outra estratégia, a mais longo prazo, que esta mesma equipa definiu para o que é essa revitalização do Festival", conta. Para além de querer "representar as várias gerações e os vários gostos", o Festival quer também "ter uma relação com vários espaços do país".
Nuno Galopim deixa o convite, inspirado no título do álbum de George Michael de 1990, “Listen Without Prejudice”. A edição deste ano do Festival da Canção é para ver e para “ouvir sem preconceito”.
E se tiver curiosidade por conhecer o palco das emoções, a RTP faz uma visita guiada aos estúdios das semifinais.
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