“Um espetáculo sobre o avesso, sobre o que não se costuma ver, a intimidade do ato criativo, o que está por detrás do que se apresenta. O caminho do ator é contar histórias. Esta história é sobre quem conta histórias”, descreve à Lusa o encenador Miguel Seabra.

Em “Devíamos ter parado”, que se estreia na quarta-feira, em Lisboa, “a palavra não é a principal forma de comunicação cénica”: há música ao vivo, da responsabilidade de Rui Rebelo, e muito movimento, numa coreografia teatral.

A “implantação cénica” também é diferente de tudo o que o grupo do Teatro Meridional fez até hoje, já que vai ser “em arena”, com o público dos quatro lados da sala, e tudo a passar-se no meio, explica Miguel Seabra.

“Essa proximidade é como se o público estivesse a espreitar pelo buraco da fechadura”, e o que se revela perante o seu olhar furtivo é tudo aquilo que está invisível no palco, a intimidade, as dúvidas, as ansiedades dos atores, a sua vontade de cumprir, a urgência, que sentem em palco, para contar uma história.

É por isso que o próprio título do espetáculo é uma “metáfora sobre a inevitabilidade de prosseguir”.

“Quem é ator, vive assim toda a vida. É um caminho de um só sentido e cada espetáculo é como se fosse o primeiro e o único”, considera o encenador.

“Devíamos ter parado” complementa a pergunta “o que estamos nós (ainda) aqui a fazer?”, que serve de mote para o espetáculo e para os 25 anos do Meridional, fazendo também uma ligação à pergunta que deu título ao primeiro espetáculo da companhia: “Ki Fatxiamu Noi Kui?” (Que fazemos nós aqui?).

O que fazem é uma “reflexão” sobre tudo o que fizeram até agora: “Neste momento, estamos numa estação de serviço, parámos para tomar um café e para olhar para o mapa e certificar que este é o caminho que queremos seguir, o de contar histórias”.

Essa certeza, porém, não chega nunca, porque “o caminho faz-se caminhando”, procurando novas linguagens e novos percursos, através de “uma estrada para a utopia, sabendo que esse horizonte se afasta na mesma medida, sempre que o procuramos atingir”, explica Miguel Seabra.

A única certeza é a de que a equipa está “estruturada e pronta para enfrentar novos desafios, com energia, determinação e inquietação”.

Essa “inquietação, que se mantém questionadora e dinâmica, é um aliado involuntário, que precisa de ser alimentado, com renovação, coragem e capacidade de arriscar”, acrescenta.

“Devíamos ter parado” tem assistência artística de Natália Luiza, interpretação de Margarida Gonçalves, Miguel Damião, Mónica Garnel, Paulo Pinto, Rosinda Costa, Rui Rebelo e Telmo Mendes, e cenários e figurinos de Marta Carreiras.

No âmbito dos 25 anos, o Teatro Meridional vai também apresentar um vídeo sobre o ‘making of’ da construção deste espetáculo, da autoria de João Pinto, cineasta e videasta, que tem acompanhado os ensaios.

As celebrações contam ainda com três dias de debate, em dezembro, sobre o percurso desta companhia – com convidados e temas próprios -, com a continuação do trabalho de itinerância, com uma ação de formação de Tiago Torres da Silva sobre escrita para música e com uma alteração do logótipo do Teatro Meridional.