Finlândia vai aderir à NATO. E agora?
Edição por Tomás Albino Gomes
O presidente e a primeira-ministra da Finlândia disseram esta quinta-feira que são favoráveis à adesão do país à Aliança Atlântica, sendo que a decisão deve ser anunciada oficialmente no próximo domingo em Helsínquia.
"Ser membro da NATO vai reforçar a segurança da Finlândia. Como membro da NATO, a Finlândia vai reforçar a aliança no seu conjunto. A Finlândia deve ser candidata à adesão à NATO sem demora", afirmaram o chefe de Estado, Sauli Ninistro, e a primeira-ministra, Sanna Marin, num comunicado conjunto que sublinhava que esta adesão não será “contra ninguém”.
No entanto, a decisão não está a ser vista de forma tão passiva pela Rússia, país que invadiu e começou uma guerra na Ucrânia em fevereiro e que já tinha ameaçado que a decisão pode vir a ter "efeitos políticas e militares" para a Finlândia e para a Suécia (que pode em breve tomar igualmente a mesma decisão) em caso de adesão à NATO.
Já hoje, a Rússia considerou que a adesão da Finlândia à aliança constitui uma ameaça à sua segurança e põe em causa a estabilidade na região da Eurásia.
“Sem dúvida” é uma ameaça, disse o porta-voz do Kremlin (Presidência) Dmitri Peskov, ao responder a uma pergunta sobre a possível adesão da Finlândia à NATO, segundo as agências espanhola EFE e francesa AFP.
Poucas horas depois das declarações de Peskov, o Ministério dos Negócios Estrangeiros russo emitiu um comunicado: “A adesão da Finlândia à NATO causará sérios danos às relações bilaterais Rússia-Finlândia (…). A Rússia será forçada a tomar medidas de retaliação, tanto técnico-militares como outras, a fim de pôr termo às ameaças à sua segurança nacional que surjam a este respeito”.
“Responderemos de acordo com a situação”, disse o ministério liderado por Serguei Lavrov.
Tudo isto no mesmo dia em que Dmitri Medvedev, vice-presidente do Conselho de Segurança russo, acusou os países da Aliança Atlântica de estarem a aumentar o risco de uma guerra total com o seu apoio militar à Ucrânia na guerra com a Rússia.
“Os países da NATO a fornecer armas à Ucrânia, a treinar as suas tropas para utilizar equipamento ocidental, a enviar mercenários e os exercícios por países da Aliança perto das nossas fronteiras aumentam a probabilidade de um conflito direto e aberto entre a NATO e a Rússia, em vez da ‘guerra por procuração’ que estão a travar”, escreveu Medvedev na rede social Telegram.
No texto, citado pela agências russa TASS e espanhola EFE, Medvedev avisa que “um tal conflito tem sempre o risco de se transformar numa verdadeira guerra nuclear”.
“Este será um cenário catastrófico para todos”, disse o ex-Presidente (2008-2012) e ex-primeiro-ministro da Rússia (2012-2020).
Medvedev, um aliado do líder russo, Vladimir Putin, acusou ainda o Ocidente de cinismo e de colocar no “topo da agenda” internacional a “tese de que a Rússia assusta o mundo com um conflito nuclear”.
Por isso, referiu, o Ocidente não deve enganar-se a si próprio ou os outros, mas “pensar nas possíveis consequências dos seus atos”.
Medvedev reafirmou a acusação ao Ocidente de travar uma guerra por procuração contra a Rússia na Ucrânia, como já tinha feito quando criticou os Estados Unidos de estarem a fornecer ajuda militar “sem precedentes” a Kiev.
Porque é que a Finlândia não aderiu antes à NATO?
A declaração de adesão à NATO ocorre um dia depois da visita do primeiro-ministro britânico, Boris Johnson, à Finlândia e à Suécia, em que foram ratificados os acordos de cooperação militar com o Reino Unido, um acordo prevê ajuda de Londres à Finlândia e à Suécia em caso de ataque, sendo que já em 2017, a Suécia e a Finlândia aproximaram-se do Comando Expedicionário Britânico, uma força que foi concebida para flexibilizar respostas militares rápidas.
O acordo conjunto de 2017, que usa os padrões e a doutrina da NATO, já previa a atuação em parceria com a Aliança Atlântica, Nações Unidas e coligações multinacionais. A força conjunta, operacional desde 2018, realizou, inclusive, uma série de exercícios em cooperação com a NATO.
Desde a invasão da Ucrânia pela Rússia, no passado dia 24 de fevereiro, a Finlândia e a Suécia começaram a ponderar o abandono da neutralidade história e aderir formalmente à NATO.
A Finlândia, que partilha 1.340 quilómetros de fronteira terrestre com a Rússia, como membro da NATO constitui a maior alteração na política de defesa e de segurança do país nórdico desde a Segunda Guerra Mundial (1939-1945), quando travou duas guerras contra a União Soviética.
Durante o período da Guerra Fria, a Finlândia ficou longe da NATO para evitar provocar a União Soviética, optando por permanecer como país neutral, mantendo boas relações com Moscovo e também com Washington.
Um processo de adesão "tranquilo" e rápido
O secretário-geral da NATO, o norueguês Jens Stoltenberg, saudou hoje a vontade demonstrada pela Finlândia em integrar a Aliança Atlântica, garantindo um processo de adesão "tranquilo" e rápido.
"Trata-se de uma decisão soberana da Finlândia (...) Se a Finlândia decidir candidatar-se vai ser calorosamente acolhida no seio da NATO sendo que o processo de adesão vai decorrer de forma tranquila e rápida", declarou Stoltenberg.
"A Finlândia é um dos parceiros mais próximos da NATO; é uma democracia adulta, membro da União Europeia que contribui de forma importante à segurança euro-atlântica", disse ainda o secretário-geral.
"Estou de acordo com o Presidente [Sauli] Niinistö e com a primeira-ministra [Sanna] Marin quando afirmam que a adesão à NATO reforça a segurança da Aliança Atlântica, assim como a da Finlândia", acrescentou.
"A adesão da Finlândia demonstra que a 'porta' da NATO está aberta e que Finlândia decide o seu próprio futuro", disse o secretário-geral da organização.
A integração da Finlândia na NATO "vai contribuir muito para a segurança europeia e vai ser um forte sinal de dissuasão numa altura em que a Rússia está em guerra contra a Ucrânia", disse o presidente do Conselho Europeu, o belga Charles Michel.
Caso se verifique um pedido formal de adesão vai ter de ser cumprido um período provisório entre a entrega da candidatura até à ratificação por parte dos parlamentos dos 30 Estados membros da organização, incluindo Portugal.