“Há momentos de crise que são caóticos, que não sabemos onde estamos, e todos passamos por esses momentos. E uma vida que nunca sentiu o caos é uma vida destilada. Água destilada é uma água sem crises. Não tem sabor a nada, não serve para nada, a não ser para guardar no roupeiro e fechar a porta”.

A frase foi dita pelo Papa Francisco esta manhã, em Cascais, na visita que fez ao projeto Scholas Occurrentes, que fundou há mais de 20 anos em Buenos Aires e que hoje se encontra espalhado pelo mundo.

Escolhemos esta como podíamos escolher outras.

- “Não devemos ter medo de nos sentir inquietos, de pensar que tudo o que possamos fazer não basta”

- “Às vezes na vida há que sujar as mãos para não sujar o coração”

- “Nunca te canses de perguntar. Fazer perguntas é bom”

- “Substituam os medos pelos sonhos”

Ditas sempre a olhar nos olhos os mais jovens mas sabendo que servia a qualquer ser humano que as quisesse ouvir.

Essa é a marca mais forte que Francisco deixa por onde passa e Portugal não é exceção. Este é um Papa com um dom natural da palavra e do gesto e com uma vocação inata  no amor ao próximo -  no fundo, aquilo que está na base da fé, nomeadamente a católica. Mas este é também um Papa com um sentido prático como poucos e focado na pegada concreta que deixa ao abordar temas que envolvem a vontade dos homens.

E foi por isso que, na Universidade Católica ou nas Scholas Occurrentes, falou de conhecimento, de igualdade, de gratidão, de ambiente e da recusa da futilidade como propósito de vida.

- “Se quem recebeu um ensino superior não se esforça por restituir aquilo de que beneficiou, significa que não compreendeu profundamente o que lhe foi oferecido”

- Não esqueçais que temos necessidade de uma ecologia integral, de escutar o sofrimento do planeta juntamente com o dos pobres; necessidade de colocar o drama da desertificação em paralelo com o dos refugiados; o tema das migrações juntamente com a queda da natalidade

- “Não queremos polarizações, mas visões de conjunto”

- “O teu nome é conhecido, aparece nas redes sociais, é processado por algoritmos que lhe associam gostos e preferências. Mas tudo isso não interpela a tua singularidade, mas a tua utilidade para estudos de mercado”

Lisboa vive por estes dias uma espécie de caos que não é de todo água destilada. Há ruas cheias de gente, transportes que demoram, uma babel de cânticos e de palavras de ordem. Mas, usando as palavras do Papa na intervenção que realizou na Universidade Católica, isso é também uma forma de os jovens coreografarem a sua vida nestes dias da Jornada Mundial de Juventude.

Além da festa, durante a festa e depois da festa, estes dias são uma espécie de terapia de grande escala àquilo que nos faz humanos, o que nos alegra e nos entristece, o que nos preocupa e o que nos deve mobilizar. Pela voz de um Papa com 86 anos de palavra serena, humor afiado e uma alegria contagiante

Não há cinismo que lhe resista.