CAPÍTULO DEZASSEIS 

O cheiro do café fresco desperta-me do meu sonho sedutor. 

Alessia.
Bata de
nylon azul.
Calças de pijama do Sponge Bob.
Cuecas cor-de-rosa.

Ao abrir os olhos, encontro-a ao lado da cama, vestida com seda creme, com a sua beleza habitual — exceto pelo seu sorriso incerto.

– Bom dia – diz ela, enquanto põe uma chávena na mesinha de cabeceira.

– Bom dia, meu amor. Obrigado pelo café.

– Já passa das nove e meia.

– Oh, meu Deus, dormi até tarde. – Esfrego a cara e sento-me, e ela senta-se na cama ao meu lado. – Como te sentes? – Bem. Estava com dor de cabeça.

– Estás melhor agora?

Ela assente. 

– Desculpa. Não queria ter bebido tanto. Espero que não te tenha envergonhado. 

– Querida, não precisas de pedir desculpa. Estiveste bem. – Estou horrorizado por ela sentir a necessidade de expressar remorsos. – Os meus amigos adoraram-te. Como é que podiam não gostar? 

– Foi bom conhecê-los. 

– Espero que tenhas gostado deles. Tenho de confessar que eu costumava ser assim na maioria das noites, bêbado numa discoteca, algures. Conhecer-te provavelmente salvou-me o fígado. 

Os olhos dela suavizam-se. 

– Gostei dos teus amigos. Eles eram divertidos. E gostei do gin. Talvez demasiado. – Ela olha para as suas mãos no colo. 

– Gostaste? Ótimo. Talvez amigos e gin com moderação da próxima vez. – Passo os dedos por baixo do queixo dela, virando-lhe o rosto para o meu. – Disseste algumas coisas ontem à noite. Tenho andado muito preocupado com os meus próprios problemas, e não te perguntei se está tudo bem ou se há alguma coisa que eu possa fazer para te facilitar a adaptação a esta nova vida. 

– Só regressámos da nossa lua-de-mel há alguns dias.

– Eu sei. Mas mesmo assim.

"É Desta Que Leio Isto"

"É Desta Que Leio Isto" é um grupo de leitura promovido pela MadreMedia e por Elisa Baltazar, co-fundadora do projeto de escrita "O Primeiro Capítulo”.

Lançado em maio de 2020, foi criado com o propósito de incentivar à leitura e à discussão à volta dos livros. Já folheámos as páginas de livros de autores como Luís Sepúlveda, George Orwell, José Saramago, Dulce Maria Cardoso, Harper Lee, Valter Hugo Mãe, Gabriel García Marquez, Vladimir Nabokov, Afonso Reis Cabral, Philip Roth, Chimamanda Ngozi Adichie, Jonathan Franzen, Isabel Lucas, Milan Kundera, Joan Didion, Eça de Queiroz e Patricia Highsmith, sempre com a presença de convidados especiais que nos ajudam à discussão, interpretação, troca de ideias e, sobretudo, proporcionam boas conversas.

Ao longo da história do nosso clube, já tivemos o privilégio de contar nomes como Teolinda Gersão, Afonso Cruz, Tânia Ganho, Filipe Melo e Juan Cavia, Kalaf Epalanga, Maria do Rosário Pedreira, Inês Maria Meneses, José Luís Peixoto, João Tordo e Álvaro Laborinho Lúcio, que falaram sobre as suas ou outras obras.

Para além dos encontros mensais para discussão de obras literárias, o clube conta com um grupo no Facebook, com mais de 2500 membros, que visa fomentar a troca de ideias à volta dos livros, dos seus autores e da escrita e histórias que nos apaixonam.

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Ela engole em seco e prepara-se como se estivesse a reunir alguma força interior, e eu não sei o que é que ela vai dizer. Do nada, a minha apreensão bate asas rápidas e furiosas nas minhas entranhas. 

– Maxim, quero ver se consigo encontrar uma das raparigas que foi traficada comigo. 

O meu alívio é instantâneo. 

– Oh. Está bem – respondo cautelosamente. – Mas como raio é que se começa a procurar alguém que pode estar em qualquer lugar? 

– Falei com a Ticia Cavanagh.

Merda. A apreensão regressa com toda a força.

– E?

Ela sorri, e eu acho que ela está a ler-me como o livro aberto que eu sou.

– Não falámos sobre ti. Embora talvez devêssemos... hum, comparar notas? 

Ela está a provocar-me! 

– Alessia! – Não sei se a estou a avisar para se afastar ou a felicitá-la pela sua coragem. 

– Ela deu-me o número de um investigador privado... – diz Alessia, apressadamente – que pode ser capaz de ajudar. Preciso de a encontrar. 

Olho fixamente para ela e a minha ansiedade regressa. 

Isto parece-me uma tarefa impossível. 

– A Bleriana só tem dezassete anos – diz ela, em voz baixa. 

– Oh, meu Deus. Isso é horrível. – Fecho os olhos, sem querer imaginar o horror que Alessia e a sua jovem amiga passaram. – Ela fugiu quando tu fugiste? 

– Acho que sim. Eu corri pela minha vida. Não tive tempo para verificar…

– As palavras arrastam-se como se isto fosse uma falha. 

Não! 

Puxo-a para o meu colo e envolvo-a com os meus braços. 

– Eu não quis insinuar... meu Deus, Alessia. Estou tão feliz por teres escapado. Só Deus sabe o que teria acontecido... – As minhas palavras esmorecem enquanto passam cenários horríveis pela minha cabeça. – Olha, eu acho que não é uma boa ideia envolveres-te novamente nesse mundo horrível. Mesmo à distância. Nunca me perdoaria se algo te acontecesse por causa da tua pesquisa. 

Ela retesa-se nos meus braços. 

– Não te vou perder outra vez. – Aperto-a com mais força e enterro o meu nariz no cabelo dela. – Por favor. 

– Mas... 

– Não. Alessia. – Inspiro o seu aroma. – A resposta é não. É um risco demasiado grande. Vou falar com o Tom. A empresa dele também faz trabalho de investigação privada. Não sei se eles localizam pessoas desaparecidas, mas talvez ele possa ajudar. 

Livro: "A Senhora"

Autor: E. L. James

Editora: Lua de Papel

Data de Lançamento: 18 de julho de 2023

Preço: € 19,90

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Ela afasta-se, os seus olhos escuros, muito escuros e luminosos, e eu não sei se ela me vai contrariar nisto. 

– Obrigada – diz ela e envolve os seus braços à volta do meu pescoço. – Se o Tom a conseguir encontrar... – A sua respiração é quente junto à minha garganta, mas a sua voz embarga-se. – Eu... eu tive sorte. E sinto-me culpada. Consegui escapar. 

O meu sangue gela. 

– Oh, Deus. Não. Nunca te sintas assim. Jesus, Alessia. – Se aqueles bandidos a tivessem apanhado. Fecho os olhos outra vez, imaginando todos os círculos do inferno... e Alessia no coração infernal do pior deles. – Nunca te sintas assim, querida. Nunca mais. Não estou a pedir. Estou a dizer-te. Aqueles homens eram monstros. – Seguro a cabeça dela com as minhas mãos, e ela vira os olhos para os meus. 

– OK – murmura ela, e após um instante os seus dedos torcem-me o cabelo e ela leva os seus lábios aos meus. 

– O meu café está frio. – Esfrego o meu nariz no de Alessia, deitado ao seu lado, fatigado. 

Ela ri-se.

– Posso fazer-te mais. E o pequeno-almoço. 

– Não. Não vás. Eu faço-o. E para ti também. – Beijo-lhe a bochecha. 

– Não! – Os seus dedos apertam-me o cabelo, arranhando-me o couro cabeludo. – Não vás. – Ela pressiona os seus fantásticos seios no meu peito e põe uma perna em redor da minha anca. 

Oh, bolas... outra vez! 

Estou debaixo do duche e lavo a minha ressaca, sentindo-me mais tranquilo. 

É o sexo. 

Duas vezes numa manhã... Posso concordar com isso. 

A Alessia é voraz. Quem diria? Sorrio para a água que cai em cascata sobre mim. 

Ela parece muito mais feliz hoje, e a minha mente volta-se para o seu estado emocional da noite passada. Acho que ela está a sofrer por estar fechada, pela falta de amigos e pela sua culpa de sobrevivente. Talvez sejam também lembranças da minha vida antiga. 

A Alessia e eu ainda nos estamos a conhecer. Mas ela é normalmente tão contida e estoica, por isso a sua explosão foi uma surpresa. 

Ainda bem que falámos. Vou ligar ao Tom hoje para começar uma busca, provavelmente fútil, mas para o bem da Alessia e da amiga dela, podemos tentar. 

Desligo o chuveiro, saio a cambalear e inspeciono o meu queixo, pronto para fazer a barba. 

Não. Hoje não. 

Deixo a barba por fazer — a minha mulher gosta — e volto para o quarto com uma toalha enrolada à volta da cintura. A cama já está feita. 

Podes tirar a rapariga da Albânia, mas... Sorrio.

Estou contente por ela ter saído da Albânia.

Comigo.

Mas não tenho a certeza do que pensar da missão dela. Será sensata?

Imagino que será infrutífera. Como é que se pode encontrar um imigrante traficado e sem documentos? 

Podemos tentar a uma distância segura, porque não há hipótese de eu deixar que alguém a leve de volta para aquele submundo hediondo. 

Preciso de a manter segura.