![“A Senhora”. Os homens mudam?](/assets/img/blank.png)
CAPÍTULO DEZASSEIS
O cheiro do café fresco desperta-me do meu sonho sedutor.
Alessia.
Bata de nylon azul.
Calças de pijama do Sponge Bob.
Cuecas cor-de-rosa.
Ao abrir os olhos, encontro-a ao lado da cama, vestida com seda creme, com a sua beleza habitual — exceto pelo seu sorriso incerto.
– Bom dia – diz ela, enquanto põe uma chávena na mesinha de cabeceira.
– Bom dia, meu amor. Obrigado pelo café.
– Já passa das nove e meia.
– Oh, meu Deus, dormi até tarde. – Esfrego a cara e sento-me, e ela senta-se na cama ao meu lado. – Como te sentes? – Bem. Estava com dor de cabeça.
– Estás melhor agora?
Ela assente.
– Desculpa. Não queria ter bebido tanto. Espero que não te tenha envergonhado.
– Querida, não precisas de pedir desculpa. Estiveste bem. – Estou horrorizado por ela sentir a necessidade de expressar remorsos. – Os meus amigos adoraram-te. Como é que podiam não gostar?
– Foi bom conhecê-los.
– Espero que tenhas gostado deles. Tenho de confessar que eu costumava ser assim na maioria das noites, bêbado numa discoteca, algures. Conhecer-te provavelmente salvou-me o fígado.
Os olhos dela suavizam-se.
– Gostei dos teus amigos. Eles eram divertidos. E gostei do gin. Talvez demasiado. – Ela olha para as suas mãos no colo.
– Gostaste? Ótimo. Talvez amigos e gin com moderação da próxima vez. – Passo os dedos por baixo do queixo dela, virando-lhe o rosto para o meu. – Disseste algumas coisas ontem à noite. Tenho andado muito preocupado com os meus próprios problemas, e não te perguntei se está tudo bem ou se há alguma coisa que eu possa fazer para te facilitar a adaptação a esta nova vida.
– Só regressámos da nossa lua-de-mel há alguns dias.
– Eu sei. Mas mesmo assim.
Ela engole em seco e prepara-se como se estivesse a reunir alguma força interior, e eu não sei o que é que ela vai dizer. Do nada, a minha apreensão bate asas rápidas e furiosas nas minhas entranhas.
– Maxim, quero ver se consigo encontrar uma das raparigas que foi traficada comigo.
O meu alívio é instantâneo.
– Oh. Está bem – respondo cautelosamente. – Mas como raio é que se começa a procurar alguém que pode estar em qualquer lugar?
– Falei com a Ticia Cavanagh.
Merda. A apreensão regressa com toda a força.
– E?
Ela sorri, e eu acho que ela está a ler-me como o livro aberto que eu sou.
– Não falámos sobre ti. Embora talvez devêssemos... hum, comparar notas?
Ela está a provocar-me!
– Alessia! – Não sei se a estou a avisar para se afastar ou a felicitá-la pela sua coragem.
– Ela deu-me o número de um investigador privado... – diz Alessia, apressadamente – que pode ser capaz de ajudar. Preciso de a encontrar.
Olho fixamente para ela e a minha ansiedade regressa.
Isto parece-me uma tarefa impossível.
– A Bleriana só tem dezassete anos – diz ela, em voz baixa.
– Oh, meu Deus. Isso é horrível. – Fecho os olhos, sem querer imaginar o horror que Alessia e a sua jovem amiga passaram. – Ela fugiu quando tu fugiste?
– Acho que sim. Eu corri pela minha vida. Não tive tempo para verificar…
– As palavras arrastam-se como se isto fosse uma falha.
Não!
Puxo-a para o meu colo e envolvo-a com os meus braços.
– Eu não quis insinuar... meu Deus, Alessia. Estou tão feliz por teres escapado. Só Deus sabe o que teria acontecido... – As minhas palavras esmorecem enquanto passam cenários horríveis pela minha cabeça. – Olha, eu acho que não é uma boa ideia envolveres-te novamente nesse mundo horrível. Mesmo à distância. Nunca me perdoaria se algo te acontecesse por causa da tua pesquisa.
Ela retesa-se nos meus braços.
– Não te vou perder outra vez. – Aperto-a com mais força e enterro o meu nariz no cabelo dela. – Por favor.
– Mas...
– Não. Alessia. – Inspiro o seu aroma. – A resposta é não. É um risco demasiado grande. Vou falar com o Tom. A empresa dele também faz trabalho de investigação privada. Não sei se eles localizam pessoas desaparecidas, mas talvez ele possa ajudar.
Ela afasta-se, os seus olhos escuros, muito escuros e luminosos, e eu não sei se ela me vai contrariar nisto.
– Obrigada – diz ela e envolve os seus braços à volta do meu pescoço. – Se o Tom a conseguir encontrar... – A sua respiração é quente junto à minha garganta, mas a sua voz embarga-se. – Eu... eu tive sorte. E sinto-me culpada. Consegui escapar.
O meu sangue gela.
– Oh, Deus. Não. Nunca te sintas assim. Jesus, Alessia. – Se aqueles bandidos a tivessem apanhado. Fecho os olhos outra vez, imaginando todos os círculos do inferno... e Alessia no coração infernal do pior deles. – Nunca te sintas assim, querida. Nunca mais. Não estou a pedir. Estou a dizer-te. Aqueles homens eram monstros. – Seguro a cabeça dela com as minhas mãos, e ela vira os olhos para os meus.
– OK – murmura ela, e após um instante os seus dedos torcem-me o cabelo e ela leva os seus lábios aos meus.
– O meu café está frio. – Esfrego o meu nariz no de Alessia, deitado ao seu lado, fatigado.
Ela ri-se.
– Posso fazer-te mais. E o pequeno-almoço.
– Não. Não vás. Eu faço-o. E para ti também. – Beijo-lhe a bochecha.
– Não! – Os seus dedos apertam-me o cabelo, arranhando-me o couro cabeludo. – Não vás. – Ela pressiona os seus fantásticos seios no meu peito e põe uma perna em redor da minha anca.
Oh, bolas... outra vez!
Estou debaixo do duche e lavo a minha ressaca, sentindo-me mais tranquilo.
É o sexo.
Duas vezes numa manhã... Posso concordar com isso.
A Alessia é voraz. Quem diria? Sorrio para a água que cai em cascata sobre mim.
Ela parece muito mais feliz hoje, e a minha mente volta-se para o seu estado emocional da noite passada. Acho que ela está a sofrer por estar fechada, pela falta de amigos e pela sua culpa de sobrevivente. Talvez sejam também lembranças da minha vida antiga.
A Alessia e eu ainda nos estamos a conhecer. Mas ela é normalmente tão contida e estoica, por isso a sua explosão foi uma surpresa.
Ainda bem que falámos. Vou ligar ao Tom hoje para começar uma busca, provavelmente fútil, mas para o bem da Alessia e da amiga dela, podemos tentar.
Desligo o chuveiro, saio a cambalear e inspeciono o meu queixo, pronto para fazer a barba.
Não. Hoje não.
Deixo a barba por fazer — a minha mulher gosta — e volto para o quarto com uma toalha enrolada à volta da cintura. A cama já está feita.
Podes tirar a rapariga da Albânia, mas... Sorrio.
Estou contente por ela ter saído da Albânia.
Comigo.
Mas não tenho a certeza do que pensar da missão dela. Será sensata?
Imagino que será infrutífera. Como é que se pode encontrar um imigrante traficado e sem documentos?
Podemos tentar a uma distância segura, porque não há hipótese de eu deixar que alguém a leve de volta para aquele submundo hediondo.
Preciso de a manter segura.
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