“Devido aos tratados existentes entre os dois países, e aos laços históricos, o tribunal português aceitou a decisão angolana que se baseou em provas falsas. E foi aplicada automaticamente em Portugal. Isabel [dos Santos] e a lei portuguesa não têm capacidade de mudar [a ação], por isso [a empresária] vai contestá-la no Tribunal Europeu”, disse hoje à Agência Lusa Dan Morrison, que representa a empresária angolana.
O Ministério Público requereu o arresto de contas bancárias da empresária Isabel dos Santos, “no âmbito de pedido de cooperação judiciária internacional das autoridades angolanas", confirmou em 11 de fevereiro à Lusa a PGR portuguesa.
A decisão foi tomada depois de o Tribunal Provincial de Luanda ter decretado, em dezembro de 2019, o arresto preventivo de contas bancárias pessoais de Isabel dos Santos, do marido, o congolês Sindika Dokolo, e do português Mário da Silva, além de nove empresas nas quais a empresária detém participações sociais, por alegados negócios privados que terão lesado o Estado angolano.
Nesse processo, o Estado angolano, representado pelo Ministério Público, fez uma extensa fundamentação em que, em traços gerais, sustenta que Isabel dos Santos e o seu marido utilizaram fundos, nomeadamente da Sonangol, para fazerem negócios.
Além do arresto de contas bancárias e participações sociais em Angola, foram também arrestadas participações relativas a várias empresas em Portugal.
O advogado britânico, sócio da sociedade Grosvenor Law, baseada em Londres, garantiu que está disposto a interpor ações jurídicas “em todas as jurisdições relevantes” para defender a cliente e descongelar os bens.
Uma das intervenções que Morrison fez foi escrever esta semana à Interpol para que a organização internacional investigue a alegada corrupção de dois agentes em Angola referida num documento do processo da Procuradoria-Geral da República (PGR) contra a empresária.
No documento é referido que Isabel dos Santos estaria em contacto com um empresário dos Emirados Árabes Unidos para vender a participação na empresa de telecomunicações Unitel, o qual terá solicitado “serviços remunerados da Interpol Angola” para investigarem a situação da empresa.
O advogado questiona a veracidade do documento, que foi incluído no processo da PGR que resultou no arresto dos bens da filha do ex-Presidente angolano José Eduardo dos Santos, argumentando que, ao contrário do que é sugerido, Isabel dos Santos estava mais interessada em comprar do que em vender ações da Unitel.
"O que estou a tentar questionar junto da Interpol são preocupações graves de que basicamente o nome deles possa ter sido usado para justificar as alegações angolanas”, afirmou hoje à agência Lusa Dan Morrison, sócio da sociedade Grosvenor Law, baseada em Londres.
A suspeita levantada pela equipa jurídica da empresária sobre este documento, que não tem indicação da fonte nem está datado, junta-se a dúvidas sobre mais documentos, nomeadamente a inclusão de uma cópia de um passaporte falsificado assinado pelo lutador de kung-fu Bruce Lee.
"Já vimos a questão do passaporte publicada na imprensa e como Angola tem usado documentos fictícios, documentos falsos. E queremos garantir que pessoas cujos nomes estão a ser usados em Angola para suportar estas queixas estão cientes destas questões muito graves”, vincou o advogado.
A “carta jurídica formal" continha com uma série de perguntas diretas e Morrison espera receber uma resposta não só da Interpol, mas também das autoridades angolanas, que alega ter procedido de forma indevida por ter ordenado o arresto de bens e só disponibilizado os documentos de prova cinco meses mais tarde.
Isabel dos Santos considera estar a ser alvo de um “ataque com motivação política” e que, por isso, não tem confiança de que vai ser sujeita a um julgamento justo ou que vai ter garantida a segurança pessoal se voltar a Angola para se defender das acusações.
Segundo a PGR de Angola, correm contra Isabel dos Santos vários processos de natureza cível e criminal, em que o Estado reivindica valores superiores a cinco mil milhões de dólares (4,6 mil milhões de euros).
Em janeiro, o Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação revelou também mais de 715 mil ficheiros, sob o nome de 'Luanda Leaks', que detalham alegados esquemas financeiros de Isabel dos Santos e do marido, que lhes terão permitido retirar dinheiro do erário público angolano através de paraísos fiscais.
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