Em Portugal, a ex-eurodeputada Ana Gomes, que esta semana foi ilibada do processo que lhe tinha sido interposto por Isabel dos Santos, pediu já a demissão de todos os portugueses implicados neste Luanda Leaks, nomeadamente o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, e o ex-ministro das Finanças Teixeira dos Santos, agora administrador do Eurobic.

Além de Carlos Costa e de Teixeira dos Santos, Ana Gomes defende que é preciso agir também em relação ao que designa como “tugas cúmplices ativos”, aqueles que “deviam ter agido e não agiram” e os “cúmplices passivos” em “sucessivos governos, no Banco de Portugal, na CMVM [Comissão do Mercado de Valores Mobiliários] e até na PGR/ DCIAP [Procuradoria-Geral da República/Investigação e Ação Penal]”.

O Consórcio Internacional de Jornalismo de Investigação (International Consortium of Investigative Journalists ICIJ) revelou hoje mais de 715 mil ficheiros, sob o nome de “Luanda Leaks”, que detalham esquemas financeiros de Isabel dos Santos e do marido, Sindika Dokolo, que estarão na origem da fortuna da família. O ICIJ, que integra vários órgãos de comunicação social, entre os quais o Expresso e a SIC, analisou, ao longo de vários meses, 356 gigabytes de dados relativos aos negócios de Isabel dos Santos entre 1980 e 2018, que ajudam a reconstruir o caminho que levou a filha do ex-presidente angolano a tornar-se a mulher mais rica de África.

Durante a investigação foram identificadas mais de 400 empresas (e respetivas subsidiárias) a que Isabel dos Santos esteve ligada nas últimas três décadas, incluindo 155 sociedades portuguesas e 99 angolanas.
As informações recolhidas detalham, por exemplo, um esquema de ocultação montado por Isabel dos Santos na petrolífera estatal angolana Sonangol, que lhe permitiu desviar mais de 100 milhões de dólares (90 milhões de euros) para o Dubai.

Revelam ainda que, em menos de 24 horas, a conta da Sonangol no Eurobic Lisboa, banco de que Isabel dos Santos é a principal acionista, foi esvaziada e ficou com saldo negativo no dia seguinte à demissão da empresária.

Os dados divulgados indicam quatro portugueses alegadamente envolvidos diretamente nos esquemas financeiros: Paula Oliveira (administradora não-executiva da NOS e diretora de uma empresa offshore no Dubai), Mário Leite da Silva (CEO da Fidequity, empresa com sede em Lisboa detida por Isabel dos Santos e o seu marido), o advogado Jorge Brito Pereira e Sarju Raikundalia (administrador financeiro da Sonangol).

Recorde-se que esta semana o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa-Oeste, no Juízo Local Cível de Sintra, decidiu favoravelmente a Ana Gomes no processo que lhe foi movido por Isabel dos Santos que queria que tweets da ex-eurodeputada fossem apagados. Isabel dos Santos tinha iniciado o processo por considerar que a ex-eurodeputada socialista atacou o seu nome e reputação, quando a acusou de estar a usar Portugal para "lavar" dinheiro. Por isso, pedia que os tweets fossem apagados.

Em causa estava uma publicação da ex-eurodeputada no dia 14 de outubro, reagindo a uma entrevista da empresária angolana à agência Lusa: "Isabel dos Santos endivida-se muito porque, ao liquidar as dívidas, ‘lava’ que se farta! E (…) o Banco de Portugal não quer ver…".

Numa entrevista, nesse mesmo dia, Isabel dos Santos tinha dito à Lusa que trabalha com vários bancos e que não foi favorecida por ser filha do ex-Presidente de Angola José Eduardo dos Santos.

“Tenho muitas dívidas, tenho muito financiamento por pagar, as taxas de juros são elevadas, nem sempre é fácil também ter essa sustentabilidade do negócio, para conseguir enfrentar toda a parte financeira dos negócios, mas também boas equipas e trabalhamos para isso”, afirmou a empresária, na entrevista feita em Cabo Verde.

Após o primeiro ‘post’, Ana Gomes acusou a empresária de usar o EuroBic (banco de que é acionista) para legalizar o seu dinheiro: “Que jeito dá à (…) acionista Isabel dos Santos o @banco_eurobic! Está na rede swift e na Zona Euro”.

O Tribunal considerou que tanto Isabel dos Santos como Ana Gomes "são pessoas influentes da sociedade portuguesa" sendo "indubitavelmente" Isabel dos Santos pessoa sujeita ao escrutínio público "por ter investimentos avultados em diversas empresas portuguesas com importância crucial no setor financeiro, designadamente na banca".

Por outro lado, sustentou o Tribunal, que sendo Ana Gomes "pessoa informada e com competências na área de branqueamento de capitais e corrupção, deve-lhe ser reconhecido o direito de expor as situações que considera suscetíveis de lesarem o interesse público". "Face às circunstâncias do caso em concreto, o direito à liberdade de expressão e de informação deverá prevalecer sobre os direitos de personalidade (reputação e bom nome), indeferindo-se por isso a providência requerida", concluiu o Tribunal.

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