“É o único órgão que existe com o ‘maestro articulado’ na parte frontal para reger as pessoas no sentido de subirem ou descerem o tom, conforme os cânticos. Foi mandado construir pelo abade na altura, em 1767, e o construtor foi António Solha”, contou à agência Lusa o pároco de São João de Tarouca, José Ramos.
O pároco não escondia “a felicidade de finalmente o órgão ser recuperado, uma ambição de muitos anos” que carrega desde que assumiu as funções de pároco, há 27 anos, “porque há muita gente que infelizmente já morreu e que dizia muita vez que não queria partir se o ouvir tocar”.
Esta recuperação vai ser possível agora, porque, “depois de anos e anos a tentar, nomeadamente junto da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional do Norte, [as candidaturas] vinham sempre reprovadas”.
Então virou-se para o mecenato e, “depois de receber a primeira resposta positiva, a esperança cresceu”.
“Com o apoio de três fundações, a Câmara Municipal de Tarouca, em 44 mil euros, e a Direção Regional de Cultura do Norte, em cerca de 46 mil, penso ter o necessário para a recuperação do órgão”, regozijou-se o pároco, que contou que “a maior parte do investimento é dos privados”.
Para José Ramos, o seu “desejo é ainda ouvir o órgão” e, agora, espera “poder inaugurar em 20 de agosto do próximo ano, Dia de São Bernardo, padroeiro da Ordem de Císter”, sob a qual foi construído o Mosteiro de São João de Tarouca. “É o primeiro mosteiro masculino cisterciense edificado em território português”, disse à Lusa.
“Ninguém sabe ao certo quando é que [o órgão] tocou pela última vez, mas pensamos que, com a expulsão das ordens religiosas, em 1834 ou 1836, o órgão [tenha sido] saqueado. E daí a [necessidade de] intervenção muito profunda”, contou à Lusa.
O pároco adiantou que “faltam muitos instrumentos, palhetas e tubos de som, ou seja, [o órgão] tem a caixa exterior, mas a máquina não existe”. Assim, “vai ser feita uma caixa idêntica à primitiva, mas totalmente nova, e a caixa exterior será restaurada, tanto os dourados como os mármores”.
O órgão de tubos da igreja do antigo convento de São João de Tarouca é proveniente da oficina de Francisco António Solha, datado de 1767, altura em que foi construído por ordem do frei Félix de Castelo Branco.
Como elemento distintivo, possui uma escultura em talha policromada, na qual a tradição identifica uma representação de Cristo, de acordo com o Salmo 29 (“o Senhor sentou-se sobre as águas do dilúvio, como rei eterno”). Esta figura de vulto, montada na balaustrada do órgão, virada para a assembleia de culto, é articulada, mexendo a boca e os braços, passível de acompanhar a interpretação musical, o que sustenta a designação de “maestro”.
O arranque desta recuperação acontece depois da assinatura, feita hoje, de um protocolo com a autarquia, mas também com a Direção Regional de Cultura do Norte, que também assinou outros dois, esta quarta-feira: com a Associação do Vale do Varosa, para a manutenção do horto monástico, ao redor do Mosteiro, e um outro em Ferreirim, na região de Lamego.
“Termino um ciclo de mais de sete anos hoje com esta curiosidade de conseguir congregar três protocolos destinados a três formas de valorização do património. Um sobre a intervenção direta num objeto, numa peça de arte, o órgão, outro para a intervenção na paisagem natural do Mosteiro e, um terceiro, para um agente cultural que vai dinamizar o património” da região, disse o diretor-geral de Cultura do Norte, António Ponte, no seu último dia de funções, uma vez que, na quinta-feira, assume a direção do Museu Nacional Soares dos Reis, no Porto.
Este responsável destacou os monumentos do Vale do Varosa que se situam numa zona de confluência entre o Norte, junto ao Rio Douro, e a zona Centro, “que acabam por ser um ponto de atração”, destas duas regiões.
O horto monástico terá “plantas medicinais e ervas aromáticas” e, no futuro, “vinhas de castas que os mosteiros cultivavam e sabugueiros”, explicou o presidente da Associação do Vale do Varosa, José Damião Melo. “A ideia é manter as culturas originais e todas elas biológicas e envolver toda a comunidade nisso” nos mais de quatro hectares de área”.
A envolvência da comunidade foi destacada por António Ponte que defendeu ter “um valor acrescido, porque responsabiliza a comunidade pelo valor do seu património e isso é muito importante” até porque, disse, “a preservação não é só uma responsabilidade das entidades públicas”.
“Em Ferreirim assinámos um protocolo com os municípios de Tarouca e de Lamego, para criar um agente de intermediação cultural, com uma participação de 15 mil euros, porque não chega restaurar, é preciso dinamizar pelo lado da utilização de diversas manifestações e diferentes públicos”, defendeu António Ponte.
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