Pouco se fala, o distanciamento é ordem e a solidão cresce. As visitas são curtas (30 minutos) e limitadas a uma pessoa. A pandemia assim o obriga. Até a televisão e a internet, ferramentas indispensáveis na maioria dos quotidianos, são coisas que não fazem parte do dia-a-dia por aqui. E o "por aqui" significa pela unidade de Medicina 2.1 do Hospital Santo António dos Capuchos, em Lisboa.
O internamento é preenchido quase exclusivamente por idosos com saúde debilitada e com múltiplas patologias. E há um médico que acredita que uma boa dose da receita para melhorar a saúde dos doentes reside na distribuição de jornais e revistas. A reportagem é do Expresso.
Não se pense, no entanto, que a escolha do material para leitura acontece ao acaso. Tal qual a prescrição de medicamentos, a seleção de matérias depende das necessidades. Há doentes a quem se destinam as palavras cruzadas, outros a política, outros as histórias com mais imagens — e por aí fora. Desporto, lifestyle, etc.
A história é dos doentes, mas o protagonista acaba por ser Miguel Macedo. Aos 24 anos, está cumprir a formação geral — patamar entre o fim do curso de Medicina e o internato da especialidade. A ideia de começar a dar jornais aos doentes vem dos tempos de Erasmus, mais concretamente de um hospital de Itália, onde um paciente acabou por confessar que sentia falta de duas coisas: de um café e do jornal. Como não podia dar café ao doente — a norma do hospital era dar chá —, ofereceu o segundo. A reação foi de felicidade. Agora, tenta replicar em Lisboa a felicidade vista em Milão.
Um exemplo do sucesso desta prática, descrita na reportagem do semanário, é o caso de Deolinda. Aos 76 anos, tem saudades dos seus gatos (são mais de 20). Quando chega a sua vez de ser auscultada, numa das rondas, o médico pede-lhe que encontre um gato na revista e questiona-a se já comeu. A doente não só atenta ao pedido como se deixa auscultar e responde que já comeu "duas vezes" — na verdade, há uma semana que come melhor, desde que começou a receber a revista.
"Os jornais e as revistas não melhoram a pressão sanguínea, a saturação de oxigénio ou os níveis de açúcar, mas tornam os doentes mais colaborantes em intervenções menos prazerosas e mais ativos. Além disso, aumentam a adesão à terapêutica e melhoram a relação com a equipa clínica e com a família, e até o sono", descreve o médico que quer ser ginecologista-obstetra, mas que vai levar esta lição consigo para o resto da sua formação.
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