Portugal tem a maior Zona Económica Exclusiva da Europa e direitos de exploração e gestão de outro tanto. São mais de 300 milhões de hectares, o equivalente à Índia. Mas, afinal, de que nos serve tanto mar?

Manuel Pinto de Abreu, licenciado em Ciências Militares Navais e Oceanologia, lembra o estudo do investigador americano Bramley J. Murton, que aponta para o valor astronómico dos oceanos. O mar português pode valer 10% disso, mais de 10 biliões de euros, ainda assim um valor elevadíssimo.

A verdade, diz o antigo secretário de Estado do Mar, é que "vale o que conseguirmos retirar do potencial que existe". E, por agora, o recreio, desporto e turismo representa mais de 40% daquilo que é o contributo do mar, seguido das pescas, com 25%. "Mas não encontramos as áreas emergentes, como a biotecnologia, sem esquecer a área da mineração profunda, ou das energias renováveis", revela.

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É preciso trilhar um caminho para que isto aconteça. Como fez a Noruega, por exemplo, um país da dimensão de Portugal, embora menos populoso. Isto, mesmo sem ter em consideração o petróleo e o gás. "O país conseguiu retirar muito valor do mar porque houve um empenhamento grande e continuado na engenharia oceânica, mas também na exploração dos recursos vivos, como a aquacultura", diz Manuel Pinto de Abreu.

Por outro lado, "quando dizemos que uma atividade pode prejudicar os oceanos, podemos estar a banir operações que podemos vir a lamentar não terem sido implementadas", considera. A guerra na Ucrânia leva-nos a refletir sobre esta questão e o ponto de equilíbrio entre o bem e o mal.

Olhos que não veem, coração que não sente. A Europa, para se dizer limpa, deslocalizou muitas atividades de exploração. Hoje tem um dilema: apostar em suplantar as suas necessidades ou submeter-se à soberania de terceiros.

Nesta matéria, Manuel Pinto de Abreu "preferia estar a explorar esses recursos aqui à porta, sem custos ambientais, mesmo os de transporte, de acordo com normas que são as nossas, as mais evoluídas, sem causar prejuízos para o ambiente. Debaixo da vista é que estas atividades estariam bem, porque as poderíamos controlar".

No entanto, "apesar de não explorarmos esses recursos, continuamos a usar essas matérias-primas, mas não sabemos exatamente em que condições são exploradas - ou sabemos que as condições não são as mais adequadas. E estamos já a ver consequências de determinadas ações", recorda.

De resto, a União Europeia não tem tido uma aposta clara no mar profundo, porque geograficamente a generalidade dos Estados não tem mar profundo, com exceção de Portugal, Espanha, Irlanda e França. "Integrar na União Europeia uma visão marítima não tem sido fácil", concorda o ex-governante.

"Devíamos procurar impor na União Europeia um reconhecimento da realidade marítima. Estes países já deram um primeiro passo, por iniciativa portuguesa, com a criação da estratégia da UE para o Oceano Atlântico. Que agora parece estar parada, mas que reflete a vontade da Europa de olhar para o mar", acredita.

O investimento é grande e precisamos de estabelecer parcerias. No entanto, a área de mar que Portugal tem por trás não tem compensação proporcional em termos de financiamento da União Europeia. "E hoje estamos pior", garante Pinto de Abreu.

Reflexo disso é que o PRR (Plano de Recuperação e Resiliência) tem previstos para o mar apenas 240 milhões de euros.