Por acórdão de 9 de outubro, a que a Lusa hoje teve acesso, o TRP acrescenta que está igualmente indiciado que o autarca "invertia completamente os princípios da contratação pública, indicando àquela empresária que apresentasse as propostas que entendesse, garantindo-lhe a aprovação das mesmas”.
“A concatenação da prova permite referir que se indicia fortemente que o arguido Miguel [Costa] Gomes, titular de cargo político, terá beneficiado a arguida Manuela Couto e as suas empresas na celebração dos contratos com a Câmara de Barcelos, em troca de apoio político, quer daquela Manuela, quer do próprio Joaquim Couto [marido da empresária e ex-presidente da Câmara de Santo Tirso]", sublinha o acórdão.
Aponta, designadamente, apoio para uma eventual candidatura de Costa Gomes à presidência da Federação de Braga do Partido Socialista”.
O TRP diz que as empresas de assessoria e imagem do grupo detido por Manuela Couto contratavam com a Câmara de Barcelos por ajuste direto.
Diz ainda que quando eram excedidos os limites de contratação pública por parte de uma empresa, era “escolhida” outra empresa do grupo.
“O arguido Miguel Costa Gomes, contrariamente às funções que lhe estão incumbidas, enquanto presidente da Câmara de Barcelos, de zelar pelos interesses patrimoniais públicos e de garantir a livre concorrência entre empresas, garante de antemão a adjudicação de todas as propostas que a arguida Manuela [Couto] lhe apresentava, sem apurar primeiramente das efetivas necessidades do município ou proceder à consulta de mercado de outras entidades que eventualmente apresentassem proposta economicamente mais vantajosa”, acrescenta o acórdão.
Este acórdão do TRP refere-se ao recurso que Costa Gomes interpôs para contestar a medida de coação de prisão domiciliária que lhe tinha sido aplicada pelo Tribunal de Instrução Criminal do Porto, no âmbito da Operação Teia.
Miguel Costa Gomes estava em prisão domiciliária desde 3 de junho, indiciado dos crimes de corrupção passiva e de prevaricação.
Na quarta-feira, a Relação deu provimento ao recurso e determinou a restituição de Costa Gomes à liberdade, impondo-lhe a prestação de uma caução de 20 mil euros.
A Relação manteve a proibição de Costa Gomes contactar com os funcionários do município e com trabalhadores das empresas de Manuela Couto.
No acórdão, a Relação lembra que o Tribunal de Instrução Criminal aplicou prisão domiciliária para acautelar os perigos de perturbação da investigação, de continuação da atividade criminosa e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas.
Para a Relação, “a aplicação da obrigação de permanência na habitação não se justifica para acautelar os indicados perigos, dado que, confinado à sua residência, o arguido mantém acesso aos mais variados meios de comunicação à distância, eletrónico ou telefone, podendo inclusivamente receber e contactar quem entender em sua casa, com exceção das pessoas abrangidas pela proibição de contactos que lhe foi aplicada”.
A Relação sublinha que Costa Gomes podia mesmo receber os restantes membros do executivo.
Para o TRP, os perigos de perturbação da investigação, de continuação da atividade criminosa e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas são “eficazmente evitados” com a aplicação de medidas de coação não privativas da liberdade.
Em declarações à Lusa, na quinta-feira, o advogado do autarca de Barcelos disse que o processo, por ordem da Relação do Porto, vai sair das mãos do TIC do Porto, passando para o Tribunal Central de Investigação Criminal (TCIC).
“O TIC do Porto é incompetente territorialmente para julgar crimes praticados em comarcas diferentes (Braga e Porto). O TCIC vai apreciar todos os atos de inquérito ordenados pelo TIC do Porto e verificar a sua validade, com exceção do primeiro interrogatório judicial de arguido detido”, disse Nuno Cerejeira Namora.
O advogado referiu ainda que “este acórdão vem destruir, e quase deixar em pó, as promoções do Departamento de Investigação e Ação Penal do Porto e do Tribunal de Instrução Criminal (TIC) do Porto”.
Na operação Teia, e além de Costa Gomes, são ainda arguidos o entretanto demissionário presidente da Câmara de Santo Tirso, Joaquim Couto, e a mulher, a empresária Manuela Couto.
O outro arguido é o ex-presidente do Instituto Português de Oncologia (IPO) do Porto Laranja Pontes, que, entretanto, se reformou.
Manuela Couto também esteve em prisão domiciliária, mas a pulseira eletrónica foi-lhe igualmente retirada na quarta-feira.
O processo está relacionado com alegados favorecimentos às empresas de Manuela Couto por parte do município de Barcelos e do IPO/Porto, a troco de favores políticos conseguidos por Joaquim Couto.
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