Segundo a agência Ecclesia, o Colégio Cardinalício tem neste momento 221 membros (119 eleitores, 102 com mais de 80 anos).

Neste número estão incluídos cinco portugueses — este sábado passam a ser seis —, dois deles com mais de 80 anos (ou seja, não podem eleger o próximo Papa).

Cardeais eleitores

  • D. Manuel Clemente

Natural de Torres Vedras, D. Manuel Clemente, 75 anos, é doutorado em Teologia Histórica, foi bispo do Porto e depois patriarca de Lisboa (agora emérito). Em 2009, conquistou o Prémio Pessoa.

D. Manuel Clemente “é um homem que interpreta a Igreja e a sociedade portuguesa numa perspetiva histórica”, afirma o padre Paulo Terroso, diretor de Comunicação da Arquidiocese de Braga e membro da Comissão de Comunicação do Sínodo à Lusa.

“É uma personalidade reconhecida pela Igreja em Portugal e pela sociedade portuguesa pelas suas intervenções assertivas, capacidade de diálogo e tolerância”, afirmou o sacerdote, realçando que o agora patriarca emérito é, também, “um homem de oração”.

  • D. António Marto

Foi em junho de 2018 que António Marto, à data bispo da Diocese de Leiria-Fátima, se tornou conselheiro do Papa.

Membro do Dicastério para a Causa dos Santos, D. António Marto, natural de Chaves, tem 76 anos. Foi aluno do Papa Bento XVI (1927-2022), que acolheu em 2010 no Santuário de Fátima, onde também recebeu Francisco, em 2017.

Fez o doutoramento em Teologia em Roma, foi bispo auxiliar de Braga e passou por Viseu antes de entrar na Diocese de Leiria-Fátima, em junho de 2006, onde agora é bispo emérito.

Em D. António Marto, o padre Paulo Terroso reconheceu “um teólogo ao bom estilo dos padres da Igreja”, capaz de “tornar acessível a todos os conteúdos mais complexos da fé”, além de um “homem humana e espiritualmente muito sensível”.

  • D. José Tolentino Mendonça

Em outubro de 2019, foi realizado outro consistório público para a criação de novos cardeais, tendo sido nomeado D. José Tolentino Mendonça, à data arquivista e bibliotecário do Vaticano e agora prefeito do Dicastério para a Cultura e a Educação.

Tolentino Mendonça, natural da Madeira, tem 57 anos. É doutorado em Teologia Bíblica, antigo vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa e um nome considerado essencial da poesia portuguesa contemporânea.

Para o padre Paulo Terroso, de Tolentino Mendonça destacam-se as suas facetas de escritor, poeta e ensaísta, descrevendo-o como “um homem com um sentido raro para ler ‘os sinais dos tempos’”.

“Talvez, por isso mesmo, consegue, como poucos em Igreja, compreender o mundo contemporâneo e dialogar com ele, iluminando-o com a luz do Evangelho”, adiantou.

  • D. Américo Aguiar

D. Américo Aguiar, presidente da Fundação Jornada Mundial da Juventude Lisboa 2023 e coordenador geral da organização da visita, em agosto último, do Papa Francisco a Portugal, é natural de Leça do Balio, Matosinhos. A partir de sábado torna-se cardeal.

Com 49 anos, o novo bispo da Diocese de Setúbal é licenciado em Teologia e mestre em Ciências da Comunicação.

Ordenado sacerdote em 2001 e integrado na Diocese do Porto, nesta desempenhou vários cargos, como pároco ou vigário-geral. Foi também diretor do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais da Conferência Episcopal Portuguesa e presidente da Irmandade dos Clérigos, antes de ingressar na Diocese de Lisboa, onde foi, até agira, bispo auxiliar.

Cardeais que já não participam num futuro conclave

Os cardeais Saraiva Martins e Monteiro de Castro, por terem ultrapassado os 80 anos, também integram o Colégio Cardinalício, mas não participam num futuro conclave.

  • Saraiva Martins, de 91 anos, é natural da Guarda. Em 1988, foi nomeado secretário da Congregação para a Educação Católica e, 10 anos depois, prefeito da Congregação para as Causas dos Santos. Foi criado cardeal por João Paulo II (1920-2005).
  • Monteiro de Castro, de 85 anos, é natural de Guimarães. Foi penitenciário-mor da Santa Sé e somou uma vasta experiência diplomática ao serviço do Vaticano. Foi elevado a cardeal por Bento XVI.

"Quanto mais cardeais eleitores um país tiver, maior será sua influência no próximo conclave"

"O facto de haver mais cardeais portugueses terá a ver com a maior proximidade daquilo que é o espírito e que são as ideias centrais do Papa Francisco e a preocupação que ele tem tido em renovar o Colégio Cardinalício com direito a voto, isto é, em termos também de faixa etária”, refere Teresa Toldy, professora catedrática da Universidade Fernando Pessoa.

O padre jesuíta Nuno da Silva Gonçalves, professor na Faculdade de História e Bens Culturais da Igreja da Pontifícia Universidade Gregoriana, disse que haver quatro cardeais eleitores portugueses deve atribuir-se, “sobretudo, ao mérito pessoal e à confiança neles depositada pelo Papa”.

“É de reconhecer, claramente, que o número de quatro cardeais eleitores vai muito além do peso que se pode atribuir à Igreja portuguesa no conjunto da Igreja Católica. Por isso mesmo, temos de procurar outros critérios que não os da simples representação proporcional, baseada no número de católicos de um determinado país”, argumentou.

Realçando que não se pode esquecer que “a escolha dos cardeais é uma prerrogativa pessoal do Papa”, pelo que a confiança é, no seu entender, “o critério decisivo”, o sacerdote, que a partir de domingo passa a ser diretor da revista La Civiltà Cattolica, publicação dos Jesuítas e uma das mais antigas do mundo, sublinhou que Francisco tem “privilegiado este critério da confiança, manifestando uma grande liberdade nas suas escolhas”.

“Basta vermos que tem escolhido como cardeais bispos de dioceses consideradas ‘secundárias’, em detrimento de grandes dioceses cujos bispos tradicionalmente eram criados cardeais”, declarou.

Na opinião do padre Paulo Terroso, diretor de Comunicação da Arquidiocese de Braga e membro da Comissão de Comunicação do Sínodo, este é “um momento excecional na História da Igreja em Portugal, dada a dimensão de país e o facto de Portugal já não ser sinónimo de Império”.

“Basta comparar Portugal com a nossa vizinha Espanha que, embora tenha seis cardeais, tem quase cinco vezes mais população do que Portugal. Ou então com a França, que tem neste momento tantos cardeais como Portugal, quatro”, exemplificou.

Para Paulo Terroso, as escolhas de Francisco têm “mais a ver com a relação e o conhecimento que o Papa tem com os escolhidos e do que eles podem contribuir como [seus] conselheiros” do que com a geografia, “ainda que esta não seja desconsiderada ou irrelevante”.

O sacerdote referiu que, “quanto mais cardeais eleitores um país tiver, maior será sua influência no próximo conclave para eleger um Papa (…), mas depende muito do entendimento dos cardeais entre si”, admitindo que, “basicamente, significa que Portugal, melhor, a Igreja em Portugal, pode desempenhar um papel significativo na direção futura da Igreja Católica”.

“Para a Igreja em Portugal, o mais relevante, na minha perspetiva, para além do prestígio que o cardinalato significa, não é ter mais ou menos cardeais que altera a realidade interna. É muito mais importante, porque determinante, o perfil do bispo e a relevância eclesial e social da diocese que lhe foi confiada”, acrescentou.

Papa está há 10 anos a levar as periferias para o Colégio Cardinalício

O Papa Francisco, eleito em março de 2013, está há uma década a levar as periferias para o Colégio Cardinalício.

No início de março de 2013, antes de Francisco assumir a liderança da Igreja Católica, a maioria (60) dos então 115 cardeais eleitores, aqueles que podem eleger o Papa por terem menos de 80 anos, tinha proveniência europeia. Numa projeção a 30 de setembro, feita pela agência Ecclesia, dos 137 cardeais eleitores, 53 serão europeus.

No consistório, a D. Américo Aguiar, presidente da Fundação Jornada Mundial da Juventude (JMJ) Lisboa 2023 e futuro titular da Diocese de Setúbal, juntar-se-ão outros prelados, incluindo da Malásia e Sudão do Sul, países sem representação no Colégio Cardinalício, onde também vai passar a estar Hong Kong.

A professora catedrática da Universidade Fernando Pessoa, Teresa Toldy, considerou que a estratégia do Papa “é ir para as periferias, portanto, desequilibrar, no sentido positivo do termo, forças que fossem mais conservadoras e que ainda estivessem no Colégio Cardinalício”, cuja missão é aconselhar o Papa.

“Isso é um aspeto que é muito relevante nesta decisão”, afirmou à agência Lusa a professora de Ética doutorada em Teologia.

Jorge Bergoglio, que era arcebispo de Buenos Aires (Argentina) quando foi escolhido líder da Igreja Católica, é o primeiro Papa americano e, também, o primeiro Papa jesuíta.

Assim que foi eleito, sucedendo a Bento XVI (1927-2022), nas primeiras palavras que dirigiu à multidão que se encontrava na Praça de São Pedro, na Cidade do Vaticano, Francisco referiu que os cardeais foram buscar um Papa “ao fim do mundo”.

No mesmo mês, numa missa, exortou o clero a ir para “as periferias, onde se encontra o sofrimento”.

O assistente geral dos Missionários do Espírito Santo, padre Tony Neves, salientou que com os novos cardeais (21 no total, incluindo três não eleitores), “o Papa continua a ir às periferias”.

“E, sobretudo, continua a ler sinais do futuro para a Igreja”, disse, assinalando que, ao tornar Tolentino Mendonça seu conselheiro, “a ideia do Papa foi buscar alguém do mundo da cultura” e com “capacidade de entrar num mundo que, habitualmente, a Igreja não entra muito”.

Segundo Tony Neves, “foi esse o filão que o Papa quis explorar” com Tolentino Mendonça, sendo que, com a escolha de Américo Aguiar, Francisco “vai buscar um outro filão, que é também fundamental e para o qual a Igreja, sobretudo no Ocidente, está a afastar-se”, a juventude.

O espiritano lembrou que D. Américo Aguiar foi “capaz de pegar naquilo que, à partida, se achava que ia ser um pequenino evento com muito poucos jovens”, porque “Portugal é pequenino e a juventude em Portugal, segundo todos os indicadores, estava muito afastada da Igreja, ainda por cima com a questão dos abusos [sexuais] ficou pior”, e torná-lo num evento com 1,5 milhões de pessoas, referindo-se à JMJ.

“O Papa (…) percebeu que tinha ali alguém que o poderia auxiliar muito nesta necessidade e urgência que a Igreja tem de descer ao planeta jovem”, defendeu.

Frisando que as periferias não são apenas geográficas, Tony Neves destacou que Francisco “tem sido muito bom nesta capacidade” de “fazer das periferias o centro”, porque “é nessas periferias que se joga o futuro da Igreja”.