“Eu sou reformada, trabalhei até aos 65 anos e acho que é demasiado obrigar toda a gente a trabalhar até aos 65 anos. Por isso estou aqui e também porque acho que este é o momento da esquerda se entender. Este é o momento para fazerem alguma coisa todos juntos”, explicou Christelle, antiga professora, que veio hoje até à tradicional manifestação do 1º de maio em Paris.

O seu marido, Patrick, vem a esta manifestação desde o Maio de 1968 e sendo de esquerda, mas sem etiqueta política, lamenta que a França tenha virado à direita, dizendo que há “uma regressão na sociedade” e que as pessoas se viraram para o individualismo, algo que não corresponde à sua visão da sociedade.

“Não foi assim que fui educado. Temos de continuar a ter esperança num futuro mais justo”, disse este reformado parisiense.

A esperança nesta manifestação parece ter um nome: Jean-Luc Mélenchon. Antes da partida do cortejo, organizou um minicomício, reunindo várias centenas de pessoas, onde disse que já há acordo com os ecologistas, o Partido Socialista está quase e pedindo aos comunistas para voltar à mesa de conversações de forma a encontrar um entendimento para as eleições legislativas de 12 e 19 de junho.

“Decidimos passar por cima das divisões que só conseguimos ultrapassar porque vocês mostraram a vossa vontade de ver uma esquerda unida nos boletins de voto. Creio que estamos a milímetros de nos entender todos. As discussões devem terminar esta noite”, disse o líder da França Insubmissa, que obteve 21,95% dos votos na primeira volta das eleições presidenciais.

Para os militantes desta força política, o acordo é possível desde que se mantenham as bases do programa do candidato.

“É o bom caminho se formos intransigentes sobre as nossas condições. Não voltamos atrás na reforma aos 60 anos, salário mínimo nos 1.400 euros, uma segurança social com 100% de reembolsos, o referendo de iniciativa cidadã. Estes são os nossos valores fundamentais”, indicou Jamila, desenhadora de banda desenhada, que veio ouvir Mélenchon esta tarde.

Com 70 anos, para Jamila, Jean-Luc Mélenchon é “o melhor político dos nossos tempos” e será o primeiro-ministro ideal, caso a esquerda consiga uma maioria nas legislativas, para fazer frente à “urgência social e ambiental” em que está a França. Do lado dos socialistas, ter Mélenchon à frente de um Governo não é a solução ideal.

“Veremos o resultado das legislativas e dar-lhe uma oportunidade se ele conseguir uma maioria para a esquerda. Mas não é o meu primeiro-ministro que eu escolheria”, disse Dominique, militante socialista.

Este quadro de uma empresa de exportação considera diz que a união é essencial para a esquerda, mas que os limites do Partido Socialista também devem ser respeitados nas negociações.

“A esquerda só pode ganhar se estiver unida, portanto temos de encontrar um acordo. Mas será que este acordo é possível? Não sei. Tudo depende da França Insubmissa, nós temos fundamentos como a pertença à União Europeia ou a laicidade e se isso for aceite, podemos ter um acordo, mas não vamos aceitar tudo”, questionou Dominique.

Já no meio do cortejo, Jean-Luc Mélenchon e Olivier Faure, secretário-geral do Partido Socialista, apertaram a mão, um gesto simbólico e histórico que visa selar uma união pré-eleitoral inusitada, com os comunistas a mostrarem-se mais cautelosos.

“Estas negociações são complicadas porque vemos uma França Insubmissa que tem dificuldade em pôr à frente dos seus interesses o interesse de toda a esquerda. Mas claro que todos temos interesse em encontrar um acordo e tentar ter uma maioria que vá contra as políticas de Emmanuel Macron”, declarou Antoine, militante dos Jovens Comunistas do Partido Comunista francês.

Com um acordo à vista, este jovem comunista não esquece a carga de um entendimento poder ser encontrado hoje, mesmo se os comunistas se retiraram das negociações, embora não seja uma decisão “definitiva”.

“O 1º de Maio é sempre importante, mas este ano é especialmente porque temos um Presidente que, pela primeira vez desde há 20 anos, não sabe se vai ter uma maioria. Nada está perdido, se tivermos uma unidade à esquerda, podemos impedir a idade da reforma aos 65 anos, melhorar as condições de trabalho e parar este caminho autoritário de Emmanuel Macron”, indicou.

Tal como ano passado, a manifestação do 1º de maio em Paris, normalmente pacífica, foi perturbada por elementos dos grupos black blocs que criaram não só conflitos com a polícia, que acabou por utilizar gás lacrimogéneo para dispersar os manifestantes, mas também incendiaram caixotes do lixo e partiram vitrinas de lojas e restaurantes. Estes confrontos levaram o ministro do Interior, Gerald Darmanin, a condenar a “violência inaceitável” à margem desta manifestação.

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