“Em Lisboa, as pessoas estão sempre a falar-me sobre surf. É fantástico. As praias estão a 20 minutos do centro histórico lindo e cheio de vida”. Começa assim, o artigo publicado ontem no jornal inglês The Guardian que ao longo de quase 30 parágrafos descreve como Lisboa se transformou numa cidade de rastos na nova capital “cool” da Europa.
Para retratar esta nova Lisboa, Rowan Moore, o jornalista que assina o artigo, falou com um conjunto de pessoas. Patrick, o empreendedor americano que já teve um negócio na Costa Rica e no Bali; Matthieu, um ‘life coach’ francês; Tariq, o inglês especialista em propriedades; Rohan Silva, outro britânico, empreendedor no mercado de tecnologias que, segundo o jornalista do The Guardian, a imprensa inglesa gosta de descrever como “tech scenester”; e Charlie Orford, co-fundador do site de reserva de voos Low Cost Hero.
Falou também com portugueses. João Vasconcelos, secretário de Estado da Indústria; Mariana Pestana, organizadora da Trienal de de Arquitetura de Lisboa em 2013; Mariana Duarte Silva, responsável pelo Village Underground; Ana Jara e Lucinda Correia, arquitetas da Arteria.
Além das pessoas com quem falou, Rowan Moore também falou de outras pessoas:António Costa, a quem é atribuído um conjunto de conquistas, à cabeça. É um primeiro-ministro “pró-empresas”, nas palavras do empreendedor britânico Rohan Silva. Recordando os tempos de Costa como presidente da Câmara Municipal de Lisboa, o jornalista do The Guardian sublinha o papel que desempenhou no encorajamento a empreendedores criativos e techies, além, claro, do turismo que impulsionou na cidade ao facilitar a abertura de hotéis em edifícios históricos. Lembra ainda que António Costa lançou programas para ajudar crianças e desempregados a aprender a programar. Além disso, acrescenta, criou a Startup Lisboa, com a ajuda de João Vasconcelos e de Graça Fonseca, hoje secretária de Estado da Presidência e vereadora em Lisboa durante o mandato camarário. Além de António Costa, são referidos outros nomes, como o de Vhils, ou locais, como o mercado da Ribeira (‘Time Out Market’) ou a Cozinha Popular.
A tónica geral do artigo é francamente elogiosa para Lisboa, até - ou sobretudo - pela forma como a capital portuguesa reagiu à “pior crise em 100 anos”, de acordo com João Vasconcelos, os anos em que , diz o The Guardian, "pessoas dormiam em carros porque tinham sido forçadas a sair das suas casas". O artigo cita o novo clima psicológico que se vive no país e a forma como isso tem impacto na economia: “As mudanças económicas já não são algo que nos acontece. Há algum controlo”, afirma Mariana Pestana.
O jornalista do The Guardian, que publica o artigo na secção de Arquitetura, afirma que Lisboa se tornou “um exemplo extraordinário daquilo a que se pode chamar urbanismo Monocle” [em referência à revista inglesa que tem publicado vários artigos e suplementos patrocinados sobre a capital portuguesa].
Quase no final, o artigo dá voz algumas críticas, protagonizadas pelas arquitetas Ana Jara e Lucinda Correia. Em causa está a subida de preços no mercado imobiliário, o impacto que está a ter no afastamento das pessoas do centro da cidade e o efeito dos golden visa em todo este processo. Mariana Duarte Silva corrobora esta visão: “As pessoas estão a ser empurradas para fora das suas casas e as lojas tradicionais estão a fechar. Mas o primeiro-ministro está muito consciente disso”.
No fim, o artigo relembra a capacidade de Lisboa em mimetizar outras cidades. A ponte 25 de Abril que espelha a Golden Gate de São Francisco ou o Cristo Rei que emparelha com o Cristo Redentor do Rio de Janeiro. Agora, nesta nova Lisboa, Londres é a grande inspiração, mas com um olho em Silicon Valley, por causa das empresas de garagem que se tornaram em gigantes da tecnologia, e em Miami a pensar nos reformados do norte da Europa. Algures neste triângulo acontece o Brexit. Em Lisboa há quem espere que essa seja uma oportunidade real de a cidade ser mais que um destino cool. Uma expetativa do país inteiro, na realidade.
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