Às 15:15 (16:15 em Lisboa), um quarto de hora antes da hora marcada, já a fila para o Centro Comunitário João Bosco Mota Amaral se ia perfilando pela Rua da Ribeira acima, aproximando-se da praça onde fica a Ermida de São Tiago.
As pessoas respondiam à convocatória para a testagem voluntária naquela freguesia, a que mais cuidados inspira atualmente nos Açores.
Os 59 casos de covid-19 registados naquela localidade, de cerca de 3.100 habitantes (de acordo com os Censos de 2011), contribuem largamente para o total de 99 casos positivos ativos do concelho da Lagoa, na ilha de São Miguel.
Nem a chuva que ia caindo, sempre miúda, afastou aqueles que, voluntariamente, responderam hoje ao repto da Direção Regional da Saúde, que trabalhou em parceria com a Unidade de Saúde de Ilha de São Miguel (USISM), a Câmara Municipal da Lagoa, a Junta de Freguesia de Água de Pau e a Ordem dos Enfermeiros para montar a operação que, entre hoje e quarta-feira, espera testar cerca de 2.500 pessoas com mais de 6 anos.
"Existe um surto em Água de Pau e por isso é que estamos aqui, para tentar apanhar mais positivos", explicou aos jornalistas o presidente do Conselho de Administração da USISM, Pedro Santos, ressalvando que o ideal seria que não fossem detetados mais casos.
Mas o objetivo primordial da operação é "quebrar cadeias de transmissão, para evitar mais contágios".
O relógio passa pouco das 15:30 quando as pessoas começam a ser chamadas para dentro do recinto. "Boa tarde, teve ‘covid’ há menos de três meses?", vão perguntando as assistentes operacionais, para avaliar se aquela pessoa poderá ou não fazer o teste.
Quem teve a doença causada pelo novo coronavírus recentemente poderá ainda acusar positivo, pelo que está dispensado. Dispensados estão também todos aqueles que já tiverem o processo de vacinação completa, com a toma de duas doses, ou a toma única no caso da vacina Janssen.
Os testes usados são, como já vem sendo habitual nestas operações, testes antigénio, ou testes rápidos, pelo que toda a gente sairá daquele espaço a saber, depois de uma espera que varia entre os 15 e os 30 minutos, se o resultado foi positivo ou negativo.
Meia hora depois do início da operação e ainda ninguém tinha acusado positivo.
"É um alívio", contou à Lusa Graciela, de 37 anos. "É sempre bom ter a certeza que a gente não está a contaminar ninguém, nem está contaminado".
Depois de saber o seu resultado, aguardava ainda pelo diagnóstico da sua filha mais velha, a Sofia, de 8 anos.
Antes de entrar, Sofia confessou que estava "com um bocadinho de medo", já que era a primeira vez que era testada, mas saiu bem-disposta.
Tatiana, de 24 anos, já foi testada à covid-19 outras duas vezes "e ainda custa um bocadinho", confessa, mas apresenta-se novamente por "uma questão de bom senso, de responsabilidade".
"Viemos de livre e espontânea vontade. Sabemos que não é obrigatório, mas é uma questão de dever cívico", concretiza.
A jovem ainda não foi vacinada, por isso enquadra-se na convocatória, mas o seu irmão, de 21 anos, foi vacinado hoje, com a vacina de toma única da Johnson & Johnson.
"Não tem nada e levou primeiro que os meus pais. É estranho", menciona.
Quanto ao surto local, nota que, "de forma geral, as pessoas estão preocupadas, mas também há aquelas pessoas que não se importam e esse é que é o problema".
"As pessoas relaxam muito e isso é notório na praça, ali na zona do centro, as pessoas estão sempre sem máscara, não têm cuidados nenhuns", aponta Tatiana.
Também Luísa Cabral, de 59 anos, compareceu "para ver se isso passa tudo, porque há muita gente que não respeita". Não será submetida a teste, porque já tem as duas doses da vacina, mas foi acompanhar os netos e a filha.
Já Maria do Carmo, de 73 anos, levou só uma dose e, por isso, é que está ali, atira. Considera o esforço de testagem "importante, porque isso está tudo muito ruim".
Porquê, não sabe — "dizem que é por causa dos conjuntos que se ‘ajuntam'" –, mas Maria não pode atestar a veracidade da afirmação, porque raramente sai de casa.
Tobias Lopes, de 69 anos, dono de um emblemático estabelecimento da freguesia, conhecido pelos gelados, também não sabe apontar as razões do surto, mas sabe que não são os cafés.
"Parece que os cafés é que são os culpados disso… Não vamos para a verdade, vamos para essa mentira de que os cafés é que têm a culpa, quando isso vem de fora para dentro e não de dentro para fora", afirma.
O seu café está fechado há 15 dias e os casos "continuam a subir".
"Aí está uma razão [que mostra] que não tem nada a ver com isso", frisou.
Os Açores contam atualmente com 309 casos de covid-19: 294 em São Miguel, cinco no Faial, cinco na Terceira, dois na Graciosa, dois no Pico e um em Santa Maria.
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