[Notícia atualizada às 16:31]

Os talibãs já entraram em Cabul, apesar das garantias iniciais de que só avançariam para o interior da capital afegã após uma transição pacífica de poder, avançou a agência EFE que testemunhou a presença dos insurgentes na cidade.

Os talibãs divulgaram, entretanto, que entraram na capital afegã para controlar possíveis situações de roubo e de pilhagem após o recuo e a fuga das forças de segurança governamentais afegãs.

"Para evitar atos de pilhagem em Cabul e para evitar que os oportunistas prejudiquem o povo, o Emirado Islâmico [como os talibãs se autodenominam] ordenou às suas forças que entrassem nas áreas de Cabul de onde o inimigo saiu”, referiram os insurgentes num comunicado.

A ofensiva à capital ocorre ao fim de 10 dias, depois de os talibãs tomarem o controlo da maior parte do país, tendo hoje elevado para 26 o número de capitais de província, de um total de 34, sob seu domínio, com a conquista de Jalalabad.

Após os talibãs encetarem contactos para forçar o Governo a transferir-lhes o poder, o Presidente do Afeganistão, Ashraf Ghani, terá abandonado o país, refugiando-se no estado vizinho do Tajiquistão.

A confirmação foi feita à Reuters por um alto funcionário do Ministério do Interior, que, todavia, recusou-se a prestar mais declarações por "razões de segurança" do presidente cessante. Já um representante dos talibãs disse que o grupo está a tentar verificar a localização de Ghani.

A Associated Press obteve informação semelhante por parte de dois funcionários a falar em condição de anonimidade. Apesar de não indicarem para onde Ghani foi, dizem que já abandonou o país por via aérea.

Abdullah Abdullah, líder do Concelho Nacional de Reconciliação Afegã confirmou também que o Presidente já não se encontra no país. "Ele deixou o Afeganistão numa altura de aperto, que Deus o responsabilize", disse.

Esta aparente fuga de Ghani contrasta aparentemente com as suas declarações hoje emitidas, tendo pedido às autoridades que garantam a “segurança de todos os cidadãos”, mantendo a ordem e a lei em Cabul, após a chegada dos talibãs à capital, e avisou que pode recorrer à força.

“Ordenei às forças de segurança […] que garantam a segurança de todos os nossos cidadãos. É nossa responsabilidade e vamos fazê-lo da melhor maneira possível”, afirmou o chefe de Estado, numa mensagem de vídeo enviada à comunicação social.

Ghani avisou ainda que “quem pensar em criar caos ou iniciar saques será tratado com recurso à força”.

As declarações combativas de Ghani foram feitas já depois do ministro do Interior afegão, Abdul Sattar Mirzakwal, ter afirmado hoje que uma "transferência pacífica de poder" para um governo de transição terá lugar no Afeganistão. "Os afegãos não devem preocupar-se (...) Não haverá nenhum ataque à cidade [de Cabul]. E haverá uma transferência pacífica de poder para um governo de transição", disse Mirzakwal numa mensagem de vídeo.

A Associated Press refere que os líderes talibãs, quando estavam à espera nas portas de Cabul, encetaram diálogo com o Governo afegão para uma "transferência pacífica" da cidade, prometendo não tomá-la com violência.

Entretanto, os rebeldes insistiram que o controlo da segurança em Cabul permanece "com o outro lado", e lembraram à população que não têm "qualquer intenção de se vingar de ninguém", incluindo daqueles que serviram no exército, na polícia ou na administração: "Estão perdoados e a salvo, ninguém será objeto de represálias".

"Todos devem ficar no seu próprio país, na sua própria casa, e não tentar deixar o país", acrescentaram.

Países ocidentais aceleram saída

Este assalto ocorre numa fase em que os EUA estão a tentar retirar o pessoal diplomático da sua embaixada o mais rápido possível, apanhados de surpresa pelo avanço dos talibãs — uma estimativa recente dos serviços de Inteligência norte-americanos considerava que Cabul ainda se podia aguentar durante três meses antes de uma eventual tomada.

O governo dos EUA disse no início deste mês que estava já a processar cerca de 20.000 pedidos de visto de afegãos que ajudaram os seus soldados, juntamente com as suas famílias, o que acrescenta pelo menos 50.000 pessoas.

A necessidade de retirar os diplomatas levou Joe Biden, Presidente dos EUA, a anunciar o envio de 5000 soldados para o aeroporto de Cabul para garantir passagem em segurança.

O rápido avanço da ofensiva talibãs foi motivado pela fase final de retirada das tropas do país dos Estados Unidos e da NATO, iniciada em maio e que deverá ficar concluída este mês.

Desde então, os talibãs assumiram o controlo de mais 140 centros distritais, todas as capitais de província, incluindo Cabul, e cerca de 10 passagens de fronteira, a maior conquista em duas décadas de guerra. P

O avanço levanta questões quanto ao trabalho que os EUA fizeram no Afeganistão quanto à preparação do seu exército, posto que foram investidos milhares de milhões de doláres em preparação militar e infraestruturas, além dos elevados custos de manter uma guerra durante duas décadas.

O medo crescente de que a capital afegã, Cabul, pudesse cair nas mãos dos talibãs a qualquer momento fez com que vários países se mobilizassem rapidamente para retirar o seu pessoal nacional em Cabul, bem como cidadãos afegãos que trabalharam de perto com eles durante os últimos vinte anos de conflito .

Nesta semana, quase 4.200 pessoas ainda trabalhavam na embaixada dos Estados Unidos em Cabul.

Funcionários da embaixada dos Estados Unidos em Cabul, no Afeganistão, foram transferidos com urgência para o aeroporto da capital afegã, para onde milhares de soldados norte-americanos foram enviados, disse hoje o secretário de Estado Antony Blinken.

"Estamos a transferir os homens e mulheres da nossa embaixada para o aeroporto. Esta é a razão pela qual o presidente enviou muitas forças armadas", disse Blinken ao canal ABC, numa altura em que os talibãs estão às portas de Cabul.

O secretário de Estado norte-americano rejeitou qualquer comparação entre a situação em Cabul e a queda de Saigão, no Vietname, no final da guerra, em 1975, reafirmando que os Estados Unidos "alcançaram os objetivos" da guerra no Afeganistão.

"Fizemos justiça a Bin Laden há dez anos", disse Blinken.

"Isto não é Saigão", disse o secretário de Estado dos Estados Unidos à CNN, citado pelas agências internacionais.

"Fomos ao Afeganistão há 20 anos com uma missão e essa missão era acertar as contas com aqueles que nos atacaram em 11 de setembro. Cumprimos essa missão", sublinhou.

Mas, ficar no Afeganistão indefinidamente não é do “interesse nacional", disse Blinken, lembrando que os Estados Unidos agora querem conter a política agressiva da China no Pacífico.

"Não há nada que os nossos concorrentes estratégicos gostariam mais do que ver-nos atolados no Afeganistão por mais 5, 10 ou 20 anos", disse.

Porém, quando pensamos nas mulheres e meninas que viram as suas vidas progredir "durante os 20 anos de presença americana no Afeganistão, é doloroso", sublinhou.

Além dos Estados Unidos, também outros países anunciaram que vão acelerar o plano de evacuação das embaixadas em Cabul, como a Alemanha, Suécia e Espanha.

A Alemanha anunciou hoje que transferiu os seus funcionários da embaixada e funcionários locais para o aeroporto de Cabul, aguardando uma evacuação segura em aviões militares e enquanto a Suécia e outros países nórdicos esperam concluir essa operação hoje, avança a agência EFE.

O ministro dos Negócios Estrangeiros alemão, Heiko Maas, relatou a transferência de pessoal diplomático e de outros funcionários para o aeroporto militar, bem como o encerramento da embaixada.

Os preparativos para a evacuação foram apressados hoje, tanto pela Alemanha como pela Suécia, que espera concluir a operação até final do dia. A Dinamarca e a Noruega já anunciaram na sexta-feira o encerramento das suas embaixadas em Cabul, capital do Afeganistão.

A Alemanha concluiu em junho a retirada das suas tropas no Afeganistão, que formavam o segundo maior contingente internacional daquele país, depois dos Estados Unidos e cuja sede era em Mazar-e-Sharif, no norte do país, que no sábado ficou sob o poder dos talibãs.

Também Espanha anunciou que vai acelerar o plano de evacuação do Afeganistão de todo o pessoal da sua embaixada, uma dúzia de trabalhadores e várias centenas de afegãos que colaboraram durante missões militares e projetos de cooperação espanhola, indicaram fontes diplomáticas à EFE.

Já a Rússia não planeia evacuar o pessoal da sua embaixada em Cabul, enquanto os talibãs estiverem à porta da capital afegã, disse hoje um alto funcionário russo.

"Nenhuma evacuação está planeada", disse Zamir Kabulov, o enviado do Kremlin ao Afeganistão, citado pela agência Interfax, enfatizando que estava "em contacto direto" com o embaixador russo em Cabul, cujos colaboradores continuaram a trabalhar "calmos" na embaixada.