“Espero que todo o Brasil, todos os demais brasileiros, entendam que estamos virando uma página na relação da ABL com os povos indígenas”, disse Krenak, de 70 anos, minutos antes da cerimónia.
Durante a tomada de posse, foi recordado o discurso que proferiu na Assembleia Nacional Constituinte, em 1987, após pintar o rosto com tinta preta em protesto pelo retrocesso dos direitos indígenas: “Os indígenas regaram de sangue cada hectare dos oito milhões de quilómetros quadrados do Brasil”.
Usando uma faixa indígena, Krenak discursou na sexta-feira sobre a importância da cultura, do português e das línguas dos povos indígenas, mas também da natureza e da urgência de proteger as terras e os rios da ganância humana.
“Se não sabemos como retribuir a gentileza e ajudar a reconstruir um tecido comunitário, estamos a cooperando com a prática da predação”, afirmou.
Krenak disse que pretende criar uma plataforma para disponibilizar os documentos e livros da instituição em línguas indígenas, muitas das quais estão em vias de desaparecer.
“Poderíamos fazer isso para todas as línguas nativas. Cabe inteiramente à Academia Brasileira de Letras incluir outras 170 línguas além do português”, disse o escritor.
“A ideia é priorizar a linguagem falada e não o texto. O que ameaça essas línguas [indígenas] é a falta de falantes”, acrescentou.
Aílton Krenak nasceu em 1953 em Minas Gerais, no vale do rio Doce, uma zona afetada pela extração mineira, e fugiu do seu território natal quando tinha cerca de 11 anos, regressando só quando já era adulto.
O ativista participou na fundação da Aliança dos Povos da Floresta e da União das Nações Indígenas, o primeiro movimento indígena de expressão nacional no Brasil.
Krenak estreou-se como escritor em 1999, quando a sua obra “O Eterno Retorno do Encontro” foi incluída na antologia “A Outra Margem do Ocidente”.
Entre as suas obras contam-se ainda “O Amanhã Não está à Venda” (2020), “A Vida Não é Útil” (2020), “Futuro Ancestral” (2022), “O sistema e o antissistema: três ensaios, três mundos no mesmo mundo” (2021), “O lugar onde a terra descansa” (2000) e “Firmando o pé no território” (2020).
O seu livro “Ideias para Adiar o Fim do Mundo”, lançado em 2021, foi um dos mais vendidos no Brasil naquele ano e já foi traduzido para inglês, francês e alemão.
Na terça-feira, a Comissão de Amnistia do Ministério dos Direitos Humanos do Brasil tinha aprovado um pedido inédito de reparação coletiva por graves violações aos direitos de comunidades indígenas do país, incluindo a etnia Krenak, durante a ditadura militar (1964 a 1985).
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