Álvaro Siza foi o primeiro arquiteto não espanhol a receber o Prémio Nacional de Arquitetura, atribuído anualmente pelo Governo de Espanha desde 1932.
“Acredito que as maiores dificuldades estão na origem das maiores descobertas. Alguém me disse que a palavra crise em grego significa também recomposição, mudança, é nisso que acredito. O Homem encontrará a vacina para qualquer crise, como acontece há séculos”, afirmou o arquiteto português, em videoconferência a partir do Porto, durante a cerimónia, que decorreu em Espanha e foi transmitida ‘online’.
A decisão de atribuir o prémio a Álvaro Siza Vieira, anunciada há quase um ano, foi tomada durante o II Congresso Internacional “Arte, Cidade e Paisagem”, que decorreu em Cuenca (Espanha), e teve Portugal como país convidado.
Foi “com muita emoção” que Álvaro Siza agradeceu o prémio, que considerou ser “mais um sinal do reconhecimento” que deve a Espanha. “Das muitas oportunidades de trabalho e convivência que desde cedo estiveram presentes no meu percurso profissional e pessoal”, referiu.
O arquiteto recordou os encontros de arquitetura em que participou em Espanha, na década de 1970, “nos quais se reuniam periodicamente arquitetos das diversas regiões do país” e onde conheceu “grandes amigos e arquitetos, uma geração que lutava pela transformação da condição e sentido do seu trabalho, pela universalidade e contemporaneidade, em oposição ao nacionalismo”.
Nesses encontros, contou, o que se fazia “era simples”. “Cada um apresentava um ou vários projetos, abrindo um debate em que se confrontavam diferentes ideias à procura de um rumo, em que história, identidade e resposta às exigências de um mundo em mudança profunda estivessem presentes em complementaridade. Um debate clarificador da necessidade e poder transformador da arquitetura e das competências do arquiteto”, partilhou.
Nos encontros, de uma geração que “esperava uma mudança”, marcavam presença “arquitetos de todas as regiões de Espanha e algum estrangeiro convidado”.
A década de 1970, com a queda das ditaduras de Franco e Salazar, “trouxeram essa mudança, tanto em Espanha como em Portugal, e o mundo continua a mudar”.
Para Álvaro Siza Vieira “é necessário manter a abertura e entusiasmo de então”: “lutar pelo serviço prestado e generalizado a todos os cidadãos, que é a razão de ser da arquitetura, a essência da arquitetura, como de qualquer forma de arte”.
“Para isso se prepara ou está preparada uma nova geração. Não sei se será ainda mais difícil do que é hoje para a geração a que pertenço, ou mais alcançável”, afirmou.
Na cerimónia de entrega do prémio a Álvaro Siza marcaram presença os dois chefes de Governo de Portugal e Espanha, António Costa e Pedro Sanchez, respetivamente.
António Costa, em videoconferência a partir de Lisboa, salientou que, “não sendo a primeira vez que Álvaro Siza vieira é distinguido por Espanha com um importante prémio”, esta distinção tem um “significado especial”, visto ser a primeira vez que é atribuída a um arquiteto não espanhol.
O primeiro-ministro português salientou que a arquitetura de Siza “não é regionalista, como em certa altura a crítica anglo-saxónica a tentou categorizar, mas sim universalista, aberta ao mundo, como o melhor a cultura portuguesa, de que Fernando Pessoa, José Saramago ou Manoel de Oliveira são outros exemplos”.
Já Pedro Sanchez, que participou presencialmente na cerimónia, fez uma associação entre o trabalho de Siza Vieira, no qual “com frequência as suas obras aparecem em continuidade com a paisagem envolvente, em respeito pelo meio ambiente” e têm também “capacidade de melhorar o bem-estar das pessoas”, e a realidade que a pandemia da covid-19 colocou a nu.
“A pandemia fez-nos questionar muitas coisas: forma de viver, de trabalhar, de nos relacionarmos do ponto de vista social. Está nas mãos dos arquitetos fazer propostas que mudem a maneira como vivemos. Os arquitetos devem ter um papel fundamental nesta transformação”, afirmou.
Pedro Sanchez salientou que Álvaro Siza “esteve sempre em sintonia com valores como o reequilíbrio social”, e que Espanha “tem muito a agradecer-lhe”, visto que “influenciou tantos arquitetos espanhóis que participam neste processo de transformação social” que se está a viver.
Álvaro Siza Vieira nasceu em Matosinhos, em 1933, e estudou Arquitetura na Escola Superior de Belas Artes do Porto, entre 1949 e 1955.
Em Espanha construiu, entre muitos outros edifícios, o Centro Meteorológico da Villa Olímpica de Barcelona, as casas de habitação social de Cádis, a Faculdade de Ciências da Informação de Santiago de Compostela, a Reitoria da Universidade de Alicante ou o edifício Zaida de Granada.
É autor de inúmeros outros projetos, entre os quais se destacam, em Portugal, as vivendas no Bairro da Malagueira em Évora, a Faculdade de Arquitetura da Universidade do Porto, o Centro Paroquial de Marco de Canavezes, o Pavilhão de Portugal da Expo'98 em Lisboa, o Pavilhão de Portugal da Expo'2000 em Hannover (com Souto de Moura) e o Museu de Arte Contemporânea de Nápoles.
Da sua grande lista de distinções destaca-se o Prémio de Arquitetura da Associação Internacional de Críticos de Arte (1982), o Prémio de Arquitetura da Associação dos Arquitetos Portugueses (1987), a Medalha de Ouro de Arquitetura do Conselho Superior dos Colégios de Arquitetos de Espanha (1988), o Prémio Mies van der Rohe (1988) e o Prémio Pritzker (1992).
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