De acordo com um relatório do GPIAAF - Gabinete de Prevenção e Investigação de Acidentes com Aeronaves e de Acidentes Ferroviários, a que a Lusa teve acesso, e que analisou as causas do acidente, a razão imediata para o descarrilamento foi “a perda de guiamento dos rodados do 'bogie' dianteiro do segundo vagão da composição”.
O mesmo relatório salienta, logo em seguida, que “a perda de guiamento ocorre quando este veículo passava numa zona da via com uma anomalia no seu nivelamento transversal excedendo os limites admitidos para a circulação de comboios sem restrições”.
Além disso, “anomalias existentes num rodado” em dois dos vagões eram “impeditivas da sua utilização sem restrições”.
O GPIAAF coloca ainda em causa os procedimentos realizados nos trabalhos de manutenção.
“A investigação determinou como causa mais provável para as anomalias na geometria da via a sua deformação sob o efeito da passagem dos comboios, ocorrida após uma intervenção de manutenção realizada no dia anterior ao descarrilamento, uma vez que foi constatado que os referidos trabalhos não foram executados e verificados de forma adequada a garantir a qualidade do resultado da intervenção”, conclui o relatório.
Para a entidade, “a não realização de medições e a não observação do primeiro comboio a passar após a intervenção de manutenção corretiva, contrariando as disposições para a realização do trabalho, resultaram na impossibilidade de verificação da qualidade do suporte das travessas e da adequada geometria da via”.
O GPIAAF apontou lacunas “à formação facultada à equipa de trabalho do prestador de serviços e ao agente do gestor da infraestrutura encarregado da fiscalização e receção dos trabalhos”, dando ainda conta de que “as anomalias constatadas em veículos presentes no comboio, da mesma série daquele por onde o descarrilamento se iniciou, indicam que o regime de inspeções e manutenção a que os mesmos estão sujeitos não são inteiramente adequados”.
A chuva que ocorreu nos dias anteriores, associada “às inadequadas condições de drenagem da via persistentes no local ao longo dos anos” poderá também ter contribuído para o descarrilamento.
A investigação acrescentou ainda que “o processo de controlo do trabalho executado pelos prestadores de serviços contratados pelo gestor da infraestrutura, previsto no seu sistema de gestão da segurança, não teve a robustez necessária para evitar a deficiente fiscalização que existiu sobre a execução dos trabalhos realizados no local”.
O relatório aponta o dedo, em seguida, à fiscalização no setor.
“O facto de o Instituto da Mobilidade e dos Transportes, I.P., enquanto autoridade nacional de segurança ferroviária, no âmbito das suas obrigações de supervisão, nunca ter procedido a qualquer auditoria à aplicação dos sistemas de gestão da segurança do gestor da infraestrutura e da empresa de transporte ferroviário, também não permitiu que as debilidades referidas fossem identificadas ou objeto de melhoria”, lê-se no documento.
Também o “processo da empresa de transporte ferroviário destinado a controlar o risco de que um veículo não esteja apto a integrar um comboio e o processo da entidade responsável pela manutenção (ERM) para a monitorização do seu próprio sistema de gestão da manutenção, não tiveram a robustez adequada” para garantir a segurança dos veículos, garantiu o GPIAAF.
O acidente aconteceu no dia 1 de abril de 2017, cerca das 18:07, entre as estações de Souselas e Coimbra-B, próximo do apeadeiro de Adémia, com o descarrilamento de nove veículos de um comboio de mercadorias que transportava cimento.
Não houve danos pessoais, mas a circulação normal só se restabeleceu quatro dias depois.
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