A 23 de junho de 1916 foi publicada a lei que passou a designar as paróquias civis como freguesias. O professor de Direito Administrativo, António Cândido de Oliveira, explica que “a designação tradicional, desde o primeiro código administrativo, desde 1836, era paróquias”, embora, por vezes, alguns códigos “ora usassem paróquias, ora freguesias”. “Para distinguir as paróquias religiosas das outras chamou-se paróquias civis”, acrescenta o académico, considerando que a lei de 1916 “fez uma boa distinção entre o que é religioso e civil, porque paróquia hoje tem um sentido religioso”, apesar da designação freguesia também possuir a mesma origem etimológica.
O também diretor da revista “Questões Atuais de Direito Local” nota que “o Estado Novo não tocou na designação que foi alterada faz agora 100 anos, [antes] assumiu-a, recebeu-a, chamou freguesias e juntas de freguesia”. “É preciso haver um conceito aceitável de freguesia e, para mim, é muito claro, é uma comunidade de vizinhança”, frisou Cândido de Oliveira.
Para o catedrático jubilado da Universidade do Minho, as freguesias “não devem ser nem demasiado pequenas nem demasiado grandes”, pois a sua riqueza e importância reside enquanto “comunidade de vizinhança e porque permite resolver os problemas” das populações. “A freguesia é uma instituição nossa, mas que devemos ter orgulho nela, porque permite resolver problemas de vizinhança e estar atentos” às necessidades da comunidade, vincou, numa alusão à solução inédita do regime municipal português.
Cândido de Oliveira reconheceu que “era a favor de uma reforma, mas bem feita, calculada”, o que entende não ter acontecido com a reorganização territorial das freguesias de 2013. “Tivemos uma reforma das freguesias que não olhou para o mapa. O número médio de freguesias nos municípios a sul do Tejo é de seis”, apontou, questionando: “Como é que é possível fazer uma lei das freguesias igual para todo o país?”.
O especialista lamentou, principalmente, a ausência de critérios fundamentados na realidade das diferentes regiões, referindo como exemplo a clarividência demonstrada pela lei de 1916, que fazia depender a constituição de freguesias de um mínimo de 800 habitantes. “A reforma era necessária, porque havia freguesias que tinham menos de 100 pessoas, ora isso não é uma freguesia, é outra coisa qualquer. A freguesia é uma entidade político-administrativa, portanto tem de ter uma certa dimensão, mas a dimensão da freguesia não é a do município”, reforçou Cândido de Oliveira.
Por outro lado, em regiões do norte do país, antes da última reforma, “existiam freguesias que eram tão pequenas que não havia a possibilidade de fazer duas listas”, originando “acordos entre o PSD e o PS em que ‘tu concorres aqui e eu concorro acolá’”, contou. “Para resolver estes problemas, muitas vezes não é juntar as freguesias, é fazer plenários de cidadãos, aí já não há o problema das listas do PS, do PSD, do PCP ou de seja quem for”, defendeu o catedrático.
Já quanto à descentralização de competências, Cândido de Oliveira é da opinião que as freguesias, com as atuais atribuições, já podem assegurar os serviços essenciais às populações, nomeadamente de natureza social. “Se elas fizerem o que já podem fazer bem feito, excelente”, comentou.
A vida académica de Cândido de Oliveira, que nasceu em 1945, contribuiu para o “fortalecimento do Poder Local”, destaca-se no livro “As freguesias na organização do Estado: um património nacional”, a lançar pela Associação Nacional de Freguesias (Anafre), após a sessão solene no parlamento evocativa do centenário da lei de 1916.
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