“A ideia das políticas anti-imigração é evitar que os migrantes cheguem às costas europeias, que estejam o mais afastados possível. E tratar dos seus pedidos de asilo o mais longe possível. Assim, não terão dificuldade em expulsar as populações que não pretendem acolher”, considera, em entrevista à Lusa, Mehdi Alioua, sociólogo, professor de Ciências Políticas na Universidade Internacional de Rabat (UIR) e ativista antirracista.

“O objetivo consiste em colocar os migrantes em centros situados em países africanos e fazer uma triagem. Isso começou a acontecer na Líbia, e está a ser efetuado por mercenários pagos pela União Europeia. Há uma fronteira que se estende cada vez mais para o interior do território africano”, refere.

O académico sublinha que na Europa, onde vigora o Estado de direito, os migrantes e refugiados não podem ser expulsos de imediato e de forma compulsiva, como sucedia em Marrocos ou ainda sucede na Argélia, sob o risco de existirem condenações pelo Tribunal europeu dos direitos humanos, ou mesmo por tribunais do próprio país.

“Por exemplo, os franceses expulsam cerca de 20.000 pessoas por ano e isso custa muitíssimo caro. Primeiro é preciso que passem por um juiz, depois há o apelo, depois metê-los num avião, é caro…”, indica.

Mehdi Alioua deteta um “verdadeiro problema” nesta abordagem, e quando os países africanos diretamente envolvidos no fenómeno migratório necessitam do apoio europeu para o reforço dos direitos humanos nos seus países.

“Em Marrocos existe uma nova política migratória baseada no direito, e o apoio europeu é interessante e serve os interesses da Europa. Mas caso se apoiem os mercenários líbios surgem os mercados de escravos, como sucedeu. As pessoas que se divertiam a vender negros pela internet incluem milícias que são pagas pela Europa. E isso coloca um verdadeiro problema, muito grave, e que permanece”, assinala o académico, que na quinta-feira participou no Ciclo de Migrações a decorrer no Teatro Maria Matos, em Lisboa, com um programa de debates, fóruns e espetáculos.

“Quando existe o caos, a guerra, é o mais forte que ganha, e convém que seja alimentado. Não pode ficar forte muito tempo se não tiver balas. O dinheiro implica chantagem, os mercenários dizem, ‘deem-me armas para impedir que os migrantes entrem na vossa casa’. E depois dizem às famílias dos migrantes, ‘deem-me dinheiro senão matamo-los’. E se a família não paga, vendem-nos como escravos a outros líbios”, acrescentou.

O investigador do LePoSHS (Estudos Políticos) da UIR e corresponsável pelo projeto Movida, uma rede de observação de mobilidades, denuncia uma abordagem que pode reduzir à “escravatura moderna” milhares de pessoas.

O académico e ativista antirracista recorda que na Europa sempre existiram migrações internas num continente também construído sobre a mobilidade, e em direção a África. E que no século XX houve muita imigração europeia para o continente vizinho, e não eram colonos, antes pessoas pobres que iam em busca de trabalho como os migrantes portugueses que trabalharam nas indústrias conserveiras em Marrocos.

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