O documento, distribuído aos jornalistas, "destina-se a enquadrar as regras aplicáveis a todas as concretas coligações locais acordadas ou a acordar entre os dois partidos, a apresentar nas eleições autárquicas de 2021, podendo estender-se, de comum acordo, a outras forças partidárias".

Apesar de no final de janeiro os presidentes dos dois partidos - Rui Rio (PSD) e Francisco Rodrigues dos Santos (CDS-PP) -, terem anunciado que este acordo-quadro exclui a possibilidade de coligações com o Chega, o texto não faz essa referência.

"As próximas eleições autárquicas representam um marco importante na afirmação de um projeto mobilizador alternativo à maioria de esquerda que, desejavelmente, se venha a constituir num momento de viragem para a mudança", salientam os dois partidos no acordo, considerando que "as autárquicas têm constituído um elemento muitas das vezes coadjuvante na resolução das falhas do Estado central, contribuindo decisivamente para o desenvolvimento do país, na satisfação das aspirações e na melhoria da qualidade de vida dos cidadãos".

O acordo foi assinado hoje, num hotel de Lisboa, entre o secretário-geral e coordenador autárquico do PSD, José Silvano, o secretário-geral do do CDS-PP, Francisco Tavares, e o coordenador autárquico centrista, Fernando Barbosa, com a presença dos líderes dos dois partidos.

Tomando a palavra Francisco Rodrigues dos Santos, o líder dos centristas replicou algumas das ideias presentes no documento, nomeadamente que as "autarquias se vêem sistematicamente obrigadas a corrigir as falhas e as omissões do governo socialista" e que, com os desafios da pandemia e da crise económica por si provocada, "é por isso que as próximas eleições autárquicas são fundamentais".

"Portugal precisa de uma alternativa saudável e forte ao Partido Socialista e de uma oposição à sua hegemonia no poder local”, atirou o presidente do CDS-PP.

Já Rui Rio admitiu que as autárquicas poderão “ter ou não” uma leitura nacional e considerou que foram exceções as vezes em que eleições locais derrubaram primeiros-ministros, como aconteceu com Francisco Pinto Balsemão e António Guterres.

“São situações absolutamente extraordinárias, em que eleições autárquicas foram a gota que encheu o copo. Pode acontecer que estas autárquicas tenham leitura nacional e pode acontecer que não tenham, só com os resultados se pode ver”, disse.

Ainda assim, Rio deixou uma certeza: “Neste momento, há condições para o PSD sozinho, o CDS sozinho, e os dois em coligação conquistarmos bastantes mais câmaras do que aquelas que temos neste momento”, disse.

O líder do PSD admitiu, contudo, que o objetivo, por enquanto, é “enfraquecer esta quase hegemonia do PS no poder autárquico”, dizendo ser quase impossível inverter numa eleição o atual equilíbrio (o PS tem 160 câmaras, o PSD 98 e o CDS seis).

Já Francisco Rodrigues dos Santos, admitiu que os eleitores “descontentes e fatigados” possam nas próximas autárquicas apresentar “um cartão amarelo ou mesmo vermelho ao PS”.

“A nossa ambição é compor esta maioria alternativa capaz de dar um sinal ao país de que o ciclo da geringonça está encerrado e se pode abrir um ciclo de novos protagonistas”, disse.

Os dois líderes foram questionados, por várias vezes, sobre possíveis consequências das autárquicas para as respetivas lideranças.

“Só na segunda-feira a seguir às eleições é que podemos tirar uma conclusão se o que foi o resultado satisfaz ou não os objetivos (…) Eu há quatro anos que digo, e hoje digo a mesma coisa, que as eleições autárquicas são muito importantes para o PSD, é óbvia a responsabilidade que tenho e é óbvio que cada vez que um partido vai a eleições os resultados podem determinar ou não a continuidade de presidentes”, disse.

Francisco Rodrigues dos Santos considerou, a nível interno, que ele e Rui Rio têm tido percursos semelhantes, com oposição constante dentro dos respetivos partidos, mas antevê um desfecho positivo para ambos.

“Atrevo-me a dizer que aqueles que esperam que as autárquicas sejam um ponto final nas nossas lideranças também não vão conseguir”, afirmou o líder do CDS-PP.

Numa sessão com quase meia hora dedicada a perguntas, os presidentes do PSD e do CDS-PP frisaram, por várias vezes, que os dois partidos já governam na Região Autónoma da Madeira e, em conjunto com o PPM, também na dos Açores.

“A aliança com o CDS que hoje aqui assinamos é já uma tradição da democracia portuguesa”, afirmou Rio, que não quis comprometer-se com o número de coligações que poderão ser celebradas entre os dois partidos.

Francisco Rodrigues dos Santos salientou que este acordo é celebrado pela “direita que quer somar e não dividir”, deixando em aberto se poderá ser replicado em legislativas, tema que Rio se escusou a abordar.

“O futuro está em aberto”, disse o líder do CDS-PP, acrescentando ter uma “expectativa otimista” de derrotar a esquerda e extrema-esquerda “em muitos concelhos”.

Questionado sobre a especial atenção dada ao rigor financeiro no acordo hoje assinado, Rui Rio deixou um aviso não só dirigido às coligações com o CDS-PP, mas também aos candidatos do PSD.

“Vamos ser implacáveis: há um orçamento de uma concelhia aprovado, nós cobrimos esse orçamento ainda que o resultado possa ser mais fraco. Mas, quando acontecer o que acontece muitas vezes, que é passarem para lá do orçamento e autorizem o que não devem, tudo faremos para que paguem do seu bolso”, disse, considerando que é possível vencer eleições “de forma séria e cumprindo os orçamentos”.

Já o líder do CDS-PP preferiu apontar baterias para fora em matéria de rigor financeiro.

“Não podemos exigir ao PS que tenha contas certas se depois praticarmos o socialismo dentro das nossas casas”, afirmou.

O que diz o texto? Acordo impõe regras rígidas para despesas e campanhas locais

O texto destaca igualmente que "a existência de significativos pontos de convergência de que resultam um conjunto de propostas de coligação, desejadas pelos órgãos competentes dos dois partidos, refletem o sentimento e a vontade dos eleitores" e refere que "importa prosseguir o esforço de dignificação e valorização do trabalho dos eleitos locais fazendo interessar novos valores e novos protagonistas no trabalho autárquico".

O acordo-quadro estipula ainda que "todas as coligações locais acordadas deverão reproduzir e respeitar as regras aqui estabelecidas, em particular, mas não exclusivamente, no que respeita às questões financeiras da campanha".

PSD e CDS-PP referem ainda ser "historicamente reconhecedores da importância do poder local na gestão dos interesses locais das populações", que "constitui um espaço próprio da democracia portuguesa e uma forma de expressão da descentralização do poder do Estado" e "traduz uma forma inegável de proximidade entre eleitos e eleitores".

Em relação há quatro anos, quando os dois partidos assinaram igualmente um acordo-quadro para enquadrar as regas das coligações locais nas autárquicas, o texto cresceu de cinco para 11 páginas e as diferenças prendem-se, sobretudo, com um maior controlo das despesas locais por parte das direções nacionais.

As despesas de campanha voltarão a ser repartidas numa base de 80% pelo partido que lidera a coligação e 20% para o outro, mas o acordo deste ano acrescenta, como novidade, a mesma lógica para a repartição de eventuais prejuízos.

No acordo hoje assinado pelos secretários-gerais dos dois partidos, José Silvano (PSD) e Francisco Tavares (CDS-PP), e pelo coordenador autárquico do CDS-PP, Fernando Barbosa, as duas partes asseguram que “tudo farão para assegurar o princípio da boa gestão dos recursos financeiros, introduzindo cortes na despesa autorizada, face ao histórico de anteriores eleições, e assegurando o princípio do ‘bom pagador’ a prestadores de serviços ou fornecedores de bens”.

No texto, PSD e CDS-PP acordaram que o mandatário da lista e o mandatário financeiro da coligação “será da responsabilidade do partido que indicar o cabeça de lista à Câmara Municipal”.

O acordo torna ainda claro que só o mandatário nacional ou local poderão assumir gastos com a campanha, “não assumindo os partidos a responsabilidade por despesa contratada por terceiros”.

Segundo o texto, cabe ao partido liderante da coligação apresentar ao outro uma proposta de orçamento de campanha, com um “limite máximo” de despesa autorizada, que tem de ser cumprido pelas estruturas locais, salvo autorização das estruturas nacionais.

“A autorização da despesa de campanha depende obrigatoriamente da intervenção expressa do mandatário financeiro nacional do partido que lidera a coligação ou do mandatário local nos termos impostos a este por aquele”, salienta-se no texto.

O acordo frise que “nenhuma despesa pode ser assumida sem o conhecimento do mandatário financeiro local ou, em último caso, do mandatário financeiro nacional”, avisando que quem não se adeque ao estipulado neste texto “responde civil e disciplinarmente”.

No caso de despesas consideradas ‘especiais’, como outdoors, brindes ou sondagens ou estudos de opinião das campanhas, PSD e CDS-PP concordam que sejam “especialmente controladas pelo mandatário financeiro nacional do partido que lidera a coligação”.

“Através do mandatário financeiro local, as candidaturas deverão submeter à aprovação do mandatário financeiro nacional do partido que lidera a coligação os eventos relacionados com jantares de campanha com mais de 50 pessoas, sem prejuízo de estes serem preferencialmente descontinuados”, precisa o acordo.

Depois de recebida a subvenção com base nos resultados eleitorais, os dois partidos asseguram primeiro “o pagamento integral das despesas de campanha, independentemente da percentagem dos adiantamentos realizados por cada partido” .

“Na eventualidade de uma candidatura de coligação vir a apurar um resultado líquido de campanha negativo, os dois partidos partilharão esse prejuízo na proporção do valor com que tenham definido os adiantamentos”, afirma-se.

O acordo estipula ainda que o mandatário financeiro nacional do partido liderante da coligação “deverá figurar em todas as contas de campanha como autorizado a movimentá-las” e que “o mandatário financeiro local não poderá movimentar sozinho a conta bancária de campanha”.

PSD e CDS-PP comprometem-se ainda a divulgar nos sites dos dois partidos “uma listagem com o nome dos mandatários financeiros e o limite de despesa que estes podem autorizar”, atualizada até ao dia das eleições.

O acordo regula ainda a apresentação dos candidatos, que será da responsabilidade do partido que indicar o cabeça de lista à Câmara Municipal.

“No ato de cada apresentação de candidaturas, os dois partidos deverão estar representados por dirigentes nacionais, e ambos os partidos usarão da palavra”, defende-se, acrescentando que “a data e o respetivo programa deverão ser acordados previamente pelos dois partidos”.

PSD e CDS-PP comprometem-se ainda “a aplicar escrupulosamente a Lei da Paridade”.

“Será constituída uma comissão ‘ad-hoc’ a nível nacional, composta por elementos a indicar por ambos os Partidos, destinada a recolher todos os elementos e documentos necessários, ao completo preenchimento dos requisitos respeitantes ao processo de legalização das coligações acordadas”, refere-se.

O acordo determina ainda que quaisquer conflitos serão resolvidas pelas Comissões Coordenadoras Autárquicas dos dois Partidos.

Em 2017, PSD e CDS-PP concorreram coligados em 112 municípios, sendo, por enquanto, impossível prever qual será o número este ano, uma vez que tal dependerá da vontade das estruturas locais.

O PSD já anunciou 153 candidatos a Câmaras Municipais, enquanto a direção nacional do CDS-PP ainda não formalizou nenhum, mas já está certa uma candidatura conjunta a Lisboa, encabeçada pelo social-democrata Carlos Moedas.

Em 2017, o PSD teve o seu pior resultado autárquico (e que levou à demissão do então presidente Pedro Passos Coelho): os sociais-democratas perderam oito câmaras em relação a 2013 e viram o PS reforçar a liderança autárquica, que passou a liderar 161 câmaras por todo o país (mais 11 que em 2013), 159 sozinho e duas em coligação.

Os sociais-democratas conseguiram há quatro anos 98 presidências (79 sozinhos e 19 em coligação), embora sem grandes variações em termos de votos e percentagens em relação a 2013, tendo somado, sozinho, 16,08% dos votos (em 2013 foram 16,70%).

Já o CDS-PP conquistou em 01 de outubro de 2017 mais uma câmara do que em 2013, ficando com seis autarquias, apesar de ter descido em número de votos (em 2013 conseguiu 152.006 votos e em 2017 apenas para 134.311).

De acordo com a lei, as autárquicas realizam-se entre 22 de setembro e 14 de outubro do ano correspondente ao termo do mandato e são marcadas por decreto do Governo com, pelo menos, 80 dias de antecedência.

O PSD já entregou um projeto-lei para adiar - excecionalmente devido à pandemia de covid-19 - este ato eleitoral por dois meses (entre 22 de novembro e 14 de dezembro), uma iniciativa que será debatida e votada no parlamento em 25 de março, mas que não deverá recolher apoio maioritário.