Na Bolívia, o candidato da oposição, Carlos Mesa, declarou ontem que continuará a promover os protestos de rua até obter a anulação das eleições de 20 de outubro, que reelegeram o presidente Evo Morales.

"Vamos seguir em frente com as mobilizações democráticas e pacíficas", disse Mesa numa concentração realizada numa avenida no sul da capital do país, La Paz. "A prisão ou a presidência", proclamou.

Mesa destacou ainda como "exemplo a valentia" da participação de milhares de bolivianos nos protestos, principalmente jovens. "Este é um caminho sem volta, da conquista democrática, da conquista do voto, da conquista da liberdade", declarou o candidato entre gritos de apoio de seus partidários, tendo ao seu lado o empresário centrista Samuel Doria Medina, derrotado por Morales nas eleições de 2005 e 2009.

"Atitude golpista para ignorar o voto do povo"

Os protestos da oposição foram qualificados pelo vice-presidente boliviano, Álvaro García, de "atitude golpista para ignorar o voto do povo".

"Ele (Mesa) é o responsável, ele é o culpado" pela violência, por não aceitar a sua derrota nas urnas, insistiu García Linera, reeleito com Morales.

Mesa respondeu a García: "estamos aqui firmes, a prisão ou a presidência do país".

"A comunidade internacional tem visto o que estamos vivendo desde 20 de outubro, uma fraude vulgar" eleitoral, sublinhou Mesa.

No poder desde 2006, Morales ganhou a primeira volta das eleições de 20 de outubro, com 47,08% dos votos, contra 36,51 para Carlos Mesa, devido à vantagem de 10 pontos.

Confrontos provocam 30 feridos

Estas declarações surgem com o país dividido. Cerca de 30 pessoas ficaram feridas nesta segunda-feira em confrontos entre partidários de Mesa e apoiantes de Morales, na cidade de Santa Cruz.

A ministra da Saúde, Gabriela Montaño, adiantou, na rede social Twitter, que um homem de 35 anos estava a ser tratado no hospital da cidade de Santa Cruz, na parte oriental do país, a “um ferimento por projétil no abdómen”, o qual estava “em estado crítico”.

Há ainda relatos não confirmados de uma morte, avançados pelo vice-presidente do Comité Cívico de Santa Cruz, Romulo Calvo, em conferência de imprensa. Calvo confirmou a existência de pelo menos 30 feridos, um dos quais “por bala” e outro agredido por uma arma perfurante.

Também ocorreram confrontos em La Paz e Cochabamba (centro), com o registo de feridos, segundo a imprensa local.

O bairro de 'Plano Três Mil', em Santa Cruz, a cidade mais próspera da Bolívia e base da oposição, foi o epicentro de violentos choques - com paus e pedras - devido a um piquete contra a reeleição de Morales para um quarto mandato obtido após um apuramento sob suspeita.

Em Cochabamba, que também está em greve e há piquetes, os incidentes deixaram quatro feridos, segundo o jornal Opinión.

Em La Paz, onde ruas foram bloqueadas, ocorreram choques entre opositores e mineiros ligados ao governo, que detonaram bananas de dinamite, causando medo entre a população.

Um opositor ficou ferido ao ser agredido por partidários de Morales, segundo imagens da TV local.

No bairro de Achumani, no sul da cidade, manifestantes fecharam a avenida principal, mas os motoristas de autocarro tentaram reabrir o trânsito e os dois grupos entraram em confronto, com agressões e pedras. A polícia lançou bombas de gás lacrimogéneo para dispersá-los.

As manifestações em La Paz acontecem nos bairros de classe média e alta da zona sul, embora diariamente milhares de pessoas, entre eles muitos jovens, protestem nos arredores do Tribunal Supremo Eleitoral (TSE) e realizam encontros na praça San Francisco, no centro da cidade.

Em outras cidades, como em Potosí (sudoeste), Sucre (sudeste), Tarija (sul) e Trinidad (nordeste), também ocorreram bloqueios de ruas e estradas.

Face ao ataque da oposição, Morales denunciou que "distintos setores sociais (...) se preparam para dar um golpe de Estado" esta semana.

Morales, de 60 anos, recebeu o apoio de um poderoso sindicato de trabalhadores rurais, que anunciou que bloqueará as estradas do país "contra o golpe de Estado, em defesa da democracia e em defesa do voto indígena".

Até agora, trabalhadores rurais bloquearam apenas a estrada entre Santa Cruz e Yapacani, município rural de 26.000 habitantes.

Vitória ou fraude?

A Bolívia está a viver protestos continuados desde que a oposição política e outros movimentos denunciaram o que dizem ser uma fraude eleitoral nas eleições presidenciais a favor do presidente Evo Morales, dado como vencedor pelo organismo eleitoral.

Os resultados definitivos deram Morales como vencedor, com 47,8% dos votos, que assim derrotava Carlos Mesa, creditado com 36,51%.

Esta diferença superior a 10 pontos percentuais (10,57) é suficiente para o mandatário ganhar à primeira volta.

A lei eleitoral exige 50% dos votos mais um ou 40% com 10 pontos de vantagem sobre o segundo pata vencer na primeira volta.

Carlos Mesa declarou esta segunda-feira, numa concentração na capital,  que não se vai render até que termine na prisão ou na Presidência.

A concentração em que é esperada a presença de Evo Morales está prevista mais para a noite (horas locais) na cidade de El Alto, vizinha de La Paz.