Segundo a Folha de S. Paulo, a decisão da juíza foi provocada por um apelo da Defensoria Pública dos Direitos do Cidadão, que "que alegou risco de afronta à memória e à verdade, além do emprego irregular de recursos públicos nos eventos", identificando as comemorações do golpe como uma apologia de práticas de atrocidades em massa.
A magistrada de Brasília argumentou na sua decisão, de caráter cautelar, que a iniciativa de Bolsonaro "não é compatível com o processo de reconstrução democrática promovida pela Assembleia Nacional Constituinte de 1987 e pela Constituição Federal de 1988", e que as datas comemorativas devem ser aprovadas pelo Congresso.
"Após anos de combates político-ideológicos de resistência democrática e reconquista do Estado de direito, culminados na promulgação da Constituição Federal de 1998, espera-se concórdia, serenidade e equilíbrio das instituições", escreveu a juíza.
Bolsonaro, um capitão da reserva do Exército que durante a sua carreira como deputado exaltou a ditadura em diversas ocasiões, voltou a reavivar a polémica ao pedir aos quartéis "as comemorações devidas" pelo 55º aniversário do levantamento militar de 31 de março de 1964, que derrubou o presidente João Goulart.
Durante o período em que foi deputado federal, Jair Bolsonaro sempre defendeu que o Brasil não viveu uma ditadura entre 1964 e 1985, mas sim um “regime com autoridade”, segundo o portal de notícias G1.
Bolsonaro chegou ainda a homenagear em plenário o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, reconhecido pela Justiça de São Paulo como torturador durante o regime militar.
Para o atual chefe de Estado do Brasil, Ustra é um “herói brasileiro”.
Mas perante a polémica, o Presidente do Brasil alterou a sua declaração, destacando que não se trata de "comemorar, mas lembrar" e de "rever o que está errado, o que está certo e usar isso para o bem do Brasil no futuro".
A decisão judicial pode não ter qualquer efeito prático, já que muitas unidades militares anteciparam as suas comemorações, pelo que parece, não há atos previstos nos quartéis no domingo.
Um trecho da ordem do dia lido nesta sexta-feira num ato militar em Brasília destaca que "as Forças Armadas participam na história da nossa gente, sempre alinhadas com as suas legítimas aspirações. O 31 de março de 1964 foi um episódio simbólico dessa identificação".
O Comando Militar do Sudeste, em São Paulo, também celebrou, na quinta-feira, o aniversário do golpe afirmando que as Forças Armadas responderam ao "clamor" popular para deter a escalada para o "totalitarismo".
O golpe militar que depôs o então Presidente brasileiro João Goulart ocorreu em 31 de março de 1964, iniciando-se depois a ditadura no país que durou 21 anos.
Durante esse período, não houve eleição direta para o cargo de Presidente, o Congresso Nacional foi fechado e a imprensa local censurada.
“O nosso Presidente já determinou ao Ministério da Defesa que faça as comemorações devidas em relação a 31 de março de 1964, incluindo uma ordem do dia [mensagem oficial], patrocinada pelo Ministério da Defesa, que já foi aprovada pelo chefe de Estado”, afirmou Rêgo Barros, porta-voz do governo, na passada terça-feira, em Brasília.
De acordo com um relatório da Comissão Nacional da Verdade publicado em 2014 - a versão oficial do Estado brasileiro sobre o período - os "anos de chumbo" deixaram pelo menos 434 mortos e desaparecidos, um número de vítimas consideravelmente mais baixo do que em outros países latino-americanos, como Chile (3.200) ou Argentina (30.000, segundo organizações da sociedade civil).
Mas ao contrário dos seus vizinhos, o Brasil não levou à Justiça os agentes do Estado acusados de cometer crimes durante a ditadura, devido a uma lei de amnistia de 1979.
*com agências
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