Durante o seu encontro com os governadores, realizado num hotel de São Paulo, Lula propôs também a recriação do Ministério da Segurança Pública, a criação de uma Universidade especializada nesta área, a unificação do sistema de Segurança Pública e a promoção da cooperação entre países vizinhos para combater o tráfico de droga e o contrabando de armas.

O antigo sindicalista também acenou às forças de segurança pública, uma das principais bases eleitorais de Bolsonaro em 2018, e propôs o reforço da Polícia Federal, durante uma entrevista horas antes com uma estação de rádio local em Manaus, capital do estado do Amazonas.

Lula, favorito nas sondagens para as eleições presidenciais de outubro, discutiu com um grupo de governadores algumas das principais linhas da sua política de segurança pública e salientou que, se regressar à presidência, “retomará” o Estatuto do Desarmamento.

O estatuto, aprovado em 2003, durante o primeiro ano do seu mandato (2003-2010), foi aprovado num plebiscito popular em 2005, que rejeitou a proibição da venda de armas no país, mas restringiu o seu porte, encorajando ao mesmo tempo o desarmamento da população civil.

Contudo, o estatuto tem sido flexibilizado nos últimos anos pelo Presidente brasileiro, Jair Bolsonaro, que teve, em 2018, durante a sua primeira campanha presidencial, a liberalização do uso de armas como uma das suas principais políticas.

Sob o lema de que a “população armada não será escravizada”, o Bolsonaro encorajou o acesso civil às armas e prometeu que, se for reeleito, tornará ainda mais fácil para os civis transportá-las, num modelo próximo ao adotado nos Estados Unidos.

Bolsonaro, capitão da reserva militar, associou a redução de 6,5% nos assassinatos no Brasil em 2021 – o seu nível mais baixo em dez anos – ao aumento do porte de armas, uma tese que tem sido refutada categoricamente por especialistas na área da segurança pública.

Os dados disponibilizados pelo Exército e pela Polícia Federal brasileiros, compilados pelo Instituto Sou da Paz e partilhados à Lusa no final de junho, são demonstrativos de um aumento exponencial da compra de armas desde que Bolsonaro tomou posse a 01 de janeiro de 2019.

Em 2018, a quantidade de armas no poder de caçadores, atiradores e colecionadores (CAC) era de 350.683. Em 2019 esse valor saltou 24% para 433.246, em 2020 para 569.748 e até novembro de 2021 aumentou mais de 100.000 para 794.958. Cada CAC pode ter até 60 armas.

As autorizações emitidas para novos registos de CAC também dispararam: se em 2018 houve 87.989 novos registos, esse número cresceu para mais de 147 mil novas entradas em 2019, 218 mil em 2020 e, só no primeiro semestre de 2021, quase 165 mil.

“Temos visto uma entrada recorde de novas armas em circulação”, afirmou à Lusa, em junho, a diretora do Instituto Sou da Paz, Carolina Ricardo, acrescentando que “uma percentagem bastante grande das armas que são usadas no crime corresponde a armas nacionais, fabricadas aqui, vendidas aqui, legais”.

“As armas legais têm um papel no mercado ilegal”, um problema ainda mais sério quando se aumenta “a fonte de armas legais, que é o que tem feito este Governo”, disse.

Se se somar o número de armas compradas pelos CAC, armas particulares de militares e armas ativas para defesa pessoal constata-se uma forte subida, sustentada, nos últimos três anos.

Em 2018 eram 1.320.582, mas a partir daí os números sobem: em 2019, primeiro ano do mandato de Bolsonaro, 1.509.459 (+14%), no ano seguinte, verifica-se um aumento de 20% e o número de armas cifra-se em 1.817.073. Por fim, até novembro de 2021, o número de armas é já 2.344.882, segundo os dados oficiais compilados pelo instituto.

O Instituto Sou Pela Paz registou, desde o início do mandato de Bolsonaro, em 2019, pelo menos 40 normas, entre decretos, portarias, instruções normativas para facilitar o acesso às armas.