Sem direito a perguntas, foram apenas prestadas declarações numa conferência de imprensa que teve lugar no jardim de São Bento. Primeiro falou o Bastonário e só depois o Chefe do Governo. Miguel Guimarães falou em "confiança" e "respeito", o governante deixou votos para que tenha ficado tudo sanado entre ambos, ao aferir que esperava que "todos os mal-entendidos" tivessem ficado esclarecidos.

"O primeiro ministro transmitiu de forma clara aquilo que é o respeito e a confiança que tem pelos médicos portugueses, aquilo que espera dos médicos nesta época e sempre. Deixou uma palavra ao representante da Ordem dos Médicos daquilo que é a valorização do trabalho destes profissionais", comentou Miguel Guimarães, ao passo que Costa aproveitou para agradecer o momento para prestar esclarecimentos em torno de toda uma polémica que teve origem em meros sete segundos.

"Agradeço ao senhor bastonário [da Ordem dos Médicos] a oportunidade e a franqueza desta conversa. Espero que todos os mal-entendidos estejam esclarecidos. E fico particularmente reconhecido pela forma como aqui testemunhou, de forma inequívoca, o meu apreço e consideração pelos médicos portugueses e pelo trabalho que desenvolvem", explicou o primeiro-ministro, sem esquecer o tema que esteve na origem da reunião.

"Tive a oportunidade de informar e esclarecer mais em pormenor o senhor bastonário [da Ordem dos Médicos] sobre a forma como o Estado desde junho tomou conhecimento, agiu e reagiu perante a situação em concreto que ocorreu no lar de Reguengos. Fico particularmente satisfeito por o senhor bastonário poder sair daqui - espero - sem a menor dúvida sobre a enorme consideração e apreço que tenho pelos médicos, pelo seu trabalho, assim como tenho pela generalidade dos profissionais de saúde", declarou António Costa.

O chefe do executivo explicou ainda que a conversa entre ambos foi "muito franca e útil".

"[A conversa] serviu para trocarmos informações sobre aquilo que tem sido o Estado e do Serviço Nacional de Saúde para responder a esta situação desta pandemia. Mereceu natural atenção aquilo que diz respeito aos lares. Esta é uma realidade conhecida e que não é nova", vincou o primeiro-ministro.

Sobre a polémica em torno da atuação no lar de Reguengos de Monsaraz, Miguel Guimarães evitou alongar-se em comentários, ao explicar apenas que "a situação está entregue às autoridades competentes, nomeadamente ao Ministério Público e à Inspeção-Geral das Atividades em Saúde".

Por seu turno, sem mencionar que estava a falar sobre a situação do lar de Reguengos — falou em "casos concretos" —, o chefe do Governo deu uma resposta muito semelhante, ao dizer que "as autoridades competentes apurarão responsabilidades com a informação" que já está disponível.

"Não podemos nunca confundir as árvores com as florestas"

O líder do executivo salientou ainda que "uma das prioridades" da reforma do serviço nacional de saúde passa pelo desenvolvimento da rede de "cuidados integrados e da assistência domiciliária", indicando que necessário "olhar coletivamente" para este problema.

"Um idoso internado numa residência ou num lar não deixa de ser um cidadão português. Portanto, com direito à assistência à saude, designadamente por parte dos seus médicos de família e por parte do serviço nacional de saúde", disse António Costa, concluído que devido à demografia portuguesa este assunto é merecedor de um debate.

O primeiro-ministro enalteceu o esforço que o Estado tem feito desde o início da pandemia para reforçar "as condições financeiras e humanas" de modo a que as IPSS, misericórdias e mutualidades façam um melhor trabalho. Todavia, numa alusão indireta ao surto de covid-19 num lar de Reguengos Monsaraz.enfatizou que "não podemos nunca confundir as árvores com as florestas. Seja nos lares, seja na atuação do médico, seja na atuação do Estado", reiterou.

"As prioridades do Governo passam pelo desenvolvimento da rede de cuidados continuados integrados e pelo desenvolvimento dos programas de assistência domiciliária para diminuir o grau de institucionalização", acrescentou.

No final da sua declaração, tendo ao seu lado Miguel Guimarães, o primeiro-ministro reforçou esta mensagem: "Temos de trabalhar mais em equipa para garantir a todos os cidadãos, seja os que residem nas suas casas, sejam os que residem nos lares ou em outro espaço, os melhores cuidados possíveis - e, para isso, nenhum de nós será pouco".

Segunda vaga e questão da gripe sazonal

Antes, no início da sua intervenção, Miguel Guimarães, enalteceu os médicos que prestaram cuidados no Lar da Fundação Maria Inácia Vogado Perdigão Silva.

"Gostaria também de deixar uma mensagem de forte solidariedade para os médicos que estiveram a trabalhar no lar de Reguengos de Monsaraz, que, mesmo não tendo as condições mais adequadas, não deixaram de estar presentes e fizeram um trabalho magnífico", frisou, em contraste com as críticas de recusa de auxílio aos utentes.

Paralelamente, o bastonário deixou ainda um alerta sobre o período de outono-inverno e os "desafios" que a pandemia de covid-19 vem colocar sobre a resposta de um setor que nesta época já costuma enfrentar a questão da gripe sazonal.

"Não sabemos se vamos ou não ter uma segunda onda, mas temos de contar com essa situação e preveni-la; temos de recuperar os doentes não-covid, que ficaram para trás no período em que a pandemia teve uma força grande no país; temos de ter em atenção a gripe sazonal – embora julgue que, se as pessoas respeitarem as regras, vai ter menos impacto este ano; e temos de contar com a proteção às pessoas mais desprotegidas, concretamente, nos lares", notou.

Na perspetiva de António Costa, "é fundamental não baixar a guarda".

"Temos de nos preparar para o pior. Desejamos, naturalmente, que não haja segunda vaga da covid-19, mas temos de nos preparar para o risco da segunda vaga. Desejamos que haja vacina, mas temos de nos preparar para a possibilidade de a vacina não chegar tão depressa", referiu.

"Exige-se que, da parte de todas entidades, Estado ou associações públicas como a Ordem dos Médicos, ou ainda instituições da economia social, se faça um enorme esforço de trabalho em conjunto. Não há um mundo sem falhas. E, perante as falhas, mais do que atirar pedras, mais do que apontar o dedo, devemos procurar responder em concreto às realidades que existem", acrescentou.

(Notícia atualizada às 14:17)