O regresso à normalidade está tão distante quanto a chegada aos mercados de uma vacina capaz de combater o SARS-CoV-2, o novo coronavírus responsável pela pandemia mundial que vivemos. Confinados aos nossos lares, distantes dos outros, em países a funcionar a meio gás, sabemos que a vacina não deverá chegar antes do início do verão de 2021. Isto nas melhores hipóteses. Até lá, procura-se um medicamento que seja terapia eficaz e comprovada no combate à Covid-19 como foi, por exemplo, o Tamiflu no surto de Gripe A em 2010/11, e procura-se um novo normal que salvaguarde a economia e alivie os impactos negativos na sociedade ao mesmo tempo que se procura manter as tendências de alívio das curvas dos vários países da Europa, o continente mais afetado pela pandemia nas últimas semanas, à medida que o surto começa a assumir proporções enormes do outro lado do Atlântico, no continente americano, onde, à cabeça, os Estados Unidos contabilizam mais de 394 mil casos de infeção e mais de 12 mil mortes.

Curiosamente, Donald Trump foi um dos primeiros líderes ocidentais a reclamar esse regresso à normalidade quando no dia 24 de março disse que gostaria de ver o país voltar ao normal, com as igrejas “cheias, a transbordar”, até 12 de abril, domingo de Páscoa.

Principais medidas

  • Obrigatoriedade do uso de máscara
  • Reabertura faseada das escolas, comércio e serviços
  • Testes à imunidade de grupo
  • Levantamento de algumas restrições no que toca às deslocações dentro dos países e ao estrangeiro
  • Isolamento da população infetada

“Isto tem sido muito doloroso para o nosso país e destabilizou-nos muito. Temos de voltar ao trabalho”, disse o presidente norte-americano numa altura em que o país registava 44 mil casos de infeção e 544 óbitos.

Hoje, os Estados Unidos estão ainda longe de poder começar a delinear a nova normalidade, balanceada entre a necessidade voltar a fazer a economia funcionar e evitar um novo surto de dimensão tal que sobrecarregue os sistemas nacionais de saúde. No entanto, há outras zonas do mundo que já o começaram a fazer. Na China, o país onde surgiu o SARS-CoV-2, tem vindo, gradualmente, a levantar as medidas restritivas impostas para conter o surto e que tem permitido, por exemplo, que Wuhan, cidade industrial onde tudo começou, aos poucos volte a funcionar. O comércio reabriu no final de março, no dia 30, e esta quarta-feira é levantado o cordão sanitário que fechou a cidade ao resto do país, passando os cidadãos a serem monitorizados através de uma aplicação para telemóvel.

Na Europa, Áustria e a Dinamarca lideram o caminho da retoma da normalidade, mas países como a Noruega e outros mais fustigados pela pandemia, como é o caso de Itália e Espanha, começam a delinear conjuntos de medidas para depois da estabilização da curva voltarem a colocar o país a funcionar. Além disso, neste caminho surge outro tema, discutido, principalmente, na Alemanha e no Reino Unido, mas um pouco por todos os países, os certificados de imunidade - uma espécie de passaporte que comprove que um paciente infetado com o novo coronavírus já desenvolveu os anticorpos necessários contra a doença e que pode assim regressar ao seu quotidiano. No que toca a Portugal, o alívio de medidas restritivas parece que não irá acontecer antes do final do mês de abril. Este é o guia sobre como os países europeus estão a traçar o novo normal.

Áustria impõe uso de máscaras e autoriza reabertura de estabelecimentos comerciais na próxima semana

créditos: HELMUT FOHRINGER / APA / AFP

Na segunda-feira, Sebastian Kurz, chanceler austríaco, anunciou que o país vai, por etapas, começar a suavizar as medidas restritivas por forma a regressar a uma dia a dia mais próximo do da normalidade. A primeira dessas etapas é a 14 de abril, data a partir da qual os estabelecimentos comerciais com menos de 400 metros quadrados podem reabrir ao público. Esta reabertura implica, no entanto, uma série de medidas rigorosas que pretendem minimizar as hipóteses de contágio e as quais incluem o controlo do número de clientes presentes dentro da loja - uma pessoa por cada 20 metros quadrados -, desinfeção dos espaços e a obrigatoriedade do uso de máscara, quer por parte dos trabalhadores como por parte dos clientes.

Os estabelecimentos de maior dimensão, assim como os centros comerciais, reabrirão na segunda etapa, apontada para o primeiro dia do mês de maio. Já serviços como hotéis, restaurantes ou cabeleireiros só poderão reabrir a meio do próximo mês, estando sujeitos ao cumprimento de medidas de cuidados especiais, sobretudo no que toca à higienização dos espaços.

Grandes eventos públicos continuam proibidos pelo menos até ao final de junho e não há data prevista para a reabertura de cinemas e teatros, piscinas, recintos desportivos e ginásios.

No que toca ao ensino, os exames finais universitários e do ensino secundário serão realizados, mas as escolas permanecerão encerradas até meados de maio, em data que será anunciada no final de abril, e as universidades manterão as aulas à distância até ao final do ano letivo.

Mantém-se em vigor o apelo aos cidadãos para limitarem as deslocações ao estritamente necessário, como trabalhar, comprar alimentos ou prestar assistência a pessoas vulneráveis.

A partir da próxima semana, será obrigatório usar máscara nos transportes públicos e no interior das lojas, estando prevista uma multa de 50 euros para quem não respeitar a obrigação.

A Áustria contabiliza 12.639 casos de infeção por Covid-19 e regista 243 óbitos.

Dinamarca reabre escolas na próxima semana

créditos: Philip Davali/EPA

A primeira-ministra dinamarquesa, Mette Frederiksen, anunciou na segunda-feira a reabertura progressiva de creches e escolas primárias a 15 de abril e as dos níveis de ensino seguintes, incluindo o secundário, a 10 de maio.

Os exames finais do secundário não se vão realizar, dependendo as classificações dos alunos da avaliação contínua.

Restaurantes, cafés, bares, cabeleireiros, casas de massagens, centros comerciais e discotecas continuam encerrados e as concentrações de mais de 10 pessoas proibidas.

Igrejas, bibliotecas e recintos desportivos permanecem fechados pelo menos até 10 de maio. O encerramento de fronteiras também se mantém e as viagens ao estrangeiro continuam a ser desaconselhadas.

A Dinamarca regista 5.071 casos de infeção e 203 mortes.

Noruega. Com a pandemia "sob controlo", o regresso à normalidade começa no final de abril

créditos: Heiko Junge/EPA

Erna Solberg, a primeira-ministra norueguesa, anunciou esta terça-feira um alívio progressivo das restrições a partir de 20 de abril, um dia depois de o ministro da Saúde, Bent Hoie, ter anunciado que a epidemia está “sob controlo” no país.

A partir dessa data reabrem creches e consultórios de atividades como a fisioterapia ou psicologia e é levantada a proibição de deslocações a casas de férias ou de fim de semana.

Numa segunda etapa, com início a 27 de abril, vão voltar a funcionar, parcialmente, os estabelecimentos escolares, incluindo universidades, assim como cabeleireiros e clínicas de massagens e tratamentos dermatológicos.

Mantêm-se em vigor a proibição de eventos culturais e desportivos, o fecho de fronteiras, as medidas de quarentena e autoisolamento, o teletrabalho sempre que é possível, e o encerramento de restaurantes, cafés e bares.

Segundo números oficiais, a Noruega regista 5.953 casos e 89 mortes.

República Checa considera atenuação de medidas de contenção um "teste"

créditos: MARTIN DIVISEK/EPA

O vice-primeiro-ministro checo, Karel Havlicek, anunciou na segunda-feira a atenuação gradual de algumas das medidas de contenção, encarada como “um teste”, segundo o ministro da Saúde, Adam Vojtech.

A partir desta terça-feira, as pessoas que pratiquem ciclismo, corrida ou outras atividades desportivas ao ar livre deixam de ter a obrigação de usar máscara, imposta em março a todas as pessoas que circulem no espaço público.

Na quinta-feira, são autorizadas a reabrir as lojas de jardinagem, ferramentas, materiais de construção e de bicicletas, desde que ofereçam desinfetante e luvas aos clientes e assegurem uma distância de segurança entre clientes e funcionários.

Até agora, apenas lojas de alimentos e farmácias podem funcionar no país.

O ministro adiantou que vai ser avaliada esta semana a reabertura de outras lojas após a Páscoa. As concentrações de mais de 10 pessoas continuam proibidas.

As fronteiras vão manter-se encerradas, mas a partir de 14 de abril a proibição de viajar para o estrangeiro vai ser parcialmente levantada, passando a autorizar-se as viagens de negócios, por razões de saúde ou visitas a familiares, desde que os viajantes cumpram 14 dias de quarentena após o regresso ao país.

A República Checa regista 4.944 casos de infeção, 88 dos quais mortais.

Itália pondera aplicação de telemóvel para cartografar os movimentos dos doentes

créditos: Piero Cruciatti / AFP

O ministro da Saúde italiano, Roberto Speranza, anunciou no domingo um plano em preparação para um levantamento “gradual e controlado” das restrições, que as autoridades preveem para meados de maio.

O país, o que mais mortes associadas à Covid-19 regista em todo o mundo, anunciou na semana passada o prolongamento do confinamento até 13 de abril e, segundo o diretor da Proteção Civil, Angelo Borrelli, esta medida deverá manter-se pelo menos até ao fim de semana prolongado do 1.º de maio.

O plano prevê um reforço das “redes de saúde locais” para triar os casos identificados para tratamento e testar amostras de população para determinar “quantos italianos foram infetados, se são imunes e como, quantos e em que zonas podem regressar a uma vida normal” - uma medida que também está a ser discutida na Alemanha e no Reino Unido, países onde ganha o termo "certificado de imunidade".

Itália prevê também impor o uso de máscara generalizado, ditar um “distanciamento social escrupuloso” e afetar determinados hospitais para tratamento exclusivo da Covid-19, que se manterão abertos para a eventualidade de uma segunda vaga de infeções, para que outros hospitais possam voltar a dedicar-se aos outros doentes.

O governo está também a considerar o desenvolvimento de uma aplicação de telemóvel para cartografar os movimentos dos doentes diagnosticados durante as 48 horas anteriores à infeção e também para facilitar a telemedicina, permitindo, por exemplo, controlar à distância o ritmo cardíaco e a taxa de oxigenação do sangue das pessoas infetadas.

Quando for possível retomar a atividade económica, os primeiros a retomar o funcionamento normal deverão ser as cadeias de abastecimento alimentar e farmacêutico, seguidos dos estabelecimentos de reparações, se bem que com limites ao número de pessoas atendidas.

Bares, restaurantes, discotecas e recintos desportivos serão os últimos a reabrir e, quando o puderem fazer, terão de assegurar uma distância de segurança de pelo menos um metro entre clientes e entre funcionários.

As pessoas que queiram regressar a Itália deverão fazer quarentena e apresentar à entrada do avião, comboio ou autocarro, uma declaração sob compromisso de honra indicando a morada onde vão respeitar a quarentena.

Os transportes públicos deverão manter uma lotação baixa, controlada por funcionários que controlarão a entrada de pessoas, a distância entre passageiros e a ocupação máxima de um lugar em cada dois.

Itália registou, até hoje, 135.586 casos e 17.127 mortes.

Espanha. Infetados confinados e espaços abertos para os imunizados

créditos: EPA/Mariscal

Espanha, o segundo país da Europa com mais mortes, prepara um plano para o pós-pandemia que passa por isolar as pessoas infetadas.

Segundo a ministra dos Negócios Estrangeiros, Arancha González Laya, para “erradicar o vírus” é precisa “uma estratégia mais diferenciada”, que passa por “abrir espaços” para os cidadãos que estão imunizados e “isolar os que têm o vírus, tenham ou não sintomas”, porque, com o confinamento em vigor há quatro semanas atualmente “o contágio ocorre em casa”.

Uma responsável da coordenação da resposta à pandemia do Ministério da Saúde espanhol, María José Sierra, já tinha anunciado no domingo o lançamento de um estudo para determinar a percentagem da população infetada e quantas pessoas estão imunizadas, “informação-chave” para uma distensão das restrições, prevista para dentro de “poucas semanas”.

O “estudo de seroprevalência” com teste de anticorpos vai ser realizado pelo Instituto de Saúde Carlos II, em colaboração com o Instituto Nacional de Estatística.

O uso generalizado de máscaras também está a ser considerado, segundo a responsável.

Espanha é o segundo país europeu com mais mortes, depois de Itália, registando, até hoje, 14.045 mortos em 141.942 casos de infeção.

Portugal. "Se queremos ganhar a liberdade em maio, precisamos de a ganhar em abril"

créditos: MANUEL DE ALMEIDA/LUSA

Em Portugal, que regista esta terça-feira, 12.442 casos de infeção e 345 óbitos, a atenuação de medidas é remetida para maio, depois de um mês de abril em que se devem manter as restrições. A previsão é baseada nas declarações de  Marcelo Rebelo de Sousa, no final da terceira reunião técnica sobre a "Situação epidemiológica da covid-19 em Portugal", no Infarmed, em Lisboa, em que sublinhou que é importante “ganhar em abril o mês de maio”, vincando a necessidade de se “manter este esforço [de medidas restritivas] em abril".

O Presidente da República declarou que "há uma tendência positiva" na evolução da propagação da Covid-19, "lenta, mas positiva", no país, mas que “se queremos ganhar a liberdade em maio, precisamos de a ganhar em abril. Isto é, para dar passos em maio de liberdade, no sentido de regresso progressivo à normalidade, não apenas no sistema escolar, como na atividade económica e social, é preciso em abril ganhar maio".

Os primeiros casos confirmados em Portugal foram registados no dia 2 de março de 2020.

A 17 de março, o Governo declarou o estado de calamidade pública no concelho de Ovar, que a partir do dia seguinte ficou sujeito a cerco sanitário com controlo de fronteiras e suspensão de toda a atividade empresarial não afeta a bens de primeira necessidade. A medida foi, entretanto, prolongada até 17 de abril.

O país está desde as 00:00 de 19 de março em estado de emergência, prolongado igualmente até às 23:59 do dia 17 de abril.

A medida proíbe toda a população de circular fora do seu concelho de residência entre 9 e 13 de abril, para desincentivar viagens no período da Páscoa.

*com agências