"É de uma inconsciência absoluta e de uma falta de noção, pois estamos a falar do festival de Almada". "Claro que é de Almada, mas é sobretudo o grande evento teatral do país", disse Inês de Medeiros à agência Lusa, acrescentando que este ano os subsídios atribuídos à companhia sofreram o "maior corte", no montante de "110.00 euros", e que este é feito "a poucos meses" do início da 35.ª edição do Festival de Teatro [de 04 a 18 de julho].

Apesar de o subsídio de 312.000 euros atribuído, este ano pela DGArtes à Companhia de Teatro de Almada (CTA), no âmbito dos concursos do programa de apoio sustentado, a companhia vai receber menos 110.000 euros do que em 2017, segundo a autarca, e quase menos de 88.000 euros do que em 2013.

A autarca, eleita pelo Partido Socialista (PS), recorda que "mais de metade" da verba anual atribuída pela DGArtes à CTA vai para o Festival de Almada, que é "um dos melhores cartões de visita do concelho e do país".

A DGArtes "demite-se do financiamento do maior evento teatral do país", acusou Inês de Medeiros.

"É uma situação que eu acho que é preciso não ter nenhuma consciência, nem conhecimento. E, portanto, lamento, mas até duvido da competência para se julgar, da parte de um júri, [ao] pôr em pé de igualdade candidaturas [como a da CTA], onde há o maior evento teatral do país, mais programação", com aquelas candidaturas "que têm apenas programação". "Não estou a fazer nenhuma crítica aos teatros que têm apenas programação", prossegue Inês de Medeiros. "Agora, obviamente, não podem ser avaliados da mesma maneira".

Por isso, "o Estado continua a não reconhecer o Festival de Almada como aquilo que ele é, que é o grande momento teatral, o grande festival internacional de teatro que temos em Portugal", sublinhou Inês de Medeiros.

A autarca lembrou que o certame tem um capital acumulado ao longo dos anos, fomenta relações entre outros municípios, como o de Lisboa, promove a abertura para o exterior e fomenta a internacionalização da Cultura portuguesa. “E tudo isto, em vez de ser protegido e salvaguardado, é quase condenado".

"E depois aparece o teatro de Almada como uma espécie de dinossauro, que é sempre quem ganha mais [com os subsídios]. Pois, será quem ganha mais, mas é, certamente, também, quem mais faz", argumentou.

Isto é tanto ou mais grave por a CTA estar num "beco sem saída", referiu Inês de Medeiros, lembrando, a propósito, que houve uma altura em que a CTA podia candidatar o Festival aos subsídios de forma independente da programação, e depois passaram a ter de englobar toda a atividade.

"Agora, se quiserem, já podem concorrer à parte e chegámos ao absurdo que, para poderem candidatar o festival à parte, têm de criar uma estrutura nova e, se criarem uma estrutura nova, não podem concorrer, porque a estrutura tem menos de quatro anos", explicou.

"Isto é pôr a Companhia de Almada numa situação em que não tem para onde se virar", disse Inês de Medeiros, lembrando que o município "já financia mais que o próprio Estado".

Por isso, "o Estado continua a não reconhecer o festival de Almada como aquilo que ele é, que é o grande momento teatral, o grande festival internacional de teatro que temos em Portugal", sustentou.

Ao referir que se têm coibido de se pronunciar sobre os critérios que foram definidos para a atribuição de subsídios e sobre as decisões do júri dos concursos, Inês de Medeiros afirmou, porém, que não pode deixar de expressar a sua "perplexidade e revolta" com alguns dos critérios e com a forma como a Companhia de Almada foi avaliada.

Citou, a propósito, o critério de não contabilização do público e considerou "absurdo" que a CTA seja avaliada "exatamente com os mesmos critérios como se não tivesse na sua candidatura o festival e a sua programação".

"Porque das duas uma: ou tiramos os montantes que lá estão para o festival e a companhia praticamente não tem financiamento, mas nota-se bem que não é isso pelas apreciações do júri (...), que reconhece a qualidade da programação; ou então, se retira desse montante a programação da companhia, o festival é subfinanciado", argumentou.

Numa "lógica de meritocracia", Inês de Medeiros diz não compreender a decisão dos montantes à companhia dirigida por Rodrigo Francisco, uma vez que se diminui o financiamento a uma estrutura que tem trabalho feito de muitos anos, no sentido de criar um público fiel.

"Não é possível, é um contrassenso maior", referiu, alegando entender que "o Governo enquanto Governo" pode aumentar as verbas, mas isso seria complicado, porque "seria desautorizar o júri ou os critérios utilizados para a atribuição de verbas".

"É um sistema muitíssimo perverso, e tão mais perverso que a companhia é depois apresentada como uma das companhias com maior apoio, quando mais de metade da verba é para o festival", concluiu.

A agência Lusa aguarda ainda uma resposta do diretor da CTA, sobre a diminuição de financiamento à atividade, no âmbito do Programa de Apoio Sustentado da DGArtes.