Em declarações aos jornalistas, no antigo picadeiro real, junto ao Palácio de Belém, em Lisboa, questionado se na marcação da data das legislativas terá em conta os processos eleitorais internos dos partidos à direita, PSD e CDS-PP, Marcelo Rebelo de Sousa respondeu: "Não, não".
"Não, eu vou ter em conta apenas – se for esse o caso – aquilo que considero ser a data mais razoável no quadro que se levantaria no momento da realização das eleições", acrescentou.
Interrogado, em seguida, se se sente pressionado nesta matéria, o chefe de Estado desdramatizou a existência de opiniões diferentes nos partidos e parceiros económicos e sociais.
"Eu sei que isso existe, sei que estão a fazer cumprir o seu papel, que é puxar a brasa à sua sardinha. Mas a mim cumpre-me escolher aquilo – se for esse o caso – que corresponda à melhor solução para o esclarecimento dos portugueses e para a tomada de decisão em termos eleitorais", acrescentou.
Questionado sobre a sua opção de não exigir acordos escritos de suporte ao Governo minoritário do PS no início desta legislatura, Marcelo Rebelo de Sousa retorquiu que na legislatura anterior "foi exigido um acordo escrito", pelo seu antecessor, Cavaco Silva, "que só envolvia o dever de votar o Programa do Governo".
"Não envolvia o dever de votar o Orçamento. Envolvia o dever de tentar negociar e chegar a acordo sobre o Orçamento, mas não envolvia o dever de votar o Orçamento. E com maior ou menor dificuldade – a dificuldade foi aumentando ao longo do tempo – foram votados quatro orçamentos", apontou.
Nesta legislatura, apesar de não haver nenhum acordo escrito "na prática os partidos puseram-se de acordo sobre o Orçamento, durante dois anos", assinalou.
"Até que chegámos a um terceiro ano em que não foi possível sequer um acordo durante a negociação e na primeira votação sobre o Orçamento. Aconteceu. Podia ter acontecido antes, em qualquer outro dos anos anteriores, não aconteceu", argumentou, defendendo que o atual cenário deve ser encarado "sem dramas, com cabeça fria, a tentar encontrar uma solução que seja a melhor para o país para os portugueses".
Antes, o Presidente da República considerou que é fundamental ouvir as opiniões dos conselheiros de Estado sobre uma dissolução do parlamento, o que acontecerá na quarta-feira a partir das 17:00, e realçou que a escolha da data de eleições só acontecerá posteriormente.
Marcelo Rebelo de Sousa distinguiu esses dois momentos: a questão da dissolução, que "fica fechada" na quarta-feira com a audição do Conselho de Estado, e a data de legislativas antecipadas, que irá ponderar "no dia seguinte".
"Estamos ainda na fase da primeira escolha, da primeira decisão. Depois haverá 24 horas até eu falar ao país ao começo da noite de quinta-feira, e aí vou juntar as duas questões: a questão dissolução sim ou não; se sim, qual é a data das eleições", declarou.
Interrogado se será decisivo o parecer do órgão político de consulta presidencial, Marcelo Rebelo de Sousa considerou que "é fundamental ouvir o Conselho de Estado e ouvir as razões dos conselheiros, não é um mero 'pro forma'".
"Eu quero ouvir as opiniões dos vários conselheiros, que são muitos, e cobrem um espectro muito grande da vida portuguesa. Depois, tomo essa decisão. E, a seguir, se for caso disso, tomo a decisão da data das eleições", completou.
Nos termos do artigo 133.º da Constituição, compete ao Presidente da República "dissolver a Assembleia da República, observado o disposto no artigo 172.º, ouvidos os partidos nela representados e o Conselho de Estado".
O artigo de 172.º determina que "a Assembleia da República não pode ser dissolvida nos seis meses posteriores à sua eleição, no último semestre do mandato do Presidente da República ou durante a vigência do estado de sítio ou do estado de emergência" – condições que não se verificam nesta altura.
O Presidente da República ouviu os partidos com assento parlamentar no sábado.
O PSD tem eleições diretas marcadas para 04 de dezembro, e os dois candidatos até agora anunciados - o atual presidente Rui Rio e o eurodeputado Paulo Rangel - defendem calendários distintos para as legislativas: Rio defendeu em Belém que deviam ser em 09 ou 16 de janeiro e Rangel afirmou, em conferência de imprensa, ter preferência por 20 ou 27 de fevereiro.
Por sua vez, o CDS-PP tinha um Congresso eletivo marcado para fim de novembro, com dois candidatos anunciados à liderança, o atual presidente, Francisco Rodrigues dos Santos, e o eurodeputado Nuno Melo, mas aprovou em Conselho Nacional o seu adiamento para depois das legislativas, numa reunião polémica que já levou a várias desfiliações.
O Orçamento do Estado para 2022 foi chumbado na generalidade na quarta-feira passada, com votos contra de PSD, BE, PCP, CDS-PP, PEV, Chega e Iniciativa Liberal. A proposta do Governo minoritário do PS teve votos a favor apenas da bancada socialista e abstenções do PAN e das deputadas não inscritas Joacine Katar Moreira e Cristina Rodrigues.
Duas semanas antes, em 13 de outubro, após PCP e BE acenaram com o voto contra o Orçamento para 2022 logo na generalidade, o Presidente da República tinha avisado que um chumbo da proposta do Governo conduziria "muito provavelmente" à dissolução do parlamento e a eleições legislativas antecipadas, que estimou que se realizariam em janeiro.
Nos dias seguintes, Marcelo Rebelo de Sousa deixou claro que, a confirmar-se o chumbo do Orçamento, avançaria de imediato com o processo de dissolução, embora reiterando ao mesmo tempo a esperança num entendimento "até ao último segundo" antes da votação na generalidade.
[Notícia atualizada às 19:48]
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