No último de dois dias de greve, nem a chuva afastou os enfermeiros do protesto convocado pelo Sindicato dos Enfermeiros Portugueses (SEP), que juntou, durante perto de duas horas, cerca 100 profissionais.

“Mantém-se um amplo descontentamento e os enfermeiros mostram disponibilidade para continuar a lutar por justas e sensatas soluções para o conjunto de problemas com que se encontram confrontados”, disse o presidente do sindicato.

Em declarações aos jornalistas, José Carlos Martins sublinhou a elevada adesão à greve, sem precisar números referentes ao dia de hoje, depois de, na terça-feira, ter rondado os 60% a 70%.

Além da valorização da carreira, o dirigente sindical explicou que o SEP exige, desde logo, o agendamento de uma reunião negocial e criticou o acordo alcançado na segunda-feira entre o Ministério da Saúde e a plataforma de cinco sindicatos, que não integra.

O acordo prevê um aumento salarial de cerca de 20% até 2027, que começará a ser pago em novembro deste ano, mas, no entender de José Carlos Martins, trata-se de um “negócio que nem o melhor feirante faria”.

“O Ministério da Saúde deve um monte de dinheiro aos enfermeiros de retroativos de 2018 a 2022, não os pagou e agora está a utilizar esse dinheiro para financiar a valorização, ainda que insuficiente, aos enfermeiros. É indigno, é inqualificável e não se faz”, justificou.

De bandeiras numa mão e chapéus-de-chuva na outra, os manifestantes cantavam palavras de ordem como “Ministra, escuta, enfermeiros estão em luta”.

Carla Abrantes, enfermeira há 40 anos, decidiu passar assim o seu aniversário. “Pela defesa do Serviço Nacional de Saúde (SNS) e pela valorização da nossa carreira de enfermagem”, explicou à Lusa.

Ao longo de quatro décadas na profissão, diz ter sentido a desvalorização da profissão e lamentou: “Muitas vezes somos aplaudidos, mas depois somos desvalorizados no nosso trabalho, na nossa missão”.

Foi também esse sentimento que levou João Dias de Beja a Lisboa. Enfermeiro há 28 anos, contou à Lusa que o seu salário só chega aos 1.200 euros, um valor que considera inaceitável, tendo em conta o aumento do custo de vida, mas sobretudo a especificidade da profissão.

“Está nas mãos do Governo acabar com esta luta dos enfermeiros. Enquanto não nos respeitarem com uma carreira justa, com salários justos e com o reconhecimento da penosidade desta profissão, naturalmente que estaremos em luta”, afirmou.

Enfermeiro especialista, João Dias defende que melhores condições de trabalho beneficiam todos os utentes do SNS e admite que é o gosto pela enfermagem que o mantém na profissão. “Mas tem de haver o outro lado, da valorização profissional e de uma carreira justa”, acrescenta.

Na concentração estiveram também o secretário-geral do PCP, Paulo Raimundo, e a deputada do BE Marisa Matias, que manifestaram a sua solidariedade para com os enfermeiros, concordando que estes profissionais não têm de ficar à espera do Orçamento do Estado para verem a sua carreira valorizada.

“Havendo folga orçamental, não é justificável que haja tantas reivindicações que continuem à espera. É preciso fazer justiça e não apagar anos de reivindicações de alguém que presta um serviço tão necessário e que assegura o funcionamento do SNS”, disse Marisa Matias.

O líder do PCP alertou ainda que o SNS enfrenta “problemas gravíssimos” e que, apesar da “resposta extraordinária que está a ser dada, fica muito aquém do que era possível e desejável”, uma inevitabilidade com profissionais exaustos, desrespeitados e desvalorizados.