Há dez anos que o seu nome faz parte das listas do PSD para a Câmara Municipal de Lisboa (CML), primeiro na lista de Fernando Negrão, em 2007, e depois na lista de Fernando Seara, em 2013. Ainda assim, a atuação política de Teresa Leal Coelho é sobretudo conhecida ao nível do partido, no qual é vice-presidente da Comissão Política e um dos braços direitos de Pedro Passos Coelho, e da Assembleia da República, onde foi vice-presidente da bancada parlamentar, função que abandonou em 2014 quando a orientação do partido no que respeita à adoção por casais do mesmo sexo foi diferente da sua, e onde se mantém desde 2011 como deputada.

A sua escolha como candidata do PSD para Lisboa foi precedida de uma longa discussão sobre a falta de nomes de peso dos sociais-democratas nestas eleições autárquicas, nomeadamente nas duas principais cidades, Lisboa e Porto. Na concelhia de Lisboa do PSD, o processo também esteve longe de ser pacífico, tendo inclusive provocado a demissão do líder dessa estrutura partidária. Ainda assim, Teresa Leal Coelho rejeita a ideia de que parte em desvantagem para estas eleições. "Os portugueses confiam no PSD para o país, como confiam para a cidade de Lisboa até porque o Partido Social Democrata, com Pedro Passos Coelho, e antes de Passos Coelho, já devolveu a dignidade ao país, retirando o país da bancarrota”.

Questionada sobre as propostas que apresentou para Lisboa nos últimos quatro anos, afirma que fez oposição construtiva ao executivo camarário liderado primeiro por António Costa e depois por Fernando Medina, e garante que se mais não fez foi porque o partido socialista tem maioria absoluta há dez anos. Recebeu-nos na sede do PSD e entrou na sala com um conjunto de dossiers que colocou intencionalmente abertos ao seu lado. Terminou a entrevista a sublinhar que irá “precisar” de António Costa quando for eleita e não perdeu uma oportunidade para recordar que antes de Lisboa ser uma capital “na moda”, Portugal foi um “herói surpresa”.

Vamos começar por uma enumeração de prémios que Lisboa recentemente recebeu, escolhemos três a título de exemplo. Em abril de 2016, Lisboa foi eleita a melhor cidade de Portugal para se viver, visitar e investir, segundo a Bloom Consulting. Em janeiro 2017, Lisboa foi eleita a melhor cidade do mundo pela revista Wallpaper. E em março de 2017 Lisboa foi considerada uma das 50 melhores cidades do mundo para se viver, segundo a Mercer. Lisboa está indiscutivelmente na moda, mas, na sua opinião, a vida na cidade está insuportável. O que pode fazer pela cidade, se for eleita, para a tornar mais suportável?

Antes de mais, não é se for eleita, é quando for eleita (sorriso). Deixe-me acrescentar em relação a todos esses prémios que referiu em relação à cidade de Lisboa que antes desses prémios, Portugal foi considerado herói surpresa há uns anos, em 2013, exatamente pelo esforço que as pessoas, os portugueses e as empresas portuguesas fizeram na recuperação de Portugal, que estava em circunstâncias muito delicadas - e efetivamente tivemos um trajeto absolutamente extraordinário. Falando concretamente da cidade de Lisboa e desses prémios todos que muito me orgulham, deixe-me dizer que quando faço referências negativas às  condições de vida em Lisboa são relativas às condições de sustentabilidade para a classe média em Lisboa. Todas essas qualidades que a cidade tem não podem ser usufruídas pela classe média que está sistematicamente a ter de sair de Lisboa. Os preços para habitação na cidade de Lisboa tornaram-se absolutamente incomportáveis para cidadãos portugueses. Nós sabemos que temos condições distintas, condições económicas e financeiras, das que têm os cidadãos dos nossos parceiros europeus e que adquirir uma casa é para cidadãos dos nossos parceiros europeus barato ou acessível, mas para os portugueses, e designadamente para a classe média e para os jovens, não é nem barato nem acessível.

Então acha que estes prémios são para quem vê a cidade de fora?

Estes prémios são de quem avalia a cidade numa perspetiva económica e financeira da globalização. Passo a explicar isso com muita clareza. Olhe, tenho aqui mesmo à minha frente, não para esta entrevista mas por acaso trouxe, o relatório sobre o desenvolvimento. A globalização tem impactos naquilo que são as condições financeiras daqueles que estão integrados nesse processo, que é o caso da cidade de Lisboa, e não só. O Porto também, e outras cidades em Portugal,  que são hoje muito atrativas, não só para o turismo como para algum investimento, mas sendo muito atrativas acabam por elevar os custos de vida e os custos em geral para um paradigma que é superior àquele que é comportável de acordo com os salários dos portugueses.

Falando da sua candidatura. Já disse em mais do que uma ocasião que esta câmara e este executivo camarário estão reféns do primeiro-ministro. Mas, ao inverso, o primeiro-ministro e líder do PS, António Costa, também já disse que Fernando Medina é o único verdadeiro candidato à câmara porque todos outros fazem-no por agenda partidária. Atendendo a todo o processo da sua candidatura, ao calendário que seguiu, ao programa que ainda não se conhece, é legítimo aceitar que há razões partidárias que superam as razões de uma candidatura "verdadeira" do candidato do PS, Fernando Medina?

Eu não ouvi essas declarações do líder do PS, António Costa, e muito me surpreende se as disse. Não ouvi, terei dificuldade em comentá-las, mas muito me surpreende porque sei que o primeiro-ministro António Costa tem cultura democrática, e tendo cultura democrática tem de aceitar com muito respeito todas as candidaturas à cidade de Lisboa, sejam apresentadas por que partido for. No meu caso, a minha candidatura é a candidatura do maior partido português, daquele que tem o maior grupo parlamentar...

"(…) nas últimas legislativas tivemos maioria em Lisboa. Em 2015, quando ganhámos as eleições coligados com o CDS-PP, tivemos - e não tínhamos há cerca de 17 anos - maioria no concelho de Lisboa"

... Mas que já não está na câmara de Lisboa há dez anos.

É verdade, mas sabe que nas últimas legislativas tivemos maioria em Lisboa. Em 2015, quando ganhámos as eleições coligados com o CDS-PP, tivemos - e não tínhamos há cerca de 17 anos - maioria no concelho de Lisboa. É por isso uma falsa questão. Aliás, o atual presidente da câmara, Fernando Medina, já concorreu comigo e na mesma posição, nas últimas eleições de 2013, pois como sabe ele era o número dois da candidatura de António Costa e eu a número dois da candidatura de Fernando Seara. Portanto, ambos fomos a eleições como número dois.

E essa foi a segunda vez que se candidatou, já se tinha candidatado em 2007 com Fernando Negrão. Mas a verdade é que em dez anos não é conhecida grande obra na Câmara Municipal de Lisboa. Ao contrário do que acontece no Parlamento em que  assumiu algumas pastas e temas polémicos como a adoção por casais do mesmo sexo, interrupção voluntária de gravidez, iniciativas de defesa das mulheres no local de trabalho. O que é que faz com esta candidatura seja diferente das outras vezes?

Essas e muitas mais, deixe-me não deixar coxas as iniciativas de que me orgulho. Também a criminalização do enriquecimento ilícito, que não passou porque o Partido Socialista votou contra essa proposta, um conjunto de reformas no âmbito da transparência, a exigência de registo de interesses e portanto maior responsabilização dos titulares de cargos políticos e públicos. Foram inúmeras as minhas causas, pelo menos as mais visíveis durante a atual legislatura. Há uma também de que me orgulho muito que foi a alteração da legislação no âmbito da agenda para a criança, e designadamente a delimitação do conceito de superior interesse da criança. E também participei naturalmente nas reformas que foram levadas a cabo pelo Governo. Na área da justiça, houve uma reforma estrutural que hoje nos coloca numa posição muito mais competitiva, mesmo no plano económico, porque a justiça é um ativo económico.

Mas em relação à câmara...

No que diz respeito à câmara diz e bem que pouco foi feito para melhorar a vida das pessoas, mas pouco foi feito pelo executivo camarário que está à frente da câmara com maioria absoluta há dez anos. O Partido Socialista está há dez anos na câmara de Lisboa com maioria absoluta o que significa que tem domínio sobre as todas as deliberações que são tomadas, portanto só posso dizer que o que não foi feito para melhorar as condições de vida das pessoas é imputável a políticas que se orientaram noutro sentido levadas a cabo pelo executivo socialista. Como vereadora sem pelouro, participei e negociei e fiz também oposição construtiva em diversas matérias no âmbito da CML.

Mas na opinião pública não há memória de uma causa concreta, apesar de estar na câmara de Lisboa há dez anos. Por que causas se bateu?

Não! Eu não fui eleita em 2007 ...

Mas está envolvida em eleições para a câmara desde 2007 ...

Deixe-me clarificar: eu fui candidata em 2007 mas não fui eleita.

"Considero é que os cidadãos devem estar disponíveis numa determinada fase da sua vida, quando têm a vida profissional consolidada e não são dependentes da política, para exercer cargos políticos e que isso é um dever de cidadania. Esse momento para mim chegou em 2007 (…)"

Mas em 2013 foi eleita efetivamente e é legítimo assumirmos que desde 2007 tem proximidade aos temas de Lisboa, porque a partir do momento que integra uma lista tem de estar a par dos temas. A questão é quais são as suas causas em Lisboa, como é que espelha a sua atuação política na câmara nomeadamente fazendo paralelismo com a sua atuação no Parlamento, onde são conhecidas as suas bandeiras.

Eu não me interesso por Lisboa desde 2007, interesso-me por Lisboa desde muito antes de 2007, embora só tenha sido candidata a partir de 2007. Até por uma razão muito simples: não sou adepta do funcionalismo na política, não considero que a minha profissão seja a política. Considero é que os cidadãos devem estar disponíveis numa determinada fase da sua vida, quando têm a vida profissional consolidada e não são dependentes da política, para exercer cargos políticos e que isso é um dever de cidadania. Esse momento para mim chegou em 2007, depois retornou em 2011 para um projeto nacional e em 2013 para um projeto para a câmara de Lisboa. A forma como coloca a questão é de balanço, eu responderei com uma projeção para o futuro. E na projeção para o futuro defendo aquilo que defendi durante estes anos neste executivo camarário - ao qual não pertenço porque sou vereadora sem pelouro, mas no âmbito do qual fui eleita.

E que é …?

Aquilo que me distingue da política que foi desenvolvida durante estes dez anos pelo partido socialista na Câmara Municipal de Lisboa é a linha de orientação, aquilo que entendo que Lisboa precisa para as pessoas. E aquilo que as pessoas precisam em Lisboa é de inverter este rumo que levou a que tenham de sair da cidade. Há dez anos, quando o partido socialista iniciou este executivo camarário, a classe média vivia em Lisboa, tinha condições de o fazer pagando rendas compatíveis com os seus rendimentos e não tendo de pagar uma excessiva renda para estacionar o automóvel à porta de casa ou à porta do trabalho. Tudo isso mudou nos últimos dez anos. Dir-me-ão que são impactos do facto de a cidade de Lisboa estar na moda, que foi a expressão que utilizaram. Eu utilizarei outra, mais do desenvolvimento inclusivo, o facto da globalização ter um impacto nas cidades que nela estão integradas, mas também das políticas públicas que são adotadas pelos atores políticos. E aquilo que faltou de políticas públicas - de defesa de políticas públicas nos últimos dez anos - foi precisamente essa orientação para que os cidadãos pudessem continuar - aqueles que querem - continuar a viver em Lisboa e isso não foi feito. Tenho referido por diversas vezes que hoje o tecido demográfico da cidade de Lisboa é composto por cerca de 500 mil pessoas, dessas 125 mil têm mais que 65 anos, dessas 500 mil, um quinto vive em habitação social e neste contexto, a classe média e os jovens foram e continuam a ser expulsos da cidade de Lisboa. Ao contrário do que este executivo camarário tem feito, o que eu defendo são as políticas que permitem que as pessoas se fixem em Lisboa e para isso é preciso canalizar os recursos financeiros da CML para, por um lado, ação social, e estou a falar de retirar excessivos custos de vida para as famílias em Lisboa. Dou dois ou três exemplos: uma creche em Lisboa é bem mais cara do que em concelhos limítrofes, a câmara não se tem preocupado com esta ação social. A questão da habitação também é fundamental.

créditos: Paulo Rascão | MadreMedia

Que medidas é que propôs concretamente nestes quatro anos para fazer face a estes desafios e problemas que a cidade tem? Há propostas do PSD para ter creches mais baratas na cidade? Há propostas para reter a classe média? Quais são e porque é que não avançaram?

Houve algumas das nossas propostas que avançaram. No que diz respeito aos impostos, seja o IRS, seja a outras taxas e tarifas, que são hoje em dia encargos para os cidadãos de Lisboa, os vereadores do PSD na CML propuseram e acompanharam algumas propostas apresentadas por outros grupos de vereadores de descida desses impostos e taxas. Mas devo dizer que, ao mesmo tempo, repudiámos outras taxas que foram adotadas por proposta deste executivo camarário, só que não pudemos travar porque têm a maioria.

Como por exemplo?

Dou-lhe um exemplo: de 2015 para 2016, ao contrário do que as pessoas pensam - e de facto há um conjunto de lugares comuns que são assumidos pelas pessoas como se fosse a realidade seja na cidade de Lisboa, seja no país… - não desceram os encargos com impostos e com tarifas para os habitantes em Lisboa. Subiram. É evidente que a política a partir da Câmara Municipal de Lisboa não tem o mesmo mediatismo que a política a partir do Parlamento. As reuniões de câmara são fechadas, como sabem. Mas os habitantes de Lisboa de 2015 para 2016 passaram a pagar mais 28,8% do que pagavam anteriormente. Como o que foi comunicado foi que a devolução do IRS foi aumentada, por via da câmara, e foi muito comunicada esta medida, e também o facto de se ter fixado a taxa do IMI no mais baixo que é permitido pela lei, que também foi muito comunicado, a perceção das pessoas é que os impostos desceram para os cidadãos de Lisboa. Não é verdade, porque entretanto foram adotadas outras taxas e outras tarifas - como por exemplo a taxa de proteção civil que é inconstitucional e relativamente à qual nós nos batemos, eu me bati e os restantes vereadores. Advertimos que era inconstitucional e agora já temos o respaldo de uma recomendação do Provedor de Justiça e teremos a breve trecho uma decisão do Tribunal Constitucional sobre essa taxa.

Sobre a fixação das pessoas na cidade, a CML que é o maior proprietário de Lisboa poderia colocar um conjunto de fogos no mercado de arrendamento ou até no mercado de compra e venda mas para que pudesse ser adquirido para habitação pela classe média e pelos jovens. Nunca foi essa a opção deste executivo camarário. Nós - eu, integrada num coletivo de vereação - defendemos sempre que deviam ser outras as políticas a adotar nesta matéria pela Câmara Municipal de Lisboa. Contestámos sempre o facto de uma certa especulação imobiliária em razão da CML optar por levar a hasta pública uma parte do seu património. No que diz respeito  às obras que a CML entendeu fazer, e em simultâneo, também empreendemos uma luta bastante veemente, nomeadamente no que diz respeito às obras da 2ª Circular.

Que estão suspensas...

Certo, estão suspensas mas por outra razão, porque o executivo camarário apesar da nossa contestação no sentido de que não avançasse em simultâneo com todas as outras obras, fê-lo.

Mas é contra as obras que estão a ser feitas?

Em relação às obras da 2ª Circular, completamente, fosse em  simultâneo ou não.

Mas tinha outra solução?

Sobre aquele projeto que foi apresentado para a 2ª Circular e que teve um conjunto de estudos que punham em causa a respetiva viabilidade e segurança dos aviões, porque está muito próximo do aeroporto, fomos contra a obra e a obra em simultâneo.

"Nós remetemos o processo [referente às obras na 2ª Circular] para o Ministério Público, porque pedimos um conjunto de esclarecimentos que não nos foram dados."

Mas com alternativa ou não?

Com certeza que com alternativa e já lhe digo a alternativa que apresentámos. Considerámos que seria prioritário resolver o problema dos nós... como sabe um eixo central significa isso mesmo, é um eixo central que tem um princípio e um fim e vai desembocar, e uma das obras que considerámos prioritária era precisamente intervir nos nós na terminação do eixo central. Isso não foi aprovado pela Câmara Municipal de Lisboa, foi aprovada a obra na 2ª Circular. Advertimos em relação a essa obra. Deixe-me dizer que, em condições que não estão completamente esclarecidas, o presidente da câmara entendeu recuar com essa obra. Nós remetemos o processo para o Ministério Público, porque pedimos um conjunto de esclarecimentos que não nos foram dados. Não nos foram dados na sequência do inquérito que exigimos ao atual presidente da câmara, os resultados do inquérito não chegaram no tempo que considerámos adequado, e portanto esse processo foi remetido ao Ministério Público.

Mas ainda aguardam essas explicações...

Ainda aguardamos, naturalmente.

Espera que venham antes das eleições?

Sabe, não estou preocupada com isso, porque aquilo que me preocupa é que seja apurada a verdade. Eu não estou aqui a utilizar estes instrumentos para ter vantagens eleitorais. Quero ser eleita, porque tenho uma visão para a cidade que é distinta da visão que tem o partido socialista e o atual presidente Fernando Medina e por isso apenas. E não utilizo e nunca utilizarei qualquer estratagema para conseguir ser eleita, não acho que a política se faça assim e não faço a política assim. A única coisa que quero é que os munícipes de Lisboa tenham garantias que eu enquanto vereadora não tendo resposta para um processo que considero que é controvertido, e que teve custos que saíram do bolso das pessoas, fiz aquilo que tenho de fazer que e remeter ao Ministério Público para investigação que é a sede própria. Dir-me-á: bom, os cidadãos de Lisboa não sabem isto. Não sabem isto como não sabem muito mais. O que nós estamos a fazer naquela vereação é a defender, de acordo com a nossa convicção, os cidadãos de Lisboa. Agora quando uma câmara tem maioria absoluta como tem o PS, isso não é possível.

Também contestámos de forma veemente o endividamento da Câmara Municipal de Lisboa. Temos uma enorme preocupação com essa matéria e contestámos. Quando a CML celebrou o memorando de entendimento com o Governo de Pedro Passos Coelho que permitiu à CML receber uma verba de 286 milhões de euros para assegurar os encargos com a dívida da câmara, e designadamente pagamentos a fornecedores, a verdade é que não utilizou na íntegra este valor para esse efeito.

créditos: Pedro Marques | MadreMedia

Uma cidade como Lisboa é obrigada a um plano de financiamento ambicioso e investimentos contínuos. Logo tem de ter fontes de financiamento. Defendeu duas coisas: IMI à taxa de 0% e disse que tem pouca simpatia pelo aumento da taxa turística. Abrir mão deste tipo de receitas é sem dúvida atrativo para quem vive na cidade e para quem a visita, mas onde vai buscar então financiamento alternativo?

Eu defendi muito mais do que isso.

Certo, mas em relação a estas duas que são muito concretas para as pessoas, e até atrativas, como é que se financia a cidade cortando-se em dois impostos que geram milhões em receitas?

Eu beneficiei uma isenção de IMI por dez anos quando adquiri a minha casa. Agora deixe-me dizer que eu tenho de me afastar radicalmente daquilo que disse, que foi que uma cidade como a cidade de Lisboa tem de se endividar. Eu não concordo.

"Julgo que não há memória de um executivo camarário na cidade de Lisboa ter pedido um empréstimo relativamente ao qual o Tribunal de Contas vem dizer ‘não tem capacidade de endividamento’"

Dissemos que tem de investir.

Pois tem que investir, mas não tem que se endividar. E deixe-me dizer que quando se endivida com empréstimos a 20 e a 30 anos está a endividar as gerações atuais e está a endividar as gerações futuras. Os meus filhos, os vossos filhos, os netos e por aí em diante. É preciso ter cautela com o endividamento. Quando a despesa corrente de uma cidade ou de um país é suportada por receita extraordinária isso leva-nos a bancarrotas. Um executivo camarário não tem que fazer isso, bem pelo contrário. E o investimento deve ser reprodutivo, e devem ser também estabelecidas prioridades. E são precisamente as prioridades que em grande medida nos distinguem. Neste caso, a prioridade seria criar condições de apoio a que os avós, filhos e netos pudessem viver na cidade de Lisboa. E portanto é verdade que uma cidade tem naturalmente de fazer face às despesas da sua operacionalização, mas sobretudo às despesas que são necessárias no plano da ação social, de criar ações de vida para as pessoas, em geral, e designadamente para a classe média, e isso não tem sido feito.

Mas eu tenho que completar o que estava a dizer, porque é muito importante que as pessoas saibam que este executivo camarário está a funcionar, volto a repetir com os 286 milhões do memorando de entendimento. Já agora, deixe-me dizer que julgo que não há memória de um executivo camarário na cidade de Lisboa ter pedido um empréstimo relativamente ao qual o Tribunal de Contas vem dizer "não tem capacidade de endividamento". Isto é grave, muito grave, porque a pretensão deste executivo camarário era, com este empréstimo que pediu ao BEI [Banco Europeu de Investimento], utilizar 100 milhões neste ano de 2017 e só não o vai fazer porque o Tribunal de Contas disse que a cidade de Lisboa não tem capacidade de endividamento neste montante.

Teve que ser o Tribunal de Contas a travar esse empréstimo e o Tribunal de Contas não está a defender interesses partidários, está a defender a sustentabilidade do município e isto é muito importante porque nós vivemos sistematicamente neste país com perceções erradas sobre as coisas, e depois, no fim da linha, acontecem coisas como aquelas que aconteceram nos últimos anos em Portugal que é termos, no plano nacional, o ministro das Finanças, Teixeira dos Santos, a dizer que não tem dinheiro para pagar salários no próximo mês. O que é que isso seria? O que é que teria acontecido no país e na cidade de Lisboa se não se tivessem sido pagos os salários no mês seguinte, se não se tivesse pago o Serviço Nacional de Saúde, se não se tivessem pago as escolas a educação… Nós não andamos a brincar com isto. Para além destes quatro pilares de que lhe falei, tirando os 286 milhões, ainda há outro pilar. E o outro pilar chama-se ATL da qual o presidente da câmara é também presidente.

"(…) a ATL que é criada para promoção turística faz isso e muito mais. Faz comunicação, além de fazer comunicação faz obras. Obras essas que ficam fora do controlo do Tribunal de Contas"

Fala da Associação de Turismo de Lisboa...

Eu julgo que é muito conhecida, porque como ela é participada também por agências de comunicação, e tem membros de agências de comunicação no seu próprio conselho de administração, o que não falta é comunicação da existência da ATL. Agora a ATL que é criada para promoção turística faz isso e muito mais. Faz comunicação, além de fazer comunicação faz obras. Obras essas que ficam fora do controlo do Tribunal de Contas, e nós de uma vez por todas temos de deixar que a poeira ou que as luzes da ribalta possam encandear os cidadãos, sejam eles os munícipes, sejam eles os cidadãos em todo o país.

Se for eleita não assumiria a presidência da ATL?

Se for eleita, não permito que se faça uma única despesa que não seja controlada pelo Tribunal de Contas. Uma única! Não acredito numa democracia em que isso se faz, acredito numa democracia em que isso não se faz. A transparência para mim é uma regra absolutamente de ouro. Como eu já anunciei por diversas vezes, todos os elementos da minha equipa, seja de vereação, seja de Assembleia Municipal, seja de juntas de freguesia, vão assinar um compromisso de transparência, ético e de envolvimentos. Vamos estar obrigados, todos sem exceção, a publicar, trimestralmente, o uso de cada cêntimo. O que significa que cada cidadão de Lisboa saberá se cada cêntimo da Câmara Municipal de Lisboa servirá para ação social ou para obras.

O que está a dizer é que a ATL funciona como um saco azul da câmara de Lisboa?

Eu não utilizei essa expressão, nem vou utilizar. Mas é um parâmetro em que eu não vou responder.

Mas considera que é uma prática errada a forma como, neste momento, está a ser gerida a ATL.

O que eu digo, e pela positiva, é o que eu acabei de dizer e não direi de outra forma, porque não quero dizer de outra forma e a liberdade e a responsabilidade passam por que as pessoas digam as coisas que querem dizer e que cheguem às pessoas como querem, e não de outra forma. E, portanto, aquilo que digo é enquanto presidente de câmara, não permitirei que um único cêntimo que esteja ao serviço dos munícipes seja utilizado sem cumprir todas as regras de controlo da despesa, e designadamente pelo Tribunal de Contas.

créditos: MadreMedia | Pedro Marques

Vamos falar agora do Metro que tem sido uma das empresas mais em foco.

E fustigada, mesmo...

Falou, recentemente, sobre o tema das cativações que nas últimas semanas, entraram na ordem do dia, por outras razões. E disse que o Metro, concretamente, "está como está por causa das cativações". Como é que o Metro devia estar e por que é que não está?

Estamos a falar de transportes públicos na cidade de Lisboa, e aquilo que eu defendo em matéria de transportes públicos na cidade de Lisboa é uma gestão integrada, o modelo que defendemos, aliás, há dois anos. Estamos a falar de Metro, Carris e Transtejo, e também defendo a concessão do Metro e da Carris. No que diz respeito ao metro, é também preciso esclarecer as pessoas que me ouvirem, que está sob gestão do governo, não está municipalizada. E aquilo que afirmei é que as cativações que o governo faz implicam uma prestação de serviço deficiente aos munícipes de Lisboa, designadamente porque há menos carruagens, não há manutenção das carruagens que estão em estaleiro.

No que diz respeito ao Metro, as cativações que o governo faz têm implicações na qualidade do serviço. Corte de carruagens por um lado, intermediação das composições... E até lhe vou acrescentar uma coisa porque, como digo, é bom que sejamos claros na comunicação que fazemos com as pessoas relativamente às quais nos dispomos, com humildade, servir. Quando o PSD estava no governo, designadamente no período de emergência, houve um conjunto de intervenções que no Metro [que já era gerido no plano nacional], mas - em período de emergência - reforçou no horário de ponta, reforçou o número de carruagens e reduziu o tempo de intermediação das composições. Em período de emergência! E onde foi diminuir as carruagens foi precisamente nos períodos vazios, apesar de estarmos naquela circunstância. Eu não só disse que o Metro, e por isso os munícipes de Lisboa e por isso aqueles que trabalham em Lisboa, sofrem as consequências das cativações, deixe-me dizer-lhe que sofrem também as consequências do preço que o PS tem de pagar ao Partido Comunista Português com esta opção de municipalização e gestão pelo município da Carris. Porquê? Porque a Carris precisa de investimento de acordo com o contrato de concessão que nós tínhamos celebrado. Porque, seja um executivo camarário, seja o governo, anuncia muitas medidas que quando leva a concurso não passam do papel, porque ninguém concorre aos projetos que são apresentados. E portanto não basta abrirmos concursos públicos seja para o que for, é preciso abrirmos concursos públicos que não fiquem desertos e foi isso que nós fizemos em relação à Carris e ao Metro há dois anos. Não ficou deserto e negociou-se um contrato que permitia que fossem os concessionários, ou seja a empresa mantinha-se pública, a fazer o investimento na aquisição de mais autocarros, na contratação de mais motoristas e esses investimentos a fazer pelos concessionários não tinham qualquer impacto no bolso dos munícipes, bem pelo contrário, e ainda ao fim de oito ou nove anos, conforme os casos, revertiam enquanto ativo...

"Pode haver uma nuvem de falta de confiança, mas seguramente que há confiança, porque se não houvesse o Portugal à Frente não teria ganho as últimas eleições, por que o PSD no país, e na cidade de Lisboa, também disse de forma inequívoca que acredita na iniciativa económica privada."

Mas reconhece que as pessoas em geral têm uma má experiência em relação a concessões, PPP's e contratos semelhantes.

Todos nós temos um pensamento político-ideológico, temos um pensamento filosófico-político... Eu tenho muita dificuldade em perceber a desconfiança que as pessoas têm das pessoas. Quando falamos em concessões, falamos em iniciativa económica privada. Estamos a falar de ação das pessoas e as pessoas é que são soberanas. Não são as classes políticas que são soberanas. As classes políticas exercem um poder político delegado pelas pessoas e eu não consigo compreender que se entenda que a iniciativa económica privada e a gestão privada, seja negativa. Bem pelo contrário. Pode haver uma nuvem de falta de confiança, mas seguramente que há confiança, porque se não houvesse o Portugal à Frente não teria ganho as últimas eleições, por que o PSD no país, e na cidade de Lisboa, também disse de forma inequívoca que acredita na iniciativa económica privada. Sobretudo se não acreditar, na minha perspetiva, porque outros, que estão no governo, por exemplo, poderão ter outra perspetiva, mas se não se acredita nas pessoas porque é que se exerce o poder político? Não entendo, há aqui um contra senso que eu considero absolutamente evidente, gritante.

Agora se me diz que houve corrupção, há pouco falámos das minhas causas no Parlamento e também foram pela transparência e pelo combate à corrupção. Há pouco falei da criminalização do enriquecimento ilícito. É lamentável como neste país, e noutros países que nós conhecemos e que estão ao nosso redor, vamos sendo alertados com processos judiciais decorrentes de alegada corrupção. É lamentável. Não é só do setor público. É do setor público e é do setor privado como é evidente, mas julgo que talvez nos últimos 40 anos, em Portugal e noutros países, houve muitos desvios de recursos financeiros que são absolutamente determinantes para a promoção de desenvolvimento humano, económico e social para o bolso de alguns. Não criámos a riqueza que poderíamos ter criado neste país, mas criámos alguns ricos. Isto também foi um discurso que me ouviram por diversas vezes enquanto deputada à Assembleia da República e isso tem de ser combatido.

Aproveito para dizer isto: nós temos 50% de abstenção para a câmara, como para as eleições nacionais. As pessoas muitas vezes estão acríticas e adormecidas e é preciso que as pessoas percebam que têm atores políticos que estão disponíveis, mesmo ligados a partidos políticos, para mudar efetivamente este país e não para eles próprios enriquecerem. Ainda hoje de manhã conversava com o presidente do meu partido e o presidente do meu partido dizia "Bom, já viu aquele blog da internet que diz que eu tenho três casas? Eu até gostava de ter, mas era bom que tivesse, mas não tenho. As pessoas acham-me tonto". Então esteve lá tanto tempo e nem uma casa trouxe, para além daquela que tem com empréstimo ao banco? Pois é, mas é assim que nós acreditamos que devemos viver. Não queremos mais do que isto.

Estava a falar no líder do seu partido e você foi uma aposta pessoal do líder do partido. Atualmente o PSD tem seis câmaras de capitais de distrito, Lisboa e Porto não são certezas, qual é o número razoável para que Passos Coelho possa ser um líder forte para as eleições de 2019?

Deixe-me dizer-lhe que a minha cultura e a minha obsessão democrática obrigam-me a que não a que não possa aceitar isso. Lisboa está muito perto disso, ambas as cidades têm candidatos que pertencem ao maior partido português, no caso de Lisboa, como há pouco já referi, que teve o melhor resultado eleitoral em 2015 e que tem um projeto para o país. Os portugueses confiam no PSD para o país, como confiam para a cidade de Lisboa até porque o Partido Social Democrata, com Pedro Passos Coelho, e antes de Passos Coelho, já devolveu a dignidade ao país, retirando o país da bancarrota.

Por isso não posso aceitar essa afirmação que, aliás, ouço em amiúde. É uma afirmação que resulta de uma comunicação dogmática. Não há nenhuma razão para se dizer que eu não vou ganhar as próximas eleições, bem pelo contrário: há muitas razões para se dizer que eu ganharei as próximas eleições. Agora não se pode fazer uma comunicação no sentido de que aquela candidatura não vale, aliás eu já pus em causa até que o primeiro-ministro António Costa tenha dito isso, porque não acredito. Custa-me a crer, é uma afirmação que eu só vendo para crer. Ganhará as eleições quem os eleitores quiserem, e é bom que não se esmaguem os eleitores com grandes movimentos de comunicação e dogmas de comunicação para que as pessoas não sejam livres na sua escolha e não têm que ter medo. Às vezes ouço pessoas e os empresários dizer que têm medo de contrariar o Partido Socialista, eu ouço dizer isto. Isto não é compatível com a democracia. Eu não acredito que tenham. Mas talvez haja uma comunicação que vá nessa orientação, bom o PSD não tem hipótese de ganhar a cidade de Lisboa. Tem, tem hipótese. E vai ganhar.

Às vezes ouço pessoas e os empresários dizer que têm medo de contrariar o Partido Socialista, eu ouço dizer isto. Isto não é compatível com a democracia.

Disse que Lisboa está preparada e com vontade de receber uma mulher como presidente. Tem a concorrer na mesma eleição consigo uma candidata que conhece bem, a Assunção Cristas, que lamentou, inclusive, não poderem estar mais próximas. E temos a Joana Amaral Dias que foi já anunciada como candidata por um partido independente. Em que é que uma mulher faz a diferença à frente da Câmara Municipal de Lisboa e como é que para os lisboetas, pode fazer a diferença, se não lhe conhecem o programa...

Não conhece seguramente o programa da Fernando Medina.

Mas tem materializado várias medidas...

Não, não. Outra comunicação que está incorreta.

Até o próprio Pedro Santana Lopes já veio a público dizer que estranhava a ausência do seu programa.

Há um conjunto de medidas que eu até já ouvi Fernando Medina defender e que foram defendidas por mim dois meses antes. O que acontece é que, por ventura, não há tanta atenção ao que eu digo e deveria haver. Mas isso não é absolutamente verdade. Desde que comecei a apresentar as linhas de orientação referentes ao meu programa, e isso aconteceu já há dois meses e tal, tenho vindo a ser surpreendida não só pelo presidente da câmara de Lisboa, mas também pelo próprio primeiro-ministro, a defender publicamente medidas que nunca defenderam e que são exatamente as que eu defendi um mês antes de eles defenderem. E portanto há aqui uma linha de orientação que é inteligente da parte do primeiro-ministro, que é inteligente da parte do Presidente da câmara de tentativa de apropriação de um conjunto de orientações e de medidas que eu defendi e aqui lamento, mas é uma matéria cronológica, é matéria de facto.

É preciso é que não haja uma tentativa de tornar inacessível esta informação aos eleitores, pondo por cima coisas como "não tem programa", "não tem medidas"... Acho extraordinário Fernando Medina só ter anunciado a sua candidatura há quinze dias, tanto quanto eu sei, e portanto está a falar nos últimos quinze dias, e eu falei nos últimos dois meses e meio. E apresentei um conjunto de medidas e é falso que não tenha apresentado, e volto a chamar a atenção que o próprio primeiro-ministro, numa reunião partidária, veio anunciar, rigorosamente, o que eu tinha anunciado dois meses antes: políticas públicas para promover a habitação em Lisboa. Nunca o fez, enquanto presidente da câmara, nunca o disse enquanto presidente da câmara, depois, de eu o dizer, veio-o dizer já na qualidade de primeiro-ministro. Folgo em saber, porque eu enquanto presidente da câmara vou precisar de António Costa, porque vou precisar do Governo e vou precisar da Assembleia da República para um conjunto de medidas que depois poderão ser concretizadas noutras cidades, mas também na cidade de Lisboa. Portanto, essa questão não é verdadeira.

"Mas eu tenho um adversário que é Fernando Medina, não posso ser hipócrita. O partido que tem melhores condições em relação aos restantes, que não o PSD, é o PS."
créditos: Paulo Rascão | MadreMedia

Voltando à questão de Lisboa estar preparada e com vontade de receber uma mulher como presidente...

Não querendo ser muito maçadora, há pouco falei dos relatórios para o desenvolvimento da OCDE, agora vou ter de lhe falar dos estudos científicos e das orientações das Nações Unidas, da União Europeia, no sentido de ser absolutamente determinante a integração da sensibilidade, da diversidade das sensibilidades e também da sensibilidade de género, na decisão política, na decisão económica, porque são um ativo económico. Hoje está constatado no plano científico, e com fundamentação científica, que a decisão participada também pela mulher, pela diversidade de género, é um ativo económico e promove políticas públicas que são mais garantistas, aprofundam o desenvolvimento humano, económico e social. E portanto, posso-lhe dizer, neste plano, que a decisão, as orientações no feminino estão constatadas como necessárias para a decisão política e para a decisão económica. Olho para esta candidatura e vejo que tenho três candidatos homens e três candidatas mulheres nesta corrida. Mas eu tenho um adversário que é Fernando Medina, não posso ser hipócrita. O partido que tem melhores condições em relação aos restantes, que não o PSD, é o PS. Veremos como vai ser, mas se olharmos à nossa volta, se olhar para Madrid, se olhar para Roma, se olhar para Barcelona começa-se a ver muitas opções por política no feminino. E em alguns casos de candidatas que quando apareceram, como no caso de Roma, estavam fora do sistema. O que significa que conseguindo falar com os cidadãos, os munícipes sabem o que escolhem e eu considero que essa perceção de que se pode fazer a política de forma diferente, inovadora e direcionada para aquilo que interessa que é a vida das pessoas, das famílias, isso é um anseio dos munícipes de Lisboa.