O chefe de Estado e, na prática, o líder do Partido da Justiça e do Desenvolvimento (AKP, islamita-conservador, no poder desde finais de 2002) participou hoje em quatro iniciativas eleitorais e o seu primeiro-ministro em cinco, todas em Istambul.
O dirigente do Partido Republicano do Povo (CHP, social-democrata), Kemal Kiliçdaroglu, optou por permanecer nos arredores de Ancara, enquanto o pró-curdo Partido Democrático dos Povos (HDP, esquerda) terminou a campanha em Diyarbakir (sudeste), a região do país com maioria de população curda.
O objetivo consistiu em convencer o grande número de eleitores indecisos para um escrutínio que se prevê muito disputado.
Cerca de 58 milhões de eleitores decidem no domingo sobre a aprovação ou rejeição das reformas constitucionais destinadas a substituir o sistema parlamentar – a base em que assenta uma instável democracia secular – por um regime presidencialista, eliminando o cargo de primeiro-ministro e transferindo os seus poderes para o chefe de Estado, além de outras emendas constitucionais.
Na reta final da campanha as sondagens mais credíveis indicavam que o “sim” e o “não” ao novo sistema presidencialista estavam praticamente empatados, com alguns estudos de opinião a referirem-se a apenas meio ponto percentual de diferença. No entanto, outros prognósticos apontavam para uma vitória folgada do “sim”, incluindo com mais de 60% das intenções de voto.
“Amanhã, a Turquia vai tomar uma das decisões mais importantes da sua história”, declarou Erdogan, ao apelar à população para votar em massa.
“Os resultados anunciam-se como bons. Mas isso não nos deve tornar letárgicos. Um ‘sim’ forte será uma lição que se dará ao ocidente”, assinalou, após ter selecionado a União Europeia como um dos alvos da sua campanha.
Nos seus discursos, Erdogan associou o voto ‘não’ à guerrilha curda do Partido dos Trabalhadores do Curdistão (PKK) e à confraria de Fethullah Gülen, o alegado responsável pela sangrenta tentativa de Estado em julho de 2016, ambos considerados por Ancara “organizações terroristas”.
Num clima em que apelar ao voto “não” equivale a ser considerado traidor à pátria, é provável que muitos cidadãos ocultem a sua opinião, incluindo os 2,6 milhões de funcionários públicos em situação particularmente vulnerável, porque sob o estado de emergência podem ser despedidos sem justificação.
Nas últimas semanas, a oposição deplorou uma campanha muito desigual, com um nítido predomínio no “sim” nas ruas e nos ‘media’, um dos setores mais atingidos pelas purgas desencadeadas pelo regime a partir de 20 de julho após a declaração do estado de emergência ainda em vigor.
O HDP, terceira força no parlamento de Ancara, fez a sua campanha com os seus dois copresidentes e muitos dos seus deputados na prisão, acusados de ligações com o PKK, também considerado “terrorista” pelos aliados ocidentais da Turquia.
A campanha registou no entanto algumas contrariedades para o AKP, que assume este projeto com o Partido de Ação Nacionalista (MHP, direita populista), de Devlet Bahçeli. Uma aliança necessária mas frágil com este partido, a quarta força política no parlamento e muito dividido internamente sobre esta revisão constitucional.
O MHP opõe-se a qualquer solução de federalismo na Turquia, que poderia garantir um determinado grau de autonomia às regiões curdas do sudeste. Na sexta-feira, o chefe de Estado foi forçado a assegurar os seus aliados nacionalistas que “nada disso está na ordem do dia” após o referendo.
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