O decreto-lei foi aprovado pelo Governo no início de julho esteve em consulta pública entre outubro e novembro de 2021. Na segunda-feira, quando promulgou o diploma do Estatuto do SNS, o Presidente da República afirmou que o documento levantava dúvidas em três aspetos: “o tempo, a ideia da Direção Executiva e a conjugação entre a centralização nessa Direção e as promessas de descentralização da saúde”.
No entanto, justifica a promulgação porque a lei é "a base do edifício. Sem a lei não se podia fazer a reforma. Eu não ia retardar só porque tinha duvidas e esperava que fossem resolvidas”.
O novo estatuto atualiza a definição do SNS, a sua composição – os estabelecimentos que o integram e os serviços que presta – os “direitos e os deveres” dos beneficiários, assim coma a organização e funcionamento e demais adequação dos recursos humanos e financeiros.
“Avancei com a assinatura e as três dúvidas que levanto, primeiro é a do tempo. Muita coisa importante fica por regular até seis meses. Não há tempo a perder. O que peço ao governo é que regulamente rapidamente, para saber exatamente a natureza jurídica do SNS, para saber o que é a direção executiva, para saber como é que se relaciona essa concentração na direção executiva com a descentralização nas CCDR e se vierem a ser criadas, nas regiões administrativas”, sustentou Marcelo.
Depois, focou-se na ideia é haver uma concentração de poderes sobretudo no SNS. “Como é que serão os poderes da direção executiva para não ser sugada pelo Ministério da Saúde e ter agilidade, flexibilidade de gestão”, questionou.
Já a terceira dúvida levantada pelo PR, prende-se com a conjugação da passagem das Administrações Regionais de Saúde (ARS) para as Comissões de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR) e depois, para as regiões administrativas se vierem a ser criadas, “se for essa a vontade dos portugueses”.
Depois, "há várias coisas que têm que ser definidas porque foram remetidas para diplomas. Há zonas carenciadas que precisam de soluções excecionais. Há regimes de trabalho flexíveis. Como é que vai ser? Há articulação entre o SNS, o setor social e o setor privado, como é que vai ser? Vai ter que ser explicado a seguir”, concluiu.
Apesar das dúvidas a lei passou o crivo do Presidente e foi publicada esta quinta-feira em Diário da República. Eis o que prevê:
- Mais autonomia a hospitais e centros de saúde
O documento vem dar aos hospitais mais autonomia para a contratação de trabalhadores e para investir, pois as Finanças passam apenas a ter de aprovar valores acima dos 2,5 milhões de euros em projetos previstos nos Planos de Atividade e Orçamentos submetidos à tutela.
Os conselhos de administração dos hospitais vão poder celebrar contratos sem termo sempre que esteja em causa o recrutamento de trabalhadores necessários ao preenchimento dos postos de trabalho previstos no mapa de pessoal e Plano de Atividades e Orçamento.
Nos casos em que a insuficiência de profissionais possa comprometer a prestação de cuidados de saúde, os conselhos de administração dos hospitais podem celebrar contratos de trabalho a termo resolutivo certo, pelo prazo de seis meses, não renovável, segundo o documento.
Poderão também substituir profissionais temporariamente ausentes, celebrando contratos de trabalho a termo resolutivo incerto.
Com o estatuto do SNS, o Governo dá ainda uma orientação clara para os conselhos de administração promoverem novos Centros de Responsabilidade Integrada (CRI), que são estruturas de gestão intermédia com equipas multidisciplinares e autonomia funcional e que envolvem a responsabilização dos profissionais na gestão dos recursos, “incentivando-os a desenvolver a sua atividade exclusivamente no SNS”.
Quanto aos Agrupamentos de Centros de Saúde (ACES), o Estatuto do SNS prevê que deixem de ser serviços desconcentrados das ARS e passam a ser “institutos públicos de regime especial”, com autonomia administrativa e património próprio. OS ACES passam igualmente a contratualizar diretamente a prestação de cuidados com a ACSS.
- Dedicação plena impõe metas a médicos e proíbe cargos de chefia no privado
Os médicos que aderirem ao regime de dedicação plena, previsto no Estatuto do SNS, terão de se comprometer com metas assistenciais e ficam impedidos de exercer funções de direção técnica, coordenação e chefia em instituições privadas.
O regime de dedicação plena será voluntário, vai abranger de início apenas os médicos, mas será alargado, “gradual e progressivamente”, a outros profissionais de saúde.
Este é incompatível com o exercício de funções de direção técnica, coordenação e chefia em instituições privadas e do setor social de prestação de cuidados de saúde, mas exclui os consultórios médicos de profissionais individuais. Também não é aplicável aos trabalhadores médicos em regime de dedicação exclusiva e de trabalho a tempo parcial.
O regime está incluído no protocolo negocial entre o Governo e os sindicatos médicos.
O exercício de funções em regime de dedicação plena "depende de requerimento do trabalhador interessado e de assinatura de uma carta de compromisso assistencial com a instituição à qual se encontra vinculado, de onde constem, para um horizonte temporal de três anos, os objetivos e metas a alcançar".
Refere igualmente que a dedicação plena "é obrigatoriamente aplicável aos médicos que venham a ser designados em regime de comissão de serviço para exercer funções de direção de serviço ou de departamento do SNS".
O regime de dedicação plena apenas pode cessar antes do termo do respetivo triénio "com fundamento no incumprimento dos compromissos assumidos pelo trabalhador". Contudo, o trabalhador pode renunciar mediante um aviso prévio de, pelo menos, três meses.
O modelo de organização do trabalho, incluindo o acréscimo do período normal de trabalho semanal, assim como o regime remuneratório, "designadamente prémios de desempenho associados à atividade executada", serão posteriormente definidos em diploma próprio.
O Estatuto prevê igualmente que os profissionais de saúde que, no âmbito do exercício de funções no SNS, sofram uma ofensa à sua integridade física ou psíquica tenham direito, no correspondente processo judicial, a assistência e patrocínio judiciário.
Outras das novidades previstas é que o presidente e os membros dos conselhos de administração e dos conselhos diretivos, que sejam médicos, possam, a título excecional e “em situações de interesse público”, exercer no mesmo estabelecimento de saúde atividade assistencial, remunerada e mediante autorização do membro do Governo responsável pela área da Saúde.
Prevê igualmente que os órgãos máximos de gestão das unidades de saúde do SNS designem, sob proposta das associações de utentes e pelo período de três anos, um provedor do utente, “que articula a sua ação com o gabinete do cidadão”.
Ao provedor do utente compete “representar os interesses dos utentes e famílias, apoiar o acompanhamento dos utentes mais vulneráveis durante o percurso na unidade de saúde e identificar as dificuldades e necessidades dos utentes na unidade de saúde, apresentando propostas de melhoria contínua dos cuidados ao órgão máximo de gestão”.
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